In Verbis


icon-doc
REVISTA DE 2015

Mulheres condenadas por homicídio conjugal têm penas inferiores

  • PDF

As mulheres condenadas por homicídio conjugal têm, em média, penas inferiores aos homens, sendo-lhes aplicada mais frequentemente pena suspensa, e representam cerca de 10% do total de condenados por aquele crime.

O estudo, da autoria da Escola de Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, foi encomendado pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) e analisou Decisões judiciais em matéria de homicídios conjugais.

Para o trabalho em causa foram recolhidas e analisadas 237 decisões judiciais, com trânsito em julgado, proferidas entre 2007 e 2012, por tribunais judiciais de primeira instância ou por tribunais superiores, relativamente ao crime de homicídio conjugal.

Numa análise sociodemográfica dos condenados e das vítimas, num universo de 197 pessoas, é possível constatar que, entre as vítimas, 177 (89,8%) são mulheres e 20 (10,2%) são homens, enquanto nos condenados a proporção é de 179 homens (90,9%) para 18 (9,1%) mulheres.

A idade média da vítima é ligeiramente inferior à do/a condenado/a e, em 23,5% das situações, a idade do/a condenado/a supera a da vítima em mais de 10 anos, diz o estudo.

As vítimas têm sobretudo entre 26 e 45 anos (51,6%), com habilitações ao nível do ensino superior (36,4%) e do ensino secundário (27,3%), são casadas (71,7%), estão empregadas (78,8%), são de nacionalidade portuguesa (94,9%) e têm rendimentos mensais médios até 500 euros (50%) e entre 501 e mil euros (40,6%).

Já o agressor tem entre 26 e 45 anos (51,6%) e entre 46 e 65 anos (32,6%), habilitações literárias ao nível do primeiro ciclo (45,5%), é casado (53,7%), está empregado (61,9%), é português (91,3%) e aufere, em média, mensalmente entre 501 e mil euros (41,7%).

São predominantes as situações em que o casal mantinha no momento da prática do crime a relação de intimidade (casados, união de facto, coabitação e namorados), representando 54,3% dos casos estudados, diz o estudo.

Apesar do reduzido número de mulheres condenadas, os investigadores conseguiram constatar que a pena média que lhes é aplicada é tendencialmente inferior à determinada para os homens.

De acordo com o estudo, verificou-se uma diferença de 1,77 anos para o homicídio simples consumado, de 0,77 para o homicídio qualificado consumado, de 0,41 anos para a tentativa de homicídio simples e de 2,15 anos para a tentativa de homicídio qualificado.

A investigação apurou que os 98 casos de homicídio constituem 49,8% do total consumado, incluindo 12 mulheres condenadas.

No caso dos homicídios simples (34,7%), as penas aplicadas em 29 dos 34 casos foram de prisão efetiva, com exceção para uma mulher que ficou com pena de prisão suspensa e quatro casos que foram declarados como inimputáveis.

No que diz respeito aos homicídios qualificados (63,3%), foram todos sentenciados com prisão efetiva.

Os 99 casos de homicídio na forma tentada constituem 50,2% do total e incluem sete mulheres condenadas, lê-se no estudo, que acrescenta que, das 43 tentativas de homicídio simples, (43,4%) resultaram em 21 prisões efetivas, 20 penas privativas da liberdade e duas medidas de segurança detentiva.

Das cinco mulheres condenadas por tentativa de homicídio simples, quatro viram a respetiva pena de prisão suspensa na sua execução, revelam os investigadores.

A investigação revelou igualmente que, em cerca de metade dos casos, existem situações de violência anterior exercida pelo/a condenado/a sobre a vitima e que o/a condenado/a tem antecedentes criminais, incluindo delitos contra as pessoas, em cerca de um terço dos casos.

A investigação diz ainda que o combate ao homicídio conjugal passa pela prevenção e repressão da violência doméstica e pela aplicação de medidas de afastamento do autor do crime em relação à vítima.

Mentalidades são obstáculo ao combate à violência doméstica.

A secretária de Estado da Igualdade defende que a maior falha no combate à violência doméstica está nas mentalidades que ainda consideram que este é um assunto do foro privado, quando aos olhos da lei se trata de um crime público desde 2000.

A secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares da Igualdade esteve na apresentação de dois estudos, encomendados pela Comissão para a Igualdade de Género (CIG), um sobre a Avaliação das decisões judiciais em matéria de violência doméstica e outro sobre a Avaliação das decisões judiciais em matéria de homicídio conjugal.

Relativamente ao primeiro estudo, Teresa Morais apontou como padrão preocupante o facto de haver um número elevado de arquivamentos e de suspensões de processo, bem como de penas suspensas de prisão. 89% de penas suspensas é muito e em muitos desses casos a pena foi suspensa sem ter sido imposto ao agressor medidas de obrigação de frequência de programa ou de afastamento da vítima, como a lei já determina, apontou. Para Teresa Morais, esse dado mostra que continua a haver muitos casos em que a prova não é feita eficazmente ou a vítima não colabora na recolha da prova.

Por outro lado, em relação ao estudo sobre os homicídios conjugais, destacou que há uma maior sensibilização das magistraturas, mas apontou como dado interessante o facto de 90,9% dos condenados serem homens e de na minoria dos casos em que o homicida é uma mulher, as penas médias aplicadas serem inferiores à dos homens.

Estes e outros dados levaram Teresa Morais a concluir que já não é tanto o sistema no seu conjunto que falha, mas que o que é preciso mudar é a atitude que a sociedade portuguesa e o sistema judicial ainda têm perante este fenómeno. A permissividade que a sociedade portuguesa ainda apresenta a este fenómeno, a tolerância que a sociedade ainda apresenta em algumas regiões do país a estes comportamentos tem definitivamente que acabar e isso faz-se por via de um trabalho continuado de sensibilização e de educação, mas também com responsabilização mais eficaz e mais efetiva dos agressores, defendeu a secretária de Estado.

Na opinião da governante, é fundamental que os agressores percebam que não são donos das suas mulheres. Não podem dispor da vida das suas mulheres como se elas fossem propriedade sua e o respeito por esses direitos implica naturalmente uma mudança de atitude que tem que se fazer no próprio agressor, apontou Teresa Morais.

Na opinião da secretária de Estado, este é um trabalho que tem vindo a ser feito legalmente, logo a partir do momento em que se passou a colocar o enfoque na vítima e na sua proteção e quando se definem mecanismos de acompanhamento dos agressores. Acompanhamento que, de acordo com a governante, deve ser feito, não tanto pela preocupação para com o agressor, mas porque ele poderá fazer novas vítimas ou agredir novamente a mesma vítima.

Por isso, Teresa Morais não tem dúvidas em afirmar que o principal problema que ainda subsiste é a mentalidade ainda dominante, principalmente nos países do sul da Europa, de que há um universo em que tudo o que se passa é do foro privado, apesar da violência doméstica ser crime público desde o ano 2000. Às vezes a vida e a mentalidade não acompanha a velocidade da lei e fica para trás, rematou.

Lusa/WKP, JusJornal, N.º 2187, JusNet 810/2015 | 13-07-2015

Comentários (0)


Exibir/Esconder comentários

Escreva o seu comentário

reduzir | aumentar

busy

Últimos conteúdos

Com o termo do ano de 2015, cessaram as publicações de conteúdos nesta Revista Digital de 2015.Para aceder aos conteúdos...

Relatório de gestão da comarca de Lisboa revela falta de dinheiro para impressoras, papel higiénico, envelopes e lâmpada...

Mudança ignorou dúvidas de constitucionalidade levantadas pelos dois conselhos superiores dos tribunais, pela Associação...

Portugal assinala 30 anos de integração europeia a 1 de Janeiro, e três décadas depois de ter aderido à então Comunidade...

Últimos comentários

Atualidade Tribunais Mulheres condenadas por homicídio conjugal têm penas inferiores

© InVerbis | Revista Digital | 2015.

Arquivos

• Arquivos 2012 | 2013 |2014 |
Arquivo 2007-2011
Blog Verbo Jurídico
(findo)

Sítios do Portal Verbo Jurídico