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REVISTA DE 2017

Queixas por perseguição dispararam no último ano

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Stalking é crime há dois anos • Criminosos têm curso superior e maioria das vítimas são mulheres • Porto é das regiões mais problemáticas. 922 casos de perseguição em dois anos.

O Ministério Público investigou 922 casos relacionados com a prática de perseguição, desde 5 de agosto de 2015, data em que o Código Penal foi alterado para incluir este crime, vulgarmente conhecido por "stalking". Os números de inquéritos têm aumentado, ainda que nem todos redundem em acusação, e uma grande parte ocorre em comarcas do Porto. No grupo de trabalho parlamentar que aditou à legislação este crime, há quem considere que a moldura penal deveria ter sido mais incisiva.

De acordo com dados da Procuradoria-Geral da República (PGR), nos primeiros sete meses do ano, foram abertos 373 inquéritos sobre eventuais práticas de "stalking". Destes, 244 casos acabaram arquivados e 23 já têm acusação produzida. A maior parte desencadeouse nas comarcas do Porto Este, Lisboa Este, Faro e Aveiro.

Este cenário, até 31 de julho de 2017, aproxima-se a passos largos do volume de inquéritos de todo o ano de 2016:473.0 Ministério Público considerou só ter indícios fortes para avançar para a acusação do crime de perseguição em 23 casos, em 2016, e ditou o arquivamento de 244. Mais uma vez, com as comarcas do Porto a liderarem - 71.

Os dados de há dois anos são mais tímidos, até porque, apesar da alteração ter sido publicada a 5 de agosto de 2015, só entrou em vigor um mês depois. Daí até dezembro desse ano, ocorreram 76 inquéritos e dois culminaram em acusações: um na comarca de Porto Este, que se tem mostrado ativa na atuação contra este crime, e outro na de Santarém. Quanto a condenações, não houve dados fornecidos.

Maioria conhece agressor

Ao JN, Rui Costa, da APAV-Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, mostrou-se satisfeito com os números, já que, "até existir este aditamento, só havia inquérito no caso de o autor levar a cabo outro crime cumulativamente, como o da ofensa física".

"O aumento verificado de inquéritos sobre 'stalking' é simpático. Mas não temos forma de aferir se tal se deveu a uma maior sensibilização da população para reportar tais casos ou se aos aditamentos feitos à lei", explicou, assumindo a semelhança dos dados do PGR com os números da instituição, que tem nas suas casas-abrigo vítimas deste tipo de crime.

Segundo Rui Costa, em 2014, chegaram ao conhecimento da APAV 341 casos, que subiram para 427, no ano seguinte, e se cifraram em 412, em 2016. "Mais de 90% são mulheres e 75% têm ou tiveram relacionamento com o autor [do crime]", explicou. Grande parte das vítimas e dos autores têm habilitações literárias altas, como o Ensino Superior.

Lei precisa de ir mais além
A ex-deputada Cecília Honório partilha da opinião de que é necessário atualizar a legislação. Para a bloquista, que integrou o grupo de parlamentares do PSD, CDS-PP, BE e PS que apresentaram projetos de lei, em 2014, "o quadro legal está muito melhor, mas é preciso ir mais além". "Numa altura de Governo de Direita, duas mulheres, do PSD e do CDS, Teresa Leal Coelho e Teresa Anjinho, com a então secretária de Estado Teresa Morais, criaram um quadro de disponibilidade para fazer estes aditamentos. O quadro final não corresponde ao que pretendíamos e, por isso, acho essencial que se criem compromissos para reforçar este quadro legal", disse.

A social-democrata Teresa Leal Coelho reconhece que, no caso do assédio, poder-se-ia "ter ido mais longe". "Demos passos em frente mais ou menos lentos. Havia a necessidade de ter o maior consenso possível sobre factos que consubstanciam o crime e que são difíceis de destacar. Mas as deputadas que deram origem a estes aditamentos estão de parabéns", conclui.

"Stalkers" usam redes
Perseguir ou assediar outra pessoa, com o objetivo de lhe provocar medo, inquietação ou até limitar a sua liberdade de determinação, configuram o crime de perseguição ou "stalking". 0 meio pode ser qualquer um, de forma direta ou indireta. As redes sociais são um dos recursos mais usados pelos agressores ou "stalkers".

Prisão até três anos
Este crime é punido com uma pena de prisão de até três anos ou multa. Mas o "stalker" pode ser obrigado ainda a frequentar programas de ressocialização.

Facebook dificulta prova
O aditamento deste crime ao Código Penal surgiu na sequência da ratificação para a lei nacional da Convenção de Istambul - a estratégia delineada pelo Conselho da Europa (a mais antiga instituição europeia, que junta 47 países e conhecida como a "grande Europa"), para a prevenção e o combate à violência contra as mulheres e a violência doméstica. Portugal tem de apresentar, até 18 de setembro, o balanço destes dois anos. Apesar de ter sido o primeiro Estado da União Europeia a incorporar a legislação, não poderá omitir as dificuldades na obtenção do meio de prova no crime de "stalking" que os outros países também registam, apurou o JN junto de fontes judicias. "A maior parte da perseguição faz-se por email, SMS, Whatsapp ou Facebook. Estas duas últimas empresas têm por regra não colaborar com nenhum país no fornecimento de mensagens antigas ou do servidor que as originou. E as operadoras nacionais têm dificuldade em colaborar, porque os registos essenciais são apagados ao fim de seis meses, e muitas vítimas só fazem queixa após esse período", referiu uma magistrada ouvida pelo JN, que considera essencial reforçar a lei, principalmente à luz do "artigo 46 da Convenção, que lista um conjunto de situações e condutas agravantes".

Nuno Miguel Ropio | Jornal de Notícias | 05-08-2017

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