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REVISTA DE 2015

A carta de Roma e a independência do MP

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António Cluny - A 17 de Dezembro de 2014, o Conselho Consultivo dos Procuradores Europeus do Conselho da Europa aprovou a Carta de Roma sobre os princípios que devem orientar os estatutos do Ministério Público (MP) no âmbito Europeu. Neste importante documento afirma-se, logo no início, que "a independência do MP constitui o corolário indispensável da independência do poder judicial".

Esta importante constatação foi proclamada já antes, em Janeiro de 1991, pela Associação de Magistrados Europeus pela Democracia e as Liberdades (MEDEL).

Entretanto, muitos anos passaram e, no universo judiciário europeu e internacional, novas associações de juizes e procuradores surgiram, as quais, ainda que mais conservadoras e essencialmente corporativas, se viram obrigadas a alinhar também na defesa da independência da magistratura do MP.

Hoje, com a contribuição, tardia, mas bem-vinda, de algumas dessas associações, foi possível chegar a este documento - chave para a estruturação desta magistratura a nível europeu.

E, todavia, o que parece agora claro para quase todos não o era, então, para muitos: mesmo para alguns magistrados.

2. A independência do MP face aos poderes políticos dos diferentes países é, na realidade, a qualidade que lhe permitiu assumir a posição de autoridade judiciária, tal como entendida pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH). Foi, precisamente, essa qualidade estatutária e funcional que possibilitou, entretanto, a aprovação de novos Códigos de Processo Penal de estrutura acusatória na generalidade dos países da Europa.

Com efeito, nos países em que tais códigos ainda não existem - como por exemplo a França e a Espanha - somam-se equívocos institucionais e casos há de condenações pelo TEDH, que não reconhece os poderes processuais atribuídos a alguns desses MP, por eles não serem independentes do poder político.

Tal conflito entre os estatutos desses MP e os poderes que os códigos de processo lhes conferem, além de fazer perigar o sucesso de muitos processos a nível nacional, cria ainda compreensíveis dificuldades na colaboração judiciária internacional: esta só pode basear-se na confiança mútua entre entidades com perfil institucional idêntico.

Está pois de parabéns a MEDEL que viu agora transposto para um documento do Conselho da Europa um princípio que, incontestada pioneira, proclamou há, precisamente, 24 anos. 3. Neste momento, decorre em Portugal uma iniciativa do Ministério da Justiça (MJ) para a reforma do estatuto do MP, que, no nosso país, goza já, a nível constitucional, de independência externa.

A abertura do MJ para que, agora, se pudesse reforçar a autonomia interna dos magistrados do MP foi total; infelizmente, os parceiros institucionais que integram o grupo de trabalho responsável pelo relatório preliminar não conseguiram ter uma tão grande abertura de espírito e a coragem que a MEDEL teve naqueles já longínquos e gloriosos anos.

É um sinal dos tempos e do fechamento a que muitas estruturas institucionais e associativas das magistraturas se remeteram recentemente. E, no entanto, nunca como hoje, é tão necessário ter os olhos abertos para o futuro.

António Cluny | ionline | 20-01-2015

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