No espaço de cinco anos, os tribunais de primeira instância interditaram 16 752 pessoas e inabilitaram 1472. No total, de acordo com o atual regime de interdição e inabilitaçâo, mais de 18 mil pessoas foram dadas como incapazes, adiantou ao JN o Ministério da Justiça.
Estes regimes, contudo, não satisfazem as necessidades atuais da sociedade, nem cumprem a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, de que Portugal é signatário e que salvaguarda a autonomia e a dignidade individual e jurídica da pessoa. Serão, por isso, substituídos pelo sistema do maior acompanhado.
A proposta do Governo, aprovada ontem na generalidade pela Esquerda e pelo PAN, com a abstenção do PSD e do CDS, será discutida na comissão parlamentar da especialidade, mas tudo indica que haverá acordo para acabar com a interdição e a inabilitaçâo.
Estes dois sistemas aplicam-se a pessoas maiores de idade que se encontrem diminuídas na sua capacidade e autonomia e funcionam como uma "morte civil", disse a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, ontem, na apresentação da proposta aos deputados.
Uma vez interditada ou inabilitada, a pessoa perde autonomia e capacidade de decisão sobre aspetos básicos da vida, em particular o seu património. O novo regime, explicou Van Dunem, quer ter em Unha de conta as gradações e tipos de incapacidade e dar uma resposta ajustada: cada pessoa terá o acompanhamento de que necessita, pela pessoa que escolha, com uma supervisão judicial muito próxima. Protecionista ou autonomização
A capacidade dos tribunais para defender os interesses da pessoa é uma das dúvidas das organizações solidárias do setor. Uma alternativa seria a criação da figura do tutor profissional, admite Rosário Zincke dos Reis, da Associação Alzheimer Portugal, ou de fundações tutelares, admite Rogério Cação, da Fenacerci, a federação das Cerci.
Ambos reconhecem que a proposta traz benefícios, sobretudo quando comparada com o regime atual, como a possibilidade de constituir família ou direitos de parentalidade. Mas recomendam melhorias. Rogério Cação insiste na importância de reforçar a autonomização da pessoa, até por uma questão de princípio. "Este novo modelo não traduz o espírito da Convenção, mantém uma lógica protecionista e não de autonomia da pessoa, como devia", disse.
Rosário Zincke dos Reis gostaria também que ficasse explícita a possibilidade de a pessoa escolher o regime de acompanhamento enquanto está na posse de todas as suas faculdades. argumentos: Proteger idosos, diz CDS Salientado ter apresentado propostas nesta área há dois anos, Vânia Dias da Silva insistiu na intenção de proteger os idosos vítimas de violência doméstica. "Um agressor não pode ser herdeiro", reforçou, para justificar a figura da "indignidade sucessória". Em paralelo, quer um sistema que proteja as pessoas com algum grau de incapacidade quando são, elas próprias, herdeiras. As propostas foram chumbadas. Benefício da dúvida Sandra Pereira, do PSD, afirmou que o partido dará o benefício da dúvida ao Governo, mas lamentou que a proposta assente num "modelo protecionista, em que prevalece a substituição da vontade" da pessoa acompanhada pela vontade do acompanhante ou do tribunal.
Jornal de Notícias | 10-03-2018
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