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REVISTA DE 2015

Auditoria revela descontrolo financeiro no TC

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Primeira auditoria feita ao TC coloca em causa a "fiabilidade" da prestação de contas do tribunal e aponta várias irregularidades. Cada juiz tem um veículo para uso pessoal e há gastos não justificados. Constitucional reage com "verdadeiro desgosto", "preocupação" e fala em "infundadas conclusões".

A primeira auditoria alguma vez feita ao Tribunal Constitucional (TC) revelou um descontrolo financeiro nas contas daquela instância superior. O cenário retratado pelo Tribunal de Contas (TdC), naquela que é a última auditoria a tribunais superiores – antes foi fiscalizado o Supremo Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Administrativo –, é o de desorganização nas contas do Constitucional relativas a 2013.

A auditoria, revelada esta terça-feira no site do TdC, considera "desfavorável" a "fiabilidade dos documentos de prestação de contas" desse ano face a erros e irregularidades. Entre estes, o TdC destaca o facto de o sistema de controlo interno do tribunal fiscalizado ser "deficiente", de não existir um manual de procedimentos de controlo interno, assim como o de não se registar o cumprimento dos "princípios e regras orçamentais" relativamente a 1,4 milhões de euros no âmbito da "contabilização da receita e da despesa no orçamento".

Em comunicado, o Tribunal Constitucional regista "com preocupação" que se formulem "infundadas conclusões" e emitam "recomendações aparentemente assentes em deficiente compreensão do seu estatuto constitucional próprio, do qual decorre a sua autonomia administrativa e financeira". Em resposta, o presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, garante que vão corrigir "com a brevidade possível" as situações que possam "estar em desconformidade" e foi com "verdadeiro desgosto" e "preocupação" que reagiu ao relatório da auditoria: "Seguramente injusto perante o que é a realidade" e a "gestão financeira" do TC, diz.

Fica também claro no relatório que o TC não contabilizou nas suas contas 13 mil euros correspondentes ao accionamento de garantias bancárias assim como a transacção de 21 mil euros em gastos.

O exame às contas do TC permitiu também perceber que cada um dos 13 juízes conselheiros tem direito a um automóvel do tribunal para uso pessoal desde o ano 2000. Além das viaturas, são ainda entregues cartões de combustível e de via verde, porém, o TdC salienta que apenas o presidente e o vice-presidente do TC têm direito a veículo oficial, não existindo regulamentação sobre o uso de veículos de serviços gerais para os restantes juízes.

O TC responde que a lei prevê que pode ser "afectado ao uso pessoal de cada juiz" um carro da frota do tribunal, que pode ser conduzido pelo próprio, "designadamente enquanto o quadro de pessoal do tribunal não estiver dotado de um número de motoristas suficiente para a condução de cada uma dessas viaturas".

Joaquim Sousa Ribeiro alega ainda, numa extensa resposta, que "nos tribunais dotados de autonomia administrativa e financeira compete ao presidente regular, por despacho, a utilização pelos magistrados dos veículos da respectiva frota". No caso concreto, afectar aos magistrados um veículo foi uma "solução mais económica para o Estado, pois a alternativa seria a entrada ao serviço de mais onze motoristas", lê-se.

As irregularidades verificam-se ainda no pagamento do subsídio de refeição que os juízes recebem em acumulação com as ajudas de custo por participação em cada sessão do tribunal. O TdC considera que essa acumulação se regista sem "conformidade legal". Os magistrados não poderiam acumular as verbas pelo que o "abono diário do subsídio de refeição" teria de ser descontado. O pagamento global aos juízes de 12.329 euros a esse título entre Novembro de 2012 e Dezembro de 2013 é ilegal e "resultaram num dano efectivo para o erário público".

Joaquim Sousa Ribeiro ressalva, contudo, que "até ao presente, nunca as falhas e as deficiências" trouxeram "perdas patrimoniais para o Estado". O magistrado considera ainda que "uma vez que a ajuda de custo é abonada por cada dia de sessão do tribunal em que os juízes participem, e por mais dois dias por semana, independentemente da deslocação implicar almoço, jantar ou dormida, não pode afirmar-se que, neste caso, o pagamento da ajuda de custo corresponda ao pagamento de duas refeições e alojamento".

Nesse ponto, o TdC aponta precisamente entre os responsáveis pela infracção sancionatória continuada o presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, e a secretária-geral do Constitucional, Maria Lopes.

