O nome hip acaba por criar a legenda de uma autêntica revolução. E o novo programa Justiça + Próxima e Programa Simplex promete, de facto, já a partir (gradualmente) de 29 de junho de 2017, alterar as perspectivas de operacionalização prática do panorama jurídico português, assente num processo metodológico de participação activa de todos os intervenientes judiciários, conforme plano de implementação seguinte.
O ponto de partida, cruz transversal de gerações de advogados, é o programa CITIUS que, hodiernamente, é o ódio favorito de toda uma classe. Desde o âmbito limitado de consulta e de entregas de peças processuais (para já, apenas nas acções cíveis), ao malfadado limite de 3 MB (inacreditável com a facilidade de transmissão e armazenamento de dados hoje existente), aos constantes crashes, ou às insuportáveis incompatibilidades de browser e java, a verdade é que o programa, enquanto ferramenta tipo de uma profissão, se encontra completamente obsoleto. Neste sentido, recorde-se, com remarcado embaraço, toda a situação ocorrida em setembro de 2014, com contornos novelescos, quando, tendo entrado em vigor o novo mapa judiciário, com 23 novas comarcas, e com uma necessária e consequente redistribuição de processos no sistema informático CITIUS, este acaba por entrar em falência técnica, só entrando em débil funcionamento quase um mês depois. Entretanto, entre um inquérito aberto pelo Ministério Público para apurar as causas do blackout, entre suspeitas de sabotagem informática, e com o afastamento do responsável do departamento informático, fica tremendamente presente a necessidade de dar um passo qualitativo em direcção ao futuro.
Será que é este o momento?
O novo programa aposta numa visão multipatamar, mas concertada, através de vectores de flexibilização no acesso e consulta dos processos, tentando desmistificar a complexidade e burocratização do aparelho judiciário, aproximando, no fundo, os cidadãos da justiça. E essa intervenção é feita, logo, através de uma disponibilização de uma via directa de acesso nos processos executivos, a exequentes e executados, que podem, a partir de agora, consultar diretamente o respectivo processo executivo através de uma plataforma agora criada para esse escopo (https:// processoexecutivo.justica.gov.pt), recorrendo, para o efeito, à autenticação digital do cartão do cidadão. Estas prerrogativas de acesso a este tipo de processos que, à data, pertenciam a advogados e solicitadores, acabam agora por ser estendidos, também, aos interessados comprovados, sempre, obviamente, dentro dos limites de segredo e publicidade do processo. Também se torna perceptível que, estando aqui a falar de cerca de 600 mil processos executivos que, atualmente, são responsáveis e se consubstanciam em grande parte das pendências em tribunal, representando também um significativo peso e interesse económico, este tenha sido o ponto de partida.
Mas as medidas (que vinham já do Programa Simplex 2016) não param por aqui. Uma delas será a criação do Balcão Único dos Tribunais Administrativos e Fiscais (Portaria n.º 178/2017 - Diário da República n.º 104/2017, Série I de 2017-05-30), que irá permitir que os cidadãos interessados obtenham informações sobre o estado de qualquer processo, requeiram certidões e entreguem peças processuais em qualquer tribunal administrativo ou tributário. Este será o primeiro passo de alargamento subsequente da tramitação eletrónica baseado nos resultados que se venham a obter. É, como tal, um esforço de construção de um novo paradigma que nos parece ser, pelo menos pelos dados disponíveis, gradualmente planificado. E este alargamento vai repercutir-se, obviamente, com mais processos no CITIUS, estando também prevista, a partir de 2018, a inclusão dos processos contraordenacionais, penais (pensa-se que exclusivamente na fase de julgamento) e processos de protecção de menores. Por outro lado, a simplificação vai também ter lugar a um nível processual mais "básico", com a eliminação de uma panóplia de actos processuais, maioritariamente ligados aos procedimentos de notificação e tratamento de suporte físico das peças que, agora, se tornam desnecessárias, com a descontinuação do envio dos comprovativos de pagamento da taxa de justiça, bastando-se o tribunal com a sua indicação, e com o registo automático dos mandatários (em articulação com a OA e OSAE).
Aqui chegados, algumas notas prementes: a primeira sublinhando a constatação óbvia que a linha transversal de ordenação da referida reforma se relaciona inquestionavelmente com uma ideia de crescente desmaterialização dos procedimentos e tratamento do processo que, não sendo nova, acaba por ganhar aqui um novo fôlego. E uma segunda nota, mais fundamental, para se percepcionar que o sucesso destas medidas estará diametralmente ligado ao suporte informático que a concatena e lhe serve de base. Daí que o problema poderá subsistir, não se aceitando uma intervenção de cosmética informática que não resolva as fragilidades existentes e já mencionadas. Estará o programa CITIUS preparado para este novo desafio? Pensamos, por último, que a aproximação dos cidadãos à Justiça, não se fará (apenas) através de medidas de flexibilização (facilitação) no acesso à consulta, mas sim através de processos judiciais (lato sensu) de qualidade. E esta qualidade não será, infelizmente, tão simple(x).
Vida Económica | 09-06-2017
Comentários (4)
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Os principais culpados desta situação, que está a agravar-se cada vez mais, são os Tribunais da Relação que desesperadamente andam à procura de "questões prévias", fazem tudo por tudo para não apreciarem o mérito, logo, comportam-se como "advogados" de 2.ª instância.
Podem se "safar" naquele processo do trabalho de decidirem o recurso, mas a curto prazo aumentam exponencialmente o número de recursos com alegação de todo o tipo de "maluquices jurídicas" a ver se "cola".
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O comentador atrás que se trate pois não sabe do que fala. Deus nos livre disso.
Sou advogado há 40 anos e se fosse como ele quer teríamos que fugir daqui por causa das péssimas sentenças.
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