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REVISTA DE 2014

Há processos e processos

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Sousa Pinto - Começo por afirmar que, tal como a generalidade dos portugueses, considero inaceitável e injusto que certos processos-crime ou de contraordenações que envolvam pessoas ligadas a grandes grupos económicos terminem sem que haja uma decisão condenatória ou absolutória, esfumando-se a sua utilidade, simplesmente porque se esgotou o prazo conferido por lei para que tal decisão fosse proferida.

É inaceitável, mas é susceptível de ser explicado.

E a explicação passa pela circunstância do legislador tratar de igual forma – para efeitos de prazo de prescrição – as contraordenações independentemente da sua especial complexidade.

Explica-se ainda porque os advogados destes processos de contraordenação financeira são por norma profissionais com uma experiência tal que lhes confere a argúcia de explorar todas as brechas que existem na lei e que possibilitam favorecer os seus clientes (só assim se compreendendo que um recente processo muito falado tenha estado 5 anos e 5 meses no Banco de Portugal e 2 anos e 7 meses no tribunal).

Mesmo num Estado de Direito em que a igualdade de tratamento jurídico é um dos princípios basilares, nada obsta a que, perante realidades reconhecidamente distintas, se encontrem soluções, também elas diferentes.

Altere-se a lei, reconheça-se que tais crimes e contraordenações têm de ser tratados de forma própria, com outros meios e mecanismos de resposta adequados, tornando-a assim justa na sua aplicação e talvez deixe de pairar a ideia de que são sempre os mesmos quem escapa às malhas da Justiça.

Sousa Pinto (vice-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa) | Correio da Manhã | 22-03-2014

Comentários (6)


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Explique-se o que se passa.
Já é altura de os magistrados explicarem porque se arrastam alguns processos. Talvez, se o fizerem, se venha a concluir que isso acontece e continuará a acontecer enquanto o poder político queira. E tudo parece que este quer que assim continue.
O encurtamento dos prazos de inquérito, da instrução e do julgamento cria a percepção nos cidadãos que a falta de celeridade processual se deve a esses "preguiçosos" dos magistrados, enquanto os advogados se limitam, na defesa dos seus clientes (que é isto que são em muitos casos), a utilizar até à exaustão todos os instrumentos que a lei permite.
E aqui é que está a questão: a lei permite demasiado e o que permite não é a procura da Verdade.
O que a lei permite é a manipulação dos expedientes processuais.
Mas isso o legislador sabe bem de mais. E como este tem acento nos principais escritórios de advogados, que ganham muitos milhões não só dos seus clientes mas também de servicinhos que presta ao Estado, é mais fácil imputar a demora da justiça aos tribunais. Milhões aqueles que deveriam estar nos cofres do Estado, em muitos dos processos, e que assim entram é nos cofres daqueles escritórios.
Sim, porque estes fazem-se pagar de forma obscena e, assim como assim, parte dos milhões “perdoados” aos arguidos entram direitinho nos bolsos dos “nossos” desinteressados defensores.
Luis , 22 Março 2014 - 18:28:26 hr. | url
...
Para estes os prazos contam, para os restantes esfarrapam-se os tribunais em argumentos para não extinguirem os processos ou as instâncias.
O zé da espiga , 22 Março 2014 - 18:29:24 hr.
Os advogados têm as costas largas.
Só faltava mais esta. Então o processo esteve 5 anos e 5 meses junto da entidade administrativa competente e a culpa é dos advogados e das brechas legais?! Estonteante.
Repito o que disse num outro post: Mudem a lei: 200 anos para prescrever! Mas que se continue a ocultar a inércia das entidades administrativas que têm competência para instruir processos de contra ordenação e/ou aplicar coimas. O facto de algumas estarem a demorar UM ANO para agendar uma simples inquirição de testemunhas ou a reter impugnações judiciais há DOIS ANOS é irrelevante. Mas cai o carmo e a trindade se o arguido se lembrar de recorrer.
Cambada de ineptos!

Aiken
Aiken , 22 Março 2014 - 22:26:41 hr.
...
O que se passa Luís é que ninguém é responsabilizado na Administração Pública por os processos estarem na gaveta anos a fio. Logo, quando chegam a Tribunal pela via da impugnação, estão já a queimar o prazo de prescrição. É um regabofe!
.
Aiken , 22 Março 2014 - 22:46:57 hr.
...
Já sugeri que devia os prazos de prescrição de coimas, diminuir, e responsabilizar os autores pela inércia, suportando estes as contra ordenações que deixam prescrever, assim talvez trabalhassem e despachassem os processos em vez de os engonhar até à prescrição.
O zé da espiga , 23 Março 2014 - 11:19:39 hr.
...
Caríssimo Leitor Luis, o encurtamento dos prazos de inquérito que refere, são meramente ordenadores, difícilmente prescrevem, há sempre um argumento hábil.
armando , 24 Março 2014 - 09:42:58 hr.

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