O Conselho Superior da Magistratura não quer pronunciar-se sobre o "cenário hipotético" de uma greve dos juizes no próximo mês de agosto, mas a Direção da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) considera "pouco provável" que aquele órgão, se confrontado com um pré-aviso de greve, venha dizer que os magistrados judiciais, apesar de titulares de um órgão de soberania (os tribunais), não têm o direito de paralisar.
E isto porque, no passado, o Conselho já deliberou que "é lícito o exercício do direito à greve por parte dos magistrados judiciais". "Não vejo como é que o conselho pode desvincular-se do que foi a sua posição no passado", comentou o secretário-geral da ASIP, João Raposo, tendo em conta que, em 1988,1993 e 2005, aquele órgão de gestão da magistratura judicial foi confrontado com pré-avisos de greve e deliberou ainda sobre serviços mínimos.
Um antecessor de Raposo no cargo, o juiz Manuel Ramos Soares, entende que o Conselho Superior da Magistratura (CSM) deve deliberar sobre serviços mínimos, "não sobre a legalidade da greve dos juizes". Mas, em 2005, fê-lo. Na altura, o anúncio de uma greve contra as políticas do primeiro Governo de José Sócrates levantou aquela questão, com o então ministro da Justiça, Alberto Costa, a pedir um parecer ao constitucionalista Jorge Miranda. Este, tal como fez em texto de opinião publicado no jornal "Público" que lançou novamente a mesma discussão, defendeu que os juizes não têm direito à greve. Mas o CSM, por maioria (11 votos a favor, três contra), deliberou em sentido contrário.
"Face ao quadro constitucional e legal vigente [que se mantém], é licito o exercício do direito à greve por parte dos magistrados judiciais, tendo em conta que do seu estatuto emerge uma dupla condição de titulares de órgãos de soberania e de profissionais de carreira que não dispõem de competência para definir as condições em que exercem as suas funções", justificou o CSM, aprovando a paralisação para 26 e 27 de outubro de 2005. Questionado pelo JN, o mesmo órgão, com nova composição, respondeu que "neste momento a greve é um cenário hipotético" e "não se pronuncia sobre meras eventualidades".
Serviços mínimos em questão
Em 2005, o CSM deliberou ainda como serviços mínimos "todos os atos processuais estritamente indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas e os que se destinem a tutelar direitos, liberdades e garantias, que de outro modo não possam ser exercidos em tempo útil, designadamente os respeitantes aos prazos máximos de detenção e prisão preventiva, as providências relativas a menores em perigo ou risco e as providências urgentes ao abrigo da Lei de Saúde Mental".
No cenário atual, caso a ASJP não chegue a acordo com o Ministério na negociação do novo estatuto dos juizes e avance para a greve, o CSM terá de decidir se as tarefas de verificação da validade das listas de candidatos às eleições autárquicas, agendadas para 1 de outubro, serão serviços mínimos. Caso não haja acordo sobre isto, a definição desses serviços será tomada por um colégio arbitral de três membros.
Nelson Morais | Jornal de Notícias | 14-06-2017
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