In Verbis


icon-doc
REVISTA DE 2014

Em maus lençóis

  • PDF

A justiça está deitada na cama que fez para si própria nas últimas décadas. O povo já não se contenta com o facto de o dono disto tudo ter sido detido e interrogado por um juiz. Pelo contrário, desconfia de tanto aparato e já nem pede justiça, exige vingança.

Todos perguntam onde estava este poder (juízes, procuradores, jornalistas, políticos...) quando ele era de facto dono disto tudo? Por certo se sabe muito mais hoje do que há apenas dois meses, mas não estranhem que o povo estranhe tanta vontade de fazer justiça depois de tanto silêncio e cumplicidade.

Para ficar bem na fotografia, a justiça está "obrigada" a dar ordem de prisão a este banqueiro e o povo, de seguida, pedir-lhe-á mais prisões, de mais banqueiros, de mais gente importante e poderosa. Pressionada, a nossa justiça deixará que a violação do segredo de justiça, essa arma poderosa para condenar pessoas na praça pública, volte a funcionar. E já começaram as fugas selectivas de informação, querendo provar a culpa do arguido mesmo que para isso quem investiga tenha de fazer figura de parvo.

O Expresso Diário contou-nos a história de umas caixas, com papéis para destruir, encontradas pela investigação no escritório improvisado de Ricardo Salgado, e dava nota do que essa mesma investigação terá feito perante tão grande descoberta. Passo a citar: "A PJ fotografou, foi-se embora e cinco dias depois [...] entrou no hotel com um mandado de busca." Se não fosse trágico, dava para rir. O Ministério Público acreditou que Salgado queria destruir provas e achou por bem dar-lhe cinco dias para pensar no assunto. Não lhes passou pela cabeça que é na produção de prova e na sua justa avaliação, de acordo com a lei, que se faz boa justiça. Por aqui se vê que, infelizmente, não há uma única razão para acreditar que a justiça vai mudar em Portugal.

Para avaliar o estado da justiça pouco importa que isto termine com uma condenação ou uma declaração de inocência do mediático arguido. A democracia assenta na separação de poderes mas a maior parte do tempo parece que a justiça é um Estado à parte, com as suas próprias regras, sem ter de dar cavaco a ninguém.

As instituições da justiça estão entre as mais desconsideradas pelos portugueses e vivem hoje, como viviam ontem, sob suspeita de tratar de modo diferente cidadãos que, à luz da lei, deveriam receber tratamento igual. Ainda não foi desta que provaram não temer os poderosos. Os titulares da justiça, a quem se exige maior responsabilidade, agem do mesmo modo que a generalidade dos cidadãos, com reverência face a quem tem poder e com desdém em relação a quem cai em desgraça. Para haver Justiça é preciso muito mais do que o circo que já começaram a montar.

Paulo Baldaia | Jornal de Notícias | 27-07-2014

Comentários (10)


Exibir/Esconder comentários
...
Para ficar bem na fotografia, a justiça está "obrigada" ...

Mas qual justiça: juízes, procuradores ou jornalistas?
DDT , 27 Julho 2014 - 18:00:46 hr.
...
A justiça é feita pelos politicos.
Os operadores judiciários Magistrados limitam-se a tapar os remendos deixados pela lei que mais não é do que uma manta de retalhos que não serve o interesse da justiça mas de quem legisla (que por sua vez, também, não sabe ou não quer governar).
Ai Ai , 27 Julho 2014 - 19:59:14 hr.
Baldaia! Baldaia!
És um ignorante! A falar do que não sabes. Se eu te perguntasse de chofre o que o que é a justiça só ouviria tretas balbuciadas e sem nexo. És mais um opinador a minar a autoridade a empurrar o povo par o desastre anunciado. E já és director!!!!!
Picaroto , 28 Julho 2014 - 08:33:40 hr.
De quem sois, senhor?
Pois a justiça terá lá os seus problemas... Mas não andou nestes últimos anos a "chafurdar" nos negócios de Salgado e do GES, como muitos dos políticos e comentadores que ora se apresentam como anjos clamando...
É a vida... E as suas coisas...
Hermano Mayor , 28 Julho 2014 - 09:05:37 hr.
...

