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REVISTA DE 2015

PGR não reage a acusações de Paula Lourenço

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O artigo de opinião publicado no boletim da Ordem dos Advogados por Paula Lourenço, advogada de Carlos Santos Silva e Gonçalo Trindade Ferreira, tece duras críticas à actuação do Ministério Público e do juiz Carlos Alexandre no âmbito da Operação Marquês. Ausência de mandados, ilegalidades na recolha de prova e "sequestro" são algumas das acusações. Mas a Procuradoria-Geral da República (PGR) não comenta a posição de Paula Lourenço.

Numa resposta escrita enviada ao PÚBLICO, a PGR diz apenas que "o Ministério Público pronuncia-se no âmbito dos processos" e que, por agora, não há "informação adicional à anteriormente prestada". "O processo mantém-se em segredo de justiça", reitera. Nada mais se acrescenta sobre o polémico artigo em que Paula Lourenço - num contexto de "suponhamos", como escreve no texto - descreve supostas ilegalidades na recolha de prova e interrogatório dos seus clientes, como a privação da presença da defesa, de banho e de roupa lavada nos primeiros dias.

A advogada acusa ainda as autoridades de darem aos jornalistas informações para promoverem "um clima populista de condenação dos suspeitos na praça pública para justificar medidas menos ponderadas ou ilegais ou injustas".

Paula Lourenço, que representa o advogado Gonçalo Trindade Ferreira (o único arguido que não ficou em prisão preventiva) e o empresário Carlos Santos Silva, amigo de longa data do ex-primeiro-ministro, diz que os mandados não foram entregues aos dois clientes quando foram detidos, o que os impediu de chamar um advogado.

Paula Lourenço refere-se aos detidos como "vítimas do sequestro ocorrido no dia 20 de Setembro de 2014", um dia antes da detenção de José Sócrates, e critica a "violência com que despejam gavetas e circulam em passo militar pela casa", na presença da mulher e filhos pequenos de Trindade Ferreira que assistiram a tudo "horrorizados". Todas estas situações levam a advogada a concluir que os arguidos têm agora de se defender também no campo mediático, mesmo que seja necessário passar por cima do segredo de justiça.

O PÚBLICO tentou também ouvir a bastonária da Ordem dos Advogados, mas Elina Fraga, segundo a sua assessora, encontra-se no estrangeiro e indisponível. No entanto, sobre a Operação Marquês, a advogada, numa entrevista à Rádio Renascença no final de Janeiro, tinha acusado o Ministério Público de violar o segredo de justiça. "É a própria investigação criminal que entrega e tem relações perigosas e promíscuas com a comunicação social. Este caso evidenciou que ainda antes de haver advogados no processo já se violava o segredo de justiça", afirmou.

Em Novembro, logo após as detenções de José Sócrates, Carlos Santos Silva, Gonçalo Trindade Ferreira e do motorista João Perna, a bastonária também já tinha advertido que poderiam existir requisitos legais que não foram cumpridos neste caso. "Temos visto nos últimos tempos com preocupação a permanente detenção de pessoas para interrogatório. A detenção só pode ser feita de acordo com aquilo que está estipulado no Código de Processo Penal (CPP) e, portanto, havendo perigo de fuga, flagrante delito, perigo de continuação da actividade criminosa ou havendo o perigo de alguma intranquilidade na comunidade", alertou Elina Fraga.

Espectáculo mediático

"As detenções que estão a ser feitas, à primeira vista, parecem não ser demasiado ponderadas" e é "preciso perceber que qualquer detenção que não cumpra estes requisitos é uma detenção ilegal", acrescentou a bastonária, à margem da IX Convenção das Delegações da Ordem dos Advogados.

Na altura, criticou também o "espectáculo mediático" em que decorrem algumas detenções, considerando "estar-se a estimular a justiça na praça pública, com pessoas a serem detidas sem que haja o gozo da presunção de inocência, à frente de câmaras de televisão, com fugas de informação que constituem violações do segredo de justiça, o que é crime em Portugal".

Sindicato defende equilíbrio entre direito de informar e segredo de justiça

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas (SJ) defende que o jornalista não pode ser nem "cúmplice do investigado nem dos investigadores".

Numa tomada de posição divulgada ontem, lê-se: "Esta profissão trabalha para aumentar a liberdade dos cidadãos na formulação de juízos ponderados de valor em matérias de relevância pública – não para encobrir a delinquência, venha ela de onde vier." A presidente do conselho deontológico, São José Almeida (jornalista do PÚBLICO), afirmou que este órgão "respeita o segredo de justiça", sem que isso impeça o trabalho dos jornalistas, e justificou que esta nota se destina a todos os profissionais, em especial aos jovens jornalistas.

"Nem cúmplice do investigado, nem dos investigadores, este deve ser o lema do jornalista digno de tal nome", lê-se ainda na nota divulgada numa altura em que no foco da atenção mediática estão vários casos como o processo que levou à detenção do ex-primeiro-ministro José Sócrates ou ainda o dos vistos gold, que levou à detenção do director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Para o órgão deontológico dos jornalistas, é preciso "encontrar a justa medida da convivência" entre os valores do direito de informar e o segredo de justiça.

Depois de lembrar que o segredo de justiça visa proteger a investigação criminal e garantir o respeito pela presunção da inocência do investigado, este órgão do SJ recomenda que o jornalista "não deve prejudicar a investigação judicial" e lembra que também não deve "divulgar peças de processo que não investigou", se apenas "as recebeu de um interveniente no processo judicial".

"Reproduzir tais peças, sem contraprovas nem contraditório, transforma o jornalista em portavoz", lê-se ainda no texto. Por outro lado, se um jornalista "tiver conhecimento de uma peça ou episódio do processo em segredo de justiça, não fica coarctado do direito a informar", afirma o conselho deontológico. "Essa é uma missão de vigilância ao serviço da cidadania a que um jornalista não pode furtar-se, sejam quais forem as ameaças do prevaricador que o deseje silenciar, usando como escudo o lado formal do segredo de justiça", concluiu.

Romana Borja-Santos | Público | 16-02-2015

Comentários (3)


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Não é a PGR que tem de reagir ao artigo. É a OA. É claro que a actual bastonária será a primeira a ter legitimidade moral para despoletar um procedimento disciplinar.
sorrisa , 17 Fevereiro 2015 - 12:31:01 hr.
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Ó Senhor "Sorrisa", procedimento disciplinar para quê?? NÃO DÁ EM NADA! Ou tem dúvidas?? Só se for para entreter com trabalho os funcionários do Conselho de Deontologia...
o desiludido com a justiça portuguesa , 17 Fevereiro 2015 - 13:37:01 hr. | url
...
Tais desmandos, ocos e desbocados apresentados no chamado “artigo de opinião” (que, além de factos que refere, de opinião nada têm) publicado no dito "boletim", inserem-se na treta bacoca da “uma Ordem a uma só voz”, na qual parece inexistir qualquer entidade (órgão) com responsabilidades estatutárias que na “casa” cuide da deontologia.
E fora da dita "casa", quanto a competências para tratar da “presente questão”, fica-se com a ideia que também o MP continua a “assobiar e a olhar para o ar”.
o ofendido , 20 Fevereiro 2015 - 13:04:57 hr.

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