Justiça. Metade dos 135 casos de negligência de magistrados dizem respeito a violação do dever de zelo nos prazos. No total, houve sete procuradores que foram suspensos
A "verificação de prescrição de processos penais" ou a "inobservância de prazos" levaram a que, entre 2011 e 2013, fossem instaurados quase 70 inquéritos a magistrados, segundo dados revelados ao DN pela Procuradoria-Geral da República. No total houve 135 inquéritos, dos quais resultou a suspensão de sete procuradores, determinada pelo Conselho Superior do Ministério Público. Houve dois que foram mesmo demitidos. Um dos casos mais graves foi o de uma procuradora de Santa Maria da Feira, que foi afastada de funções depois de ter deixado prescrever 19 processos que tinha a seu cargo.
Metade das queixas contra magistrados que chegam ao Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) são por "verificação de prescrição de processos penais" ou "inobservância de prazos". Concretizando: foram instaurados quase 70 inquéritos ou processos disciplinares - nos anos de 2011, 2012 e 2013 - com base na violação do dever de zelo (que engloba os casos de atrasos de magistrados que resultam em prescrições dos próprios processos).
No total, foram instaurados 135 processos disciplinares a procuradores do Ministério Público (MP). Desses, em apenas sete casos foi aplicada a pena de suspensão do exercício de funções, a quarta mais grave prevista no Estatuto do MP.
Um desses casos é o de uma procuradora adjunta do Tribunal de Santa Maria da Feira, que arrisca agora ser afastada da função por deixar prescrever 19 processos que tinha à sua responsabilidade. O serviço prestado pela magistrada "foi objeto de uma inspeção extraordinária", conforme confirmou fonte da Procuradoria-Geral da República (PGR) ao DN. Concluída esta inspeção, "o inspetor considerou que o trabalho desenvolvido pela magistrada foi insatisfatório, tendo verificado uma incapacidade para decidir os processos que lhe estavam atribuídos nos prazos e com a qualidade necessária", explica a mesma fonte. A classificação obtida acabou por ser um 'medíocre' e foi-lhe aberto um processo disciplinar por "inaptidão", ficando suspensa de funções desde novembro.
Segundo a mesma fonte avançou ao DN, estes processos disciplinares com base em prescrições acabaram nas penas de advertência, multa e suspensão de funções por 120 dias e 150 dias. No total dos inquéritos instaurados foram aplicadas, na sua maioria, penas de multa e advertência (sanções menos graves) e apenas dez penas mais graves (suspensão de funções, aposentação compulsiva ou demissão). Apenas dois procuradores foram demitidos, ambos em 2012.
A maioria das penas aplicadas no ano passado a procuradores foram de multa. Foi também registado apenas um caso de aposentação compulsiva, no ano passado. Fonte da PGR admite que "não há caracterização estatística detalhada por objeto material".
No caso concreto desta procuradora, avançado ontem pelo Correio da Manhã, o CSMP considerou que esta protagonizou "um comportamento negligente, que denegriu a imagem da Justiça e que o afastamento definitivo pode ser a solução". Uma avaliação que resulta dos três anos de trabalho da magistrada (setembro de 2008 até novembro de 2011).
Entre os processos que tinha a seu cargo encontravam-se casos de violência doméstica e inquéritos tutelares educativos (relativos a menores acusados de crimes) que entretanto se tornaram maiores de idade, no decorrer do processo. A magistrada instaurou uma providência cautelar com vista a suspender a eficácia da deliberação do CSMP, tendo o Supremo Tribunal Administrativo indeferido esse pedido. Numa avaliação anterior, a mesma magistrada já tenho sido alvo de uma classificação de "suficiente".
Já no caso da magistratura judicial, os dados relativos ao ano passado ainda não são conhecidos mas segundo fonte do Conselho Superior da Magistratura (CSM) explicou ao DN, "estas situações de aplicação de penas disciplinares por prescrição de processos judiciais não são muito suscitadas porque na maioria dos casos a demora não é por inatividade do juiz".
Afastamento polémico
Na passada semana, o DN noticiou que a procuradora Cândida Vilar, diretora da Unidade de Combate ao Crime Violento, integrada no DIAP de Lisboa, foi demitida do cargo, na sequência de uma queixa feita pela Polícia Judiciária (PJ), segundo o que a própria explicou ao DN.
Porém, o gabinete de Joana Marques Vidal não confirmou que o afastamento, decidido por Maria José Morgado, esteja relacionado com qualquer tipo de queixa disciplinar levada ao Conselho Superior. Bem como a Polícia Judiciária, que não quis comentar a acusação da procuradora a cargo de processos mediáticos como Máfia Brasileira, Máfia da Noite, Mário Machado, Gangue do Multibanco, ou ainda o das alegadas agressões por alguns elementos da claque dos "No Name Boys".
DADOS
Relatório europeu fala em 52 punições
Vinte e seis juízes e igual número de procuradores do Ministério Público (MP) foram alvo de sanções disciplinares em Portugal no ano de 2011, revelou o último relatório do Conselho da Europa para a Eficácia da Justiça (CEPEJ), divulgado há dois meses. O documento de um organismo do Conselho da Europa, adianta que, em 2011, foram aplicadas - pelos conselhos superiores da magistratura e pelos tribunais administrativos - um total de 26 sanções disciplinares a juizes em Portugal, tendo duas resultado em suspensão de funções, nove em repreensão e 15 em multa.
No caso do MP, três resultaram em suspensão, três em repreensão, 17 na aplicação de multas. As restantes não foram discriminadas.
CASOS
Processo para Pinto Monteiro
Pinto Monteiro, enquanto PGR, foi alvo de uma queixa em 2011. Na origem desta, a nomeação do então vice-PGR, Mário Gomes Dias, em 2007, e a a sua permanência no cargo, em 2010, já depois de atingido o limite dos 70 anos. A situação levou o procurador Carlos Monteiro a fazer uma denúncia ao Supremo Tribunal de Justiça. Nesta, o magistrado alegava que a conduta do PGR e do seu vice configurava "indícios de abuso de poder".
Investigação a procurador
O Conselho Superior do Ministério Público investigou, este ano, o procurador de Braga, José Lemos, suspeito de deixar prescrever dezenas de processos. Dos vários casos o arquivamento de um processo que visava o antigo presidente da Câmara de Braga, Mesquita Machado, outro (um caso de burla e falsificação) que lesou o Estado em quase um milhão de euros e ainda um de violação e violência doméstica sem investigação durante três anos.
Magistrados do DCIAP
Em dezembro de 2010, Pinto Monteiro abriu um processo disciplinar a magistrados do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) - liderado por Cândida Almeida. Em causa "o esclarecimento de todas as questões de índole processual ou deontológica que o processo Freeport pudesse suscitar", que resultou em processos disciplinares aos procuradores Paes de Faria e Vítor Magalhães. Processo foi arquivado em 2011.
O caso de Cândida Almeida
A procuradora-geral Joana Marques Vidal mandou instaurar processos disciplinares em finais de 2012 (entretanto arquivados em junho do ano seguinte) à ex-diretora do DCIAP, Cândida Almeida, e aos procuradores Rosário Teixeira e Paulo Gonçalves para averiguar alegadas fugas de informação a um semanário sobre um encontro mantido com a PGR. Cândida Almeida e os dois procuradores tinham entre mãos alguns dos principais processos económicos.
Filipa Ambrósio de Sousa | Diário de Notícias | 10-04-2014
COMUNICADO DO SMMP
Prescrição de processos
A afirmação do Diário de Notícias de que, entre 2011 e 2013, houve "70 magistrados do Ministério Público alvo de processos disciplinares