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REVISTA DE 2015

Defesa de Sócrates queria obrigar CM a pagar 350.00€ por notícia

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Juíza aceitou providência e proibiu jornal de divulgar dados do processo, mas reduziu sanções pecuniárias. Jornal diz-se alvo de "mordaça" e "concorrência desleal". Sanções que forem pagas revertem a favor do Estado e do ex-governante.

Os advogados de José Sócrates pretendiam que o Correio da Manhã e os seus jornalistas pagassem uma sanção pecuniária total que poderia ir até 350 mil euros de cada vez que, de futuro, o jornal publicasse notícias com dados sobre o processo que está em segredo de justiça. O pedido está expresso na providência cautelar citada na decisão judicial da 1.ª secção cível da instância central de Lisboa e proíbe notícias neste âmbito no Correio da Manhã.

Além da violação do segredo de justiça, está em causa o facto de dois jornalistas se terem constituído assistentes no processo e, depois de terem acesso ao seu conteúdo, terem alegadamente passado a informação a colegas que a publicaram, segundo o tribunal.

A Cofina Media, proprietária do Correio da Manhã, pagaria um valor "não inferior a 100 mil euros por cada infracção", o director, os dois jornalistas que se constituíram assistentes e os que têm assinado as notícias sobre o caso pagariam em conjunto um valor total que poderia ir até 250 mil euros, consoante os autores das notícias em causa. O objectivo é persuadir os jornalistas e o jornal a não violarem a decisão judicial.

Porém, e ao contrário do referido num comunicado da defesa enviado na madrugada desta quarta-feira sublinhando que a providência foi "integralmente deferida" pelo tribunal, a juíza reduz em grande medida os montantes pedidos. Se não cumprir a proibição, a empresa dona do jornal pagará dois mil euros por cada infracção, os dois jornalistas assistentes e o director mil euros cada e os quatro autores das notícias identificados no processo 500 euros cada, o que perfaz um total que poderá chegar a 7 mil se o tribunal considerar que todos estes jornalistas são responsáveis face a uma infracção. Segundo o Código Civil, o total da sanção reverte em partes iguais para o Estado e para o credor, neste caso, Sócrates.

Em muitos casos em que jornalistas são arguidos por violação do segredo de justiça, os tribunais decidem absolver face ao interesse público e considerando que constitucionalmente este tem primazia sobre o segredo de justiça imposto. A juíza, porém, não reconhece qualquer interesse público nas notícias até agora publicadas pelo jornal. Conclui ainda que o "segredo", "a presunção de inocência e os direitos de personalidade prevalecem, cedendo o dever de informar que tem como limites os direitos, deveres e proibições constitucional e legalmente consagrados" e que neste caso "se justificam".

O tribunal decidiu com urgência sem fazer o contraditório. O jornal e os jornalistas nem tinham conhecimento de que a decisão estava em curso. A magistrada deu razão à defesa que alegou que se "fossem citados para o procedimento cautelar", "facilmente fariam circular informações caluniosas e fantasiosas sobre" Sócrates. O jornal irá agora responder à providência cautelar, que visa evitar a publicação de notícias. Na edição desta quarta-feira, o Correio da Manhã considera a decisão uma "mordaça" e o seu director-adjunto, Eduardo Dâmaso, diz que "este tipo de silenciamento aproxima-se perigosamente da ideia de censura prévia". Ao PÚBLICO, o director-adjunto lamentou também a "concorrência desleal" que "resulta" desta decisão. "No dia em que a providência cautelar entra em efeito, o JN faz manchetes com o caso e nós não podemos publicar", disse. O director do JN, Afonso Camões não comentou.

Já Pedro Delille, um dos advogados de Sócrates, diz que "entre o Correio da Manhã e o JN há diferenças" e que o Correio da Manhã, que "é assistente e violou o segredo para difamar e deturpar, está engajado com a acusação". O advogado admitiu ainda que a defesa do ex-governante poderá interpor providências cautelares contra outros jornais "sempre que [Sócrates] se sentir ofendido" e mandatar nesse sentido.

Os jornalistas e os meios de comunicação detidos pelo grupo, entre eles também a CMTV, um canal de televisão e a revista Sábado, ficam proibidos de "editarem, publicarem, ou divulgarem" por qualquer meio o que está no processo em que Sócrates é arguido, nomeadamente "despachos e promoções do Ministério Público, documentos, despachos, decisões das autoridades judiciárias competentes e transcrições ou o teor de conversas alvo de intercepções telefónicas". Proibiu ainda a empresa e os jornalistas de "vender ou ceder gratuitamente ou de qualquer modo, edições impressas do jornal" que contenham notícias com elementos que estão no jornal. A Cofina é ainda avisada que deve retirar das bancas, dentro de três dias, todos os exemplares que tenham notícias nesse âmbito.

Sindicato dos Jornalistas: Decisão abre grave precedente

O Sindicato dos Jornalistas considerou nesta quarta-feira a que a decisão judicial que impede a Cofina de publicar notícias sobre o processo que envolve José Sócrates "abre um grave precedente" e que leva "a constrangimentos" no direito de informar.

"A direcção do Sindicato dos Jornalistas entende que o recente caso relacionado com as publicações do grupo Cofina abre um grave precedente e provoca constrangimentos ao exercício do direito de informar", publicou nesta quarta-feira à noite aquele órgão sindical na sua página na Internet.

Para o sindicato, "são condenáveis todas as tentativas de limitar a liberdade de imprensa" e todas as tentativas de "limitar a liberdade de imprensa e de informação, valores constitucionalmente protegidos, são condenáveis".

O sindicato salienta que "encoraja" a investigação jornalística autónoma no contexto de processos judiciais em que se verifique relevante interesse público.

Pedro Sales Dias | 28-10-2015

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