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REVISTA DE 2017

É possível emitir Certidões Judiciais Eletrónicas?

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Quando no artigo 7º, nº. 5, da Portaria n.º 209/2017 se refere que “a certidão eletrónica é assinada eletronicamente pelo Oficial de Justiça responsável pela sua elaboração”, convém saber que os Oficiais de Justiça não detêm atualmente forma de proceder à assinatura digital. Ou seja, as certidões judiciais eletrónicas só podem ser emitidas em cerca de 3% do universo do sistema de justiça.

Na passada quinta-feira foi publicada em Diário da República a Portaria 209/2017 de 13JUL que veio, finalmente, regular o funcionamento da certidão judicial eletrónica.

Com esta Portaria, em vigor desde sexta-feira 14JUL, fica regulamentado o pedido, a emissão e a consulta das certidões eletrónicas no âmbito dos processos dos tribunais judiciais, dos tribunais administrativos e fiscais e dos processos da competência do Ministério Público. Isto é um âmbito muito alargado.

De uma forma geral, qualquer cidadão pode fazer o seu pedido de certidão desde que tal pedido seja efetuado através do portal próprio e com o cartão de cidadão ou a chave móvel digital. A certidão será disponibilizada no mesmo portal.

Os pedidos deixam de ser efetuados junto dos tribunais e dos serviços do Ministério Público, locais onde até, em muitos casos, bastava o pedido verbal, para esta modalidade eletrónica que aporta benefícios para todos os intervenientes.

Beneficiam desde logo os cidadãos que passam a poder requerer a certidão pretendida sem ter que se deslocar a nenhum serviço judicial ou do Ministério Público, podendo concretizar o pedido desde a comodidade do seu domicílio e à hora que mais lhe convier, o que, só por si, aporta uma extraordinária vantagem mas a vantagem está também no custo da própria certidão que, sendo emitida por esta via, corresponde a metade daquilo que pagaria se lha dessem em papel.

Para os Oficiais de Justiça haverá também algum benefício, embora a curto e médio prazo não seja significativo. Com os pedidos eletrónicos formalizados no portal, no longo prazo será percetível uma diminuição dos pedidos presenciais, diminuindo, portanto, o número de atendimentos de utentes que, quando presencialmente, se tornam mais demorados no esclarecimento daquilo que é pretendido, enquanto que o pedido formulado na plataforma estará já concluído, isto é, finalizado, detendo todos os elementos solicitados. Sem dúvida que isto resultará, a longo prazo, num ganho de tempo para outras tarefas, especialmente porque estão também previstas emissões automáticas de certidões que nem precisam de intervenção do Oficial de Justiça.

Claro está que todos estes ganhos serão apreciados e imediato, no curto ou médio prazo mas a longo prazo, especialmente quando os cidadãos se aperceberem que têm mesmo que usar as funcionalidades eletrónicas do cartão de cidadão que já não é um simples bilhete de identidade. Desde a criação do cartão de cidadão que a esmagadora maioria dos cidadãos ainda não usa o seu cartão em atividades eletrónicas, sendo também certo que as empresas e também o Estado não implementou mecanismos para a sua utilização, todos continuando a usá-lo como se fosse um novo bilhete de identidade.

No entanto, a utilização do cartão de cidadão e mesmo a criação da chave móvel digital não é algo que seja acessível ao comum dos cidadãos. Desde logo porque, geralmente, implica a compra de um leitor de cartões como o cartão de cidadão, bem como a instalação de aplicações próprias, o que exclui de imediato grande parte da população.

De todos modos, aqueles que ultrapassarem a fase da instalação do leitor e das aplicações para o cartão de cidadão, poderão até criar a tal chave móvel digital que lhes permitirá autenticar-se sem deter o cartão de cidadão, o que se torna muito mais cómodo e acessível em diferentes equipamentos. Estes, poderão então deixar de pedir certidões, presencialmente ou por escrito, nas Secretarias dos tribunais judiciais de primeira instância, nos serviços do Ministério Público ou nas Secretarias dos tribunais administrativos e fiscais.

Ao contrário da certidão em papel, em que se disponibiliza um único documento para, geralmente, uma única utilização, com a certidão eletrónica é disponibilizado um código que corresponde a essa concreta certidão e é através desse código que se acede à certidão. O que se fornece a qualquer entidade deixa de ser a certidão em si mas o código que permite aceder à mesma. Não é necessário imprimir nada, só fornecer o código de acesso à certidão, código este que pode ser facultado a mais do que uma entidade, sem acréscimo de custos, como sucede com a certidão em papel que é única e, uma vez entregue a uma entidade, se houver que entregar a outra, há que ter outra certidão e novos custos.

