O processo especial de revitalização foi criado para ajudar a recuperar empresas, mas tornar-se também um escape para as famílias em dificuldades. A clarificação da lei, já proposta pelo Governo, deve entrar em vigor no primeiro trimestre de 2017.
As pessoas singulares ou (indivíduos ou famílias) vão deixar de ter acesso ao chamado processo especial de revitalização (PER), mecanismo legal inscrito no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) em 2012. Trata-se de uma clarificação da lei, que deverá entrar em vigor no primeiro trimestre do próximo ano, e faz parte de um conjunto de alterações que o Governo pretende levar a cabo no âmbito do PER
“Fruto da necessidade, talvez por entenderem que os mecanismos existentes não eram suficientes, vários advogados começaram a instaurar PER de pessoas singulares e os tribunais aceitaram. […] O legislador vem agora dizer, de forma clara e inequívoca, que o PER não pode ser utilizado por pessoas singulares”, explica Nuno Gundar da Cruz, associado da Morais Leitão Galvão Telles, Soares da Silva & Associados (MLGTS) e especialista neste ramo do direito.
Helena Soares de Moura, sócia da MLGTS e igualmente especialista neste tipo de processos, lembra, em declarações ao Negócios, que os casos PER relativos a famílias que entraram nos tribunais, a partir de 2012, chegaram a ultrapassar em número os processos relativos a empresas, contribuindo para fazer aumentar os tempos de decisão da Justiça e as pendências, em particular nos tribunais de Comércio.
Helena Soares de Moura lembra, de todo o modo, que há outros mecanismos já previstos nalei e especificamente vocacionados para recuperação de pessoas singulares. São os casos dos planos de pagamentos- acordos com os credores, com aprovação e homologação por um juiz – ou o mecanismo de “exoneração do passivo restante”, que prevê uma espécie de perdão de dívida após declaração prévia de insolvência
Administradores judiciais vão ser nomeados
A referida clarificação da lei e o restante conjunto de alterações que o Governo pretende levar a cabo no âmbito do PER, e que deverão entrar em vigor no início do próximo ano, vão estar em análise numa acção que a MLGTS promove esta quinta-feira, no seu auditório, em Lisboa. O objectivo é responder à pergunta “Processo Especial de Revitalizaçâo: que futuro?”.
Além da medida referida, outra das alterações previstas na proposta de alteração do PER é a que envolve o regime dos administradores judiciais. Em vez da chamada distribuição equitativa, os responsáveis pela condução passam a ser nomeados por um juiz, em função das competências e experiência que lhes são reconhecidas. “Actualmente, o que a lei prevê é que haja uma distribuição equitativa dos processos, independentemente de quem se apresenta ao PER poder sugerir o administrador judicial, fundamentando esse mesmo pedido”, explica Nuno Gundar da Cruz.
Com esta revisão da lei prevê- -se que, no primeiro trimestre de 2017, passe a vigorar o regime de nomeação. Ou seja, explica o mesmo advogado, “para um processo de especial complexidade passa a prevê-se que o juiz possa, de forma inequívoca, nomear determinado administrador judicial que tenha competências para intervir nos processos”.
A mudança em causa é vista como positiva por Helena Soares de Moura, sobretudo porque “a realidade dos nossos administradores judiciais é totalmente díspar”. Na lista fechada que integram, há quem se dedique em” full time” a estas funções, com equipas especializadas, mas também há quem desenvolva as funções de administrador judicial em simultâneo com outra actividade. Depois de as mudanças na lei entrarem em vigor, será o juiz a nomear o profissional que fica responsável por ajudar a empresa a revitalizar-se.
No que diz respeito à entrada no PER, se até aqui bastava que um credor, mesmo com um valor de créditos irrisório, entrasse com um pedido de revitalização, com as mexidas que deverão ser introduzidas na lei, as exigências vão aumentar. Desde logo terá de haver uma certificação das condições de viabilidade da empresa certificadas por um técnico oficial de contas ou por um revisor oficial de contas. E vai também tornar-se obrigatório que o credor que avance com o PER represente pelo menos 10% da dívida,
Mudanças previstas no PER
As alterações legislativas ao Processo Especial de Revitalização deverão entrar em vigor no primeiro trimestre do próximo ano.
PLANO A USAR SO PELAS EMPRESAS
As pessoas singulares vão deixar de poder recorrer ao Plano especial de Revitalização (PER). Só o poderão fazer as empresas. 0 propósito do legislador é tonar o processo em causa mais especializado e dirigido ao sector empresarial.
NOVAS REGRAS PARA QUEM PODE PEDIR 0 PER
0 futuro regime vai impor que os credores que apoiam a pessoa colectiva no recurso ao PER não podem estar relacionados com a empresa e têm que somar 10% dos créditos totais para que a empresa possa recorrer a um plano de revitalização. 0 legislador quer, deste modo, evitar abusos do recurso a este tipo de mecanismo.
CREDOR ESTADO: FISCO E SEGURANÇA SOCIAL
Prevê-se que os credores Segurança Social e Autoridade Tributária, portanto as entidades estatais, se tornem mais flexíveis no sentido de estabelecer acordos com as empresas. 0 propósito será facilitar a adopção de planos de pagamento que consigam ajudar ao processo de revitalização. Porém, não se sabe ainda como.
ADMINISTRADORES JUDICIAIS NOMEADOS
Os administradores judiciais vão passar a ser nomeados pelo juiz. Tal como sucede com os advogados, terão também acesso ao sistema informático Citius, agilizando e retirando tempo de espera aos processos.
João Maltez | Jornal de Negócios | 03-11-2016
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