Manuela Paupério admite não se rever na argumentação adultério feminino usada por colega, mas diz que independência dos magistrados não pode ser posta em causa.
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses vai "acompanhar de muito perto" o inquérito instaurado pelo Conselho Superior da Magistratura ao juiz relator Neto de Moura, do Tribunal da Relação do Porto, pelas considerações proferidas num acórdão sobre violência doméstica.
Em Braga, à margem de uma conferência na Universidade do Minho, a presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Manuela Paupério, salientou que "tem que haver muita ponderação" na análise do caso em apreço sob pena de se “pôr em causa a independência dos juízes".
O Conselho Superior da Magistratura anunciou quarta-feira a instauração de um inquérito ao juiz que num acórdão sobre um caso de violência doméstica invoca a bíblia, o Código Penal de 1886 e até civilizações que punem o adultério com pena de morte para justificar as agressões cometidas contra uma mulher por parte do marido e também do amante, condenados a pena suspensa na primeira instância.
"O Conselho Superior da Magistratura já disse que ia abrir um inquérito disciplinar, é o órgão competente para aferir a existência de eventual responsabilidade disciplinar. A Associação Sindical dos Juízes Portugueses vai acompanhar de muito perto o desenrolar deste inquérito", declarou Manuel Paupério. A magistrada sublinhou que "tem de haver muita ponderação", porque "um órgão de natureza administrativa não pode colocar em causa decisões judiciais ou os seus fundamentos", sob pena de “estar a pôr-se em causa a independência dos juízes".
Segundo Manuela Paupério, "o que compete aferir é se o juiz, ao proferir aquela decisão, viola algum dos seus deveres estatutários".
"Vamos aguardar com serenidade os desenvolvimentos posteriores deste caso que está a tomar proporções inauditas, a justiça precisa de serenidade", apontou. Questionada sobre se como mulher concorda com o discurso usado no acórdão em causa, Manuel Paupério afirmou que não. "Como cidadã, não me revejo naquele tipo de argumentário. As considerações ficam com o senhor juiz", respondeu. No entanto, acrescentou, "a crítica a uma decisão, por mais justa que possa ser, não justifica o recurso ao insulto e ao linchamento público".
"O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher", lê-se na decisão daquele tribunal superior, também assinada pela desembargadora Maria Luísa Arantes.
Lusa/Público | 26-10-2017
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