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REVISTA DE 2016

Bastonário pede auditoria à Ordem

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Guilherme Figueiredo, recém-eleito bastonário dos advogados, quer conhecer “o real estado” da instituição

Passados os primeiros momentos de euforia por uma vitória conquistada à segunda volta numas eleições em que derrotou a lista presidida pela atual bastonária, Elina Braga, Guilherme Figueiredo, natural e residente no Porto, está já a tratar de encontrar casa em Lisboa, onde passará a maior parte do tempo. Vai largar os processos em que tem estado a trabalhar e coloca reservas quanto à possibilidade de continuar a pleitear em tribunal enquanto se mantiver no cargo. A ideia de “ter o bastonário a litigar com os colegas em tribunal” não lhe parece “razoável, até pelo dever de preservação da figura institucional”. É uma questão que terá ainda de ser mais refletida. Admite suspender o exercício profissional, mas, acrescenta, “gostaria que essa suspensão não fosse completa”.

Para já, quer avançar com um conjunto de medidas internas e outras externas, suscetíveis de proporcionar à Ordem uma intervenção de maior qualidade na definição dos caminhos da justiça, que faz muita questão em sublinhar, “tem estado a ser encarada como um bem económico, quando deve ser vista como um bem essencial dos cidadãos”.

Primeiro quer arrumar a casa. Assim, e no imediato, pretende a realização de uma auditoria externa à Ordem. O objetivo, frisa, “não é perseguir ninguém, mas criar condições para que possa haver uma espécie de ano zero assente no conhecimento do real estado financeiro da Ordem”. Esse será o caminho para “acabar com festas e atividades sem justificação”, racionalizar meios e tornar “possível que se comece a trabalhar numa discriminação positiva a favor dos jovens advogados e das advogadas em período de maternidade”.

Pagamentos dignos Se o aprofundar do regime de incompatibilidades dos advogados pode ser um importante contributo para a discussão sobre o que se entende hoje pela existência de um excessivo número de causídicos, Guilherme Figueiredo defende também que há todo um conjunto de responsabilidades do Estado que têm de ser equacionadas, como “o pagamento digno aos advogados”.

Trata-se de um tema muito ligado à mais vasta questão do apoio judiciário e uma das propostas da nova direção da Ordem passa pela criação de um Instituto Público, com a participação do Ministério da Justiça, que “deverá receber verbas diretamente do Orçamento Geral do Estado para pagar o apoio judiciário”. Na opinião do bastonário, “isso permitiria que o pagamento não ficasse dependente de quem é o ministro em cada momento ou da sua maior ou menor boa vontade”.

A área das custas judiciais constitui uma das grandes preocupações de Guilherme Figueiredo. Defensor da sua redução, aposta na criação de um teto, “que não existe, e isso é espantoso”, diz. Além disso sustenta a importância de criação de isenções de custas para algumas pessoas singulares, “como é o caso dos trabalhadores por conta de outrem nos conflitos laborais”.

Especialista em Direito do Trabalho, Figueiredo vai mais longe e propõe a obrigatoriedade de constituição de advogado em circunstâncias em que não está contemplada, como na audiência de partes. Por norma está sempre o trabalhador, isolado, frente a uma entidade patronal assistida por um advogado, “o que gera grandes desequilíbrios”, afirma. Depois, acontecem situações inexplicáveis, como a que decorre da isenção de taxas de justiça quando o trabalhador se dirige diretamente ao Ministério Público, e a não isenção se optar por recorrer a um advogado.

Ética da discussão No tocante ao acesso mais facilitado à justiça, Guilherme tem apresentado uma proposta polémica. Tal como na Saúde, devia haver, diz, uma taxa moderadora. Quando confrontado com a possibilidade de abusos, responde que “os tribunais podem aplicar a litigância de má fé e multar quem abusa do sistema”.

Adepto da transformação da Ordem dos Advogados num espaço de “defesa da ética da discussão e de uma cultura de admissão do outro e da diferença”, tem uma medida simbólica para apresentar. De três em três meses pretende reunir todos os anteriores bastonários que possam estar disponíveis para participar num debate de temas relevantes para a advocacia e para o Estado de direito democrático.

Esta insistência na qualificação do Estado não é inocente. Remete diretamente para os Estatutos da Ordem, que Figueiredo quer rever, e onde se fala apenas de Estado de direito. Ora, explica, antes do 25 de Abril “também tínhamos um Estado de direito, só que não era democrático”.

Não por acaso, pretende alargar o âmbito da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Ordem, que passará a incluir uma CDU para as questões sociais e da natureza. “Em causa está o futuro da humanidade, e isso trabalha-se no presente”, diz o bastonário.

Por fim, um tema sempre muito caro em tudo o percurso pessoal de Guilherme Figueiredo. Tão rápido quanto possível, quer retomar a publicação do “Foro das Letras”, agora alargado às artes. Tentará organizar um evento anual, com exposições ligadas às artes e à fotografia, e com várias iniciativas ao longo de um dia sobre poesia e literatura. Não se trata apenas de uma valorização de gostos pessoais. É, antes, refere, porque na advocacia sempre houve muita gente a revelar uma grande qualidade literária, como se percebe quando recorda nomes como os de António Osório, Manuel António Pina, Vasco Graça Moura ou Mário Cláudio. Se a poesia continuará a fazer parte do seu quotidiano, a cultura, conclui, “vai ter de entrar na Ordem”.

Expresso | 10-12-2016

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