Os mandatários nos processos (advogados ou solicitadores) não têm que pedir certidões pelo portal próprio, devendo fazê-lo através das plataformas que já habitualmente utilizam, seja o Citius, dos tribunais judiciais, seja o SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

Esta medida, embora há muitos anos prevista, designadamente no Regulamento das Custas Processuais que desde 2009 ali prevê o custo reduzido deste tipo de certidão, vem sendo agora anunciada como uma novidade e uma medida do pacote “Simplex+”, quando na realidade não se trata de inovação nenhuma e consiste apenas na implementação de algo que há muitos anos está previsto e que durante todos estes anos não houve qualquer preocupação na sua implementação.

Na Portaria consta que para a elaboração da mesma o Governo procedeu à audição prévia de diversas entidades com o propósito de bem legislar. Assim, consta expresso que “Foram ouvidos o Conselho Superior da Magistratura e o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Foi promovida a audição da Procuradoria-Geral da República, da Ordem dos Advogados e da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução”. Isto é, foram ouvidos ou foi promovida a audição de várias entidades mas não foi ouvida a entidade que representa aqueles que vêm lidando desde sempre e que continuarão a lidar no futuro, no dia-a-dia, com as pessoas e com as certidões.

Mais uma vez, entre já tantas, o Governo volta a ignorar os Oficiais de Justiça que possuem também um Conselho, como os demais operadores judiciários, Conselho este que poderia contribuir positivamente na elaboração cuidada desta regulamentação, suprindo alguns erros que mancham a boa ideia e as boas intenções que não são suficientes para pôr em prática a emissão de certidões eletrónicas.

Assim, não tendo o Governo ouvido ou promovido a audição do Conselho dos Oficiais de Justiça, que seria o interlocutor adequado para esta ação legislativa, embora ufanamente anuncie que já estão disponíveis as certidões judiciais eletrónicas, o facto é que não estão e não podem estar tão cedo porque os Oficiais de Justiça não possuem, porque não lhes foi fornecido o meio, de certificação das certidões.

Quando no artigo 7º, nº. 5, da citada Portaria se refere que “A certidão eletrónica é assinada eletronicamente pelo Oficial de Justiça responsável pela sua elaboração”, convém saber que os Oficiais de Justiça não detêm atualmente forma de proceder à assinatura digital, uma vez que os cartões próprios caducaram há muitos anos e nunca mais foram renovados, com exceção dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

Quer isto dizer que apenas numa minoria de locais é possível emitir certidões eletrónicas e estes locais resumem-se a pouco mais de uma dúzia de locais, ficando de fora os tribunais judiciais e os serviços do Ministério Púbico que, no país, representam bem mais do que uma dúzia de locais, isto é, são cerca de quatro centenas de locais.

Ou seja, as certidões judiciais eletrónicas só podem ser emitidas em cerca de 3% do universo do sistema de justiça, isto é, francamente, um logro.

A certidão eletrónica que arrancou oficialmente na passada sexta-feira 14JUL, arrancou de facto mas o tiro de partida não foi ouvido em todo o país, o que resultará em conflitos diários com reclamações dos cidadãos que não só alegam que toda a comunicação social divulgou a possibilidade de deter tal certidão a metade do preço, como consta publicado no Diário da República e ainda, nestes mesmos termos foi divulgado pelo Ministério da Justiça, o que, embora não sendo uma mentira, porque há alguns poucos locais onde é possível emitir tais certidões, é aquilo que hoje se gosta de adjetivar como “inverdade” ou até “pós-verdade”, para designar uma precipitação, um engano, uma falsidade, ainda que parcial, e tudo isto porque não foi ouvido o Conselho que representa a maior classe profissional do país e que é precisamente aquela que lida de facto, ao contrário das outras ouvidas, que lida de facto e diariamente com o assunto e que facilmente teria alertado para a impossibilidade prática de cumprir a Portaria.

Assim, hoje mesmo e nas próximas semanas, quando os cidadãos acorrerem aos tribunais a solicitar certidões eletrónicas ou as peçam através do portal próprio, terão que ficar a saber que este Governo não ouve os Oficiais de Justiça e, por tal motivo, legislou de forma apressada, lavrando na ignorância das circunstâncias reais do sistema judiciário, assim enganando e frustrando as expectativas dos cidadãos utentes dos serviços judiciais.

É pena que a falta de consideração pelos Oficiais de Justiça nos assuntos legislativos e especialmente no que diz respeito a aspetos que por esta classe profissional vai ser levada a cabo e vem sendo levado a cabo desde sempre, continue a ser uma ingrata realidade.

(...)

Pode aceder ao portal da certidão eletrónica através do seguinte endereço (com hiperligação): https://certidaojudicial.justica.gov.pt
Pode consultar a mencionada Portaria através da seguinte hiperligação: “Portaria 209/2017-13JUL”.
Pode aceder à informação divulgada pelo Ministério da Justiça através da seguinte hiperligação: “MJ-Info-CJE”.
Pode também aceder às instruções dirigidas aos mandatários processuais, constantes no portal do Citius, através desta hiperligação: “Citius-Info:CJE”.

Blog Oficial de Justiça | 17-07-2017

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