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REVISTA DE 2014

Medidas para os juizes do TC - e para as eleições

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Bruno Faria Lopes - A reposição gradual dos salários na Administração Pública e o alívio significativo na sobretaxa das pensões (a CES) são, em primeiro lugar, uma tentativa de comprar a boa vontade do Tribunal Constitucional. Com os mercados de dívida em euforia total e a iminência de uma saída limpa já nos esquecemos de que há mais de 1,5 mil milhões de euros em medidas de austeridade sob apreço dos juízesconselheiros. Um chumbo poucos dias depois de anunciada uma "saída limpa" não seria a melhor forma de começar o mergulho sem rede cautelar (mas com almofada doméstica) nos mercados.

Ao sugerir que os salários serão repostos em cinco anos e que o fardo da CES será distribuído por mais alvos além dos pensionistas, o Governo espera convencer os juizes de que as medidas deste ano, mais gravosas do que as de 2013, são temporárias - e que, no caso da minoria de pensionistas com reformas médias/altas, o futuro trará um alívio co-financiado com mais fiscal sobre todos os portugueses, incluindo aqueles com rendimentos mais baixos. Este rumo revelador do receio que o Governo tem do Tribunal que começou por menosprezar no início da legislatura - e é um sinal da derrota esperada do Governo num conflito institucional que nunca teve hipótese de vencer.

Há, depois, uma segunda motivação: as eleições legislativas. As mensagens políticas dirigidas à função pública - "é preciso dar um alívio" - e a aparente desistência de tornar permanentes uma parte dos cortes salariais são um bom exemplo, tal como é o abandono da intenção de fazer a reforma estrutural das pensões, cujos contornos tanto brado deram há apenas algumas semanas. O aumento ridículo da TSU e da taxa máxima do IVA - numas contas de guardanapo ilustrativas de como são feitos estes documentos - não dará lugar a reforma alguma (sobretudo na Caixa Geral de Aposentações), pelo menos nesta legislatura.

É mais fácil carregar agora ligeiramente nos impostos - mesmo depois do "enorme aumento" de 2013 - para daqui a uns meses dar um cheirinho apaziguador no IRS. (A descida no IRS poderia ser maior se o Governo prometesse aquilo que anuncia: no Documento de Estratégia Orçamental não há vestígio de parte dos 1.200 milhões de euros de corte de despesa anunciados pela ministra das Finanças uma semana e meia antes. Dos 700 milhões poupados em "fusões, ganhos de eficiência" e por aí adiante só se vislumbra cerca de metade - e boa parte sob aquele conveniente rótulo de "outras rubricas", ou seja, "não fazemos ideia de como vamos cortar isto".) Não deixa de ser irónico que o Governo que anunciou ontem a "saída limpa" esteja a dar sinais tão evidentes de desistência e de erosão. Aliviar a austeridade não é um problema - afinal, andámos a criticar o aperto brutal dos últimos anos. O problema é percebermos as motivações do alívio. A "transformação estrutural" do país, prometida no início do mandato, não chegou a tempo de mudar a natureza da política.

Uma última nota: como a restrição externa não desaparecerá tão cedo, sobrará muito para fazer na próxima legislatura. António José Seguro, neste momento o melhor colocado para suceder a Passos Coelho, terá o prato cheio caso chegue a São Bento. Talvez fosse bom fazer menos promessas em público.

Bruno Faria Lopes | Diário Económico | 05-05-2014

Comentários (1)


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E nada espero do Tc. Em boa verdade, entre declarações várias de inconstitucionalidades, efeitos deferidos e mitigados da mesma, etc., a verdade é que os homens do aventual praticamente tudo permitiram ao Alibaba e aos seus 40 irmãos.
Sun Tzu , 07 Maio 2014 - 04:49:39 hr.

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