Bom, perante um texto como este, ocorre-me espontaneamente dizer o seguinte:

Agora que aquela coisa começada por «m» foi espalhada durante anos, que agora começa a cheira mal e parece estar à vista de alguns, acham que a justiça a deve limpar em três dias, ainda que só sinta o cheiro e não saiba ainda exactamente onde ela está.

Vamos ver como se comportam os cidadãos que devem muitos favores aos autores da «m» e sabem de onde vem o cheiro da dita «m».
Vamos ver se colaboram com a justiça.

Durante anos os banqueiros fizeram o que quiseram sem ninguém os molestar, desde as entidades reguladoras, aos partidos políticos, jornalistas, etc.

A justiça está no fim da linha, só pode intervir quando cheira a «m», para atentar limpar alguma sujidade ou diluir o cheiro.

Quando é que esta gente verifica que o sistema da justiça, do ensino, da saúde, da administração pública, etc., assim como a dita «m» é o reflexo de um povo, em especial de todos aqueles que exercem alguma parcela do poder?
alberto ruço , 28 Julho 2014 - 11:01:00 hr.
...
Considerando o que me pagam depois dos cortes no vencimento, acham que eu vou me chatear e mover processos contra poderosos como banqueiros e políticos?!?!?

Contribuinte espoliado , 28 Julho 2014 - 11:43:55 hr.
...
Caro Contribuinte espoliado, não caia nessa armadilha e dê-lhes na cabeça sendo caso disso.
Ai Ai , 28 Julho 2014 - 15:32:50 hr.
Outra Via
Boa Tarde!


Vão desculpar-me mas não leio assim o artigo, antes vogo por outra via.
Será que Baldaia está a dizer para olharmos para a justiça, para que não olhem para a imprensa?
Infelizmente não existe jornalismo de investigação em Portugal, limitando-se esta a partir de processos já em curso, para, beneficiando de informações processuais que lhe caiem no colo, colher ali mais informação, sempre de fontes muito especiais, para apresentar trabalho. Veja-se o trabalho do Expresso, o mais próximo, mas ainda assim longínquo trabalho de investigação jornalista.
Olhando para o que hoje se sabe, que já vem de longe, a pergunta que Baldaia não faz, porque não quer e não pode é: onde estavam os jornalistas? Agora que o DDT já não pode e está quase no chão, enchem o peito e é um fartote de artigos, como se há muito soubessem do caso. E se sabiam, onde estavam os jornalistas? Terá sido o poder que os impediu de colocar cá fora a notícia? E se assim é, porque não clamam pela sempre presente "Liberdade de Imprensa", pela independência criativa do jornalista?
Baldaia faz lembrar Frei Tomás.
E a Justiça é que tem a culpa? Até poderá ter alguma culpa, mas não está só, e quem lê o artigo até julga que é ela a exclusiva culpada.
Respeitosamente
Orlando Teixeira , 28 Julho 2014 - 20:37:55 hr. | url
...
Brilhante Orlando Teixeira.
Ai Ai , 29 Julho 2014 - 12:16:34 hr.
...
A culpa não é da «justiça», a culpa é de haver juízes, procuradores e polícias que são tão arrogantes e «destemidos» contra os «pilhas galinhas» e contra os poderosos metem o rabinho entre as pernas e «borram-se» todos. O resto é conversa!
Amílcar Alhinho , 01 Agosto 2014 - 14:43:24 hr.

Escreva o seu comentário

reduzir | aumentar

busy

Últimos conteúdos

O Supremo Tribunal Administrativo fixou jurisprudência a rejeitar providências cautelares contra o novo mapa judiciário,...

O que é uma embaixada? Foi em torno da precisão deste conceito que se decidiu uma das batalhas judiciais em disputa entr...

Um erro das Finanças. Mais de três dezenas de pareceres, relatórios de quatro comissões. Mas só o parlamento açoriano fe...

O banco norte-americano vendeu mais de 4 milhões de ações do BES no passado dia 23 de julho, ou seja poucos dias antes d...

Últimos comentários

Opinião Artigos de Opinião Em maus lençóis

© InVerbis | Revista Digital | 2014.

Sítios do Portal Verbo Jurídico