António Ventinhas - Quem assume cargos de elevada responsabilidade tem de cumprir os seus deveres. É no mínimo caricato que algumas das pessoas que se revoltam publicamente com a falta de celeridade dos tribunais, quando lhes é dada a oportunidade de despacharem processos, sejam os primeiros a contribuir para os atrasos processuais.
Compete ao Conselho Superior do Ministério Público nomear, colocar, transferir, promover, exonerar, apreciar o mérito profissional e exercer a acção disciplinar relativamente aos magistrados do Ministério Público.
Para além destas competências, o conselho tem ainda poderes para emitir directivas internas no que diz à organização interna e gestão de quadros do Ministério Público.
A sua composição é plural, integrando o Procurador-Geral da República, os Procuradores-Gerais Distritais, magistrados eleitos entre os seus pares, membros eleitos pela Assembleia da República e membros nomeados pelo Governo.
Alguns dos problemas mais relevantes da Justiça portuguesa são discutidos e deliberados no plenário do Conselho Superior do Ministério Público.
Este órgão gere o Ministério Público, pelo que recai sobre os seus membros uma grande responsabilidade.
Para além de prepararem os diversos pontos que são debatidos nas sessões plenárias, cada membro tem de relatar (em linguagem comum apresentar) projectos de deliberação sobre a apreciação classificativa ou disciplinar de magistrados em concreto.
A atribuição de classificações de serviço é determinante, pois permite analisar o desempenho funcional dos magistrados do Ministério Público, sinalizar casos de falta de condições para o exercício da função e permitir que a progressão na carreira não se faça apenas em função da antiguidade, mas sobretudo tendo-se em conta o mérito do magistrado.
A Senhora Procuradora-Geral da República entendeu, e bem, rompendo hábitos de um passado recente que todos os membros do Conselho Superior do Ministério Público, magistrados ou não, deveriam relatar processos classificativos e disciplinares relativos a magistrados.
Com este entendimento, os membros que não são magistrados podem melhor apreciar e escrutinar o trabalho dos procuradores, evitando-se assim visões corporativas sobre o seu desempenho.
O facto do Conselho Superior do Ministério Público incluir membros não magistrados, tem como objectivo uma gestão democrática, participativa, diversificada, de diversas entidades, permitindo assim que a organização não se feche sobre si própria.
Ao longo dos anos, a Assembleia da República e o Governo indicaram para o CSMP individualidades do mundo judiciário de inegável e reconhecido mérito.
A sua participação, empenho e dedicação à causa pública muito têm contribuído para a dignificação e prestígio do CSMP e da magistratura do Ministério Público, bem como têm enriquecido a discussão sobre o melhor modo de organizar o Ministério Público.
No entanto, outros membros tiveram um comportamento diametralmente oposto, tendo aceitado integrar o órgão unicamente por questões curriculares, aparecendo apenas quando o assunto lhes desperta atenção e pouco trabalho.
O facto de se recusarem a relatar processos ou não os entregarem em devido tempo prejudicou a progressão profissional de alguns procuradores de reconhecido mérito profissional.
Por forma à situação ser minorada, os seus processos tiveram de ser distribuídos por outros membros do CSMP, com o necessário aumento de serviço para estes porquanto os próprios não assumiram as suas responsabilidades.
A situação já ocorreu no passado, mas também se verifica actualmente.
Quem assume cargos de elevada responsabilidade tem de cumprir os seus deveres.
É estranho que alguém, em programas televisivos, tenha afirmado repetidamente que o Ministério Público não cumpre os prazos de inquérito e depois não apresentasse em tempo os projectos de deliberação dos processos que lhe foram distribuídos.
É no mínimo caricato que algumas das pessoas que se revoltam publicamente com a falta de celeridade dos tribunais, quando lhes é dada a oportunidade de despacharem processos, sejam os primeiros a contribuir para os atrasos processuais.
O desprezo com que alguns assumiram as suas funções no CSMP encontra-se em consonância com a postura que sempre tiveram relativamente ao Ministério Público. O que é difícil de compreender é porque foram nomeados para assumir um cargo de gestão de uma magistratura que sempre desconsideraram.
Num momento em que se encontram em discussão na Assembleia da República várias escolhas decisivas para órgãos relevantes do Estado (Conselho Económico e Social, Conselho Superior da Magistratura, Provedor de Justiça) é importante que se efectue uma escolha criteriosa das pessoas que irão ocupar tais funções.
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António Ventinhas é presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
Justiça Imperfeita | Sábado Opinião | 19-05-2016
Comentários (8)
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Assim, transmite-se uma ideia de medo ou cobardia de quem informa, informa-se pela metade, impede-se o exercício eventual do direito de defesa da pessoa visada e faz-se recair a apontada crítica sobre todos os membros do CSMP que não são magistrados.
Não me parece bem.
Os bois têm nomes (curtos)
Assim como fez merece apenas um bocejo...
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Quanto à avaliação do mérito só tenho pena que o Conselho, na grande maioria dos casos, se limite a fazer um apanhado do relatório da inspecção, reproduzindo-o, e pouco mais.