O TdC sublinha ainda que o Constitucional pagou os suplementos de disponibilidade permanente a dois dirigentes sem um despacho de autorização que mesmo existindo não teria "suporte legal". A auditoria considera igualmente que o suplemento de forças de segurança pago a guardas da GNR e o pagamento de suplementos de risco e de disponibilidade permanente a agentes da PSP foram pagos indevidamente (todos eles motoristas ao serviço do TC).

Durante a fiscalização, o TdC verificou ainda que nas instalações deste funciona um bar "explorado por particulares" sem contrato de arrendamento, autorização e mesmo sem pagar renda. Além da "cedência gratuita", o TC ainda assume as despesas de luz, água e gás do bar cuja concessão de serviço pública está assim irregular. Joaquim Sousa Ribeiro explicou, no contraditório, que a "solução é precária" e "transitória".

Face às irregularidades detectadas, o TdC, que remeteu as suas conclusões para o representante da Procuradoria-Geral da República junto do tribunal, recomenda que o Constitucional implemente sistemas de "gestão e controlo", "promova regulamentação adequada de utilização e de controlo dos veículos de serviços gerais" e "deduza o subsídio de refeição" nas ajudas de custo aos magistrados.

Por seu lado, o presidente do TC salienta que "no decurso da auditoria, algumas decisões já foram tomadas e alguns procedimentos adoptados, nesse sentido, estando outros em vias de implementação", acrescentando que "o TC procederá aos reajustamentos necessários para aperfeiçoamento do seu sistema de controlo interno", em matéria de registos contabilísticos e financeiros. O presidente justifica ainda que a "escassez de recursos, mormente humanos" poderá, "em muitos casos", explicar "o não cumprimento rigoroso de exigências formais".

O presidente do TC recorda também que, face à "conjuntura", tomou medidas que o relatório "silencia": pôs termo a um contrato de fornecimento de almoços; denunciou o contrato de arrendamento de um prédio contíguo ao Palácio Ratton; renegociou contratos de comunicações móveis, de seguros individuais de automóveis com "a celebração de um contrato de frota automóvel, o que implicou uma redução em mais de 50% da despesa anual". Entre outras medidas, cessaram "a colaboração de cinco das onze secretárias do gabinete dos juízes".

Pedro Sales Dias e Maria João Lopes | Público | 21-04-2015

Comentários (12)


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descontrolo no TC, problemas de escutas no TRLx, magistrados a falar no facebook, ... não acredito.
antunes de mértola , 22 Abril 2015 - 09:32:05 hr.
...
VIVA PORUGAL! Viva a Democracia! VIVA SALAZAR! Salazar, estás perdoado. Volta! Eras um homem sério, morreste pobre.
Silva , 22 Abril 2015 - 10:08:12 hr.
Ai TC, TC
Para rejeitarem logo a admissão de recursos, muitas vezes com interpretações extremamente duvidosas e inconstitucionais afectando cidadãos que lutam pela justiça e cobrarem as custas pesadíssimas (mais dinheiro para o TC) e cuja alternativa é de recorrer para o TEDH, mas muitos não podem fazer por questões financeiras.

Agora é risível que em causa própria façam interpretações suis generis para serem favorecidos em questões financeiras alegadamente ilegais.

Nem sequer foram, segundo o relatório do Tdc afectados pelos cortes no vencimento que o resto da função pública teve.

Eu também estaria desgostoso se tivesse sido descoberto a defender o indefensável.

As mordomias neste país tresandam.
... , 22 Abril 2015 - 10:23:35 hr.
...
Por alguma razão os camaradas acham que se pode cortar a eito aos FP, juízes, MP´s etc. A eles nada lhes custas, mesmo quando não têm direito sacam o deles!
policiado e mal pago , 23 Abril 2015 - 02:22:42 hr.
...
Será que os resultados da auditoria foram comunicados ao MP, para os devidos efeitos?
Valmoster , 23 Abril 2015 - 14:40:09 hr.
agora só falta ver
agora só falta ver as contas e as despesas do tribunal de contas...
A B C , 23 Abril 2015 - 14:48:19 hr.
...
Isto dava para rolar no chão a rir a bandeiras despregadas.
Tanto rigor, tanta intransigência na defesa dos direitos do cidadão e dos arguidos, e porém, no entanto, todavia, contudo,...

AAAAHHH ah ah ah ah ah ah ah .....
Hannibal Lecter , 23 Abril 2015 - 18:09:45 hr.
São rosas, senhor... São rosas...
13 000 € em 14 anos!
Não, não são milhares de milhões de euros por ano, como nas PPP, no BPN, inter alea...
Não há nenhum serviço público ou empresa privada que não tenha irregularidades deste jaez. Isto é de uma dimensão risível...
Mas a alguém interessa trazer a público uma treta destas, como se fora escândalo. Visa-se atingir a honorabilidade do TC, como se ali Th fosse coió de "piratas". A quem aproveita isto? Pois! E quem não percebeu?
Francisco do Torrão , 23 Abril 2015 - 19:09:13 hr.
...
Vê-se bem que não são comportamentos de verdadeiros juízes, que de facto não são.
Valmoster , 24 Abril 2015 - 13:26:52 hr.
suposto angelical tribunal de contas
já se pensou que isto faz parte da estratégia dos 2 individuos que mandam no suposto angelical tribunal de contas (a nova vaca sagrada do regime)?
um deles talvez queira ser presidente da república...
o outro talvez queira colaborar na renegociação das PPP..., em defesa do interesse público, claro.
martins josé , 24 Abril 2015 - 22:30:34 hr.
verdadeiros juizes, contratos das subconcessões rodoviárias
IN: http://www.tvi24.iol.pt/politi...-4072.html :
O ex-presidente da Estradas de Portugal (EP) Almerindo Marques afirmou, esta sexta-feira, que, enquanto esteve à frente da empresa pública, entre 2007 e 2011, havia pressão do primeiro-ministro, José Sócrates, para contratualizar obra. ...
Na comissão parlamentar de inquérito às Parcerias Público-Privadas (PPP), Almerindo Marques disse que existia «pressão do primeiro-ministro da época para ser contratualizada mais e mais obra».
Questionado pelo deputado do PSD Fernando Macedo sobre a forma como essa pressão era consumada, o gestor explicou que Sócrates exercia a pressão através do secretário de Estado das Obras Públicas. «Pressionava as estruturas políticas, o senhor secretário de Estado, para me dar instruções nesse sentido.»
Almerindo Marques contou que «houve diligências» entre o Governo e o Tribunal de Contas (TC) «para encontrar uma solução» para os chumbos da instituição aos contratos das subconcessões rodoviárias, o que conduziu à «reformulação dos referidos contratos».
Questionado pelo deputado do CDS-PP, Altino Bessa, quanto à intervenção do Governo liderado por José Sócrates, o gestor recordou uma reunião na sede do Conselho de Ministros, «a um sábado à tarde», em que estavam presentes técnicos da EP, da secretaria de Estado das Obras Públicas e também do TC.
Almerindo Marques referiu a presença do secretário de Estado das Obras Pública de então, Paulo Campos, e do juiz conselheiro José Tavares em representação do TC.


IN: http://www.noticiasaominuto.co...os-os-dias :
Na audição na comissão de inquérito, Almerindo Marques afirmou que houve diligências entre o Governo de José Sócrates e o Tribunal de Contas para encontrar uma solução para os chumbos da instituição aos contratos das subconcessões rodoviárias, recordando uma reunião na sede do conselho de ministros, "a um sábado à tarde", em que estavam presentes técnicos da EP, da secretaria de Estado das Obras Públicas e também do Tribunal de Contas.
Já então a instituição liderada por Oliveira Martins esclareceu que a presença do seu director-geral em reuniões com membros do Governo não tem como intuito ajudar a contornar o chumbo do Tribunal, mas sim explicar "o alcance da decisão".
"O director-geral foi solicitado a informar sobre o sentido e alcance das decisões tomadas, tendo salientado as ilegalidades apontadas pelo Tribunal e o carácter inequívoco das suas consequências", explicou então o Tribunal de Contas, num esclarecimento enviado à agência Lusa, sublinhando que, enquanto os juízes decidem os processos, o director-geral não os conhece nem participa nas decisões.
ana maria s. , 25 Abril 2015 - 23:53:47 hr.
explicar, esclarecer, ajudar, cooperar, independencia...
Interessante que o T Const recusou há poucos meses ao Governo/AR explicar/esclarecer como é que estes deveriam cumprir os seus acordaos. é o normal nos tribunais. há juristas nas partes processuais para compreenderem as decisões dos tribunais. Não é o juiz ou um seu administrador do tribunal que vai explicar aos incumprdores como é que devem cumprir o que já foi decidido preto no branco...
Já o T de Contas esse explicou/esclareceu... num sabado à tarde... ao Governo de Sócrates e à EP..., como disse Almerindo Marques!!!
m. lopes , 27 Abril 2015 - 14:37:25 hr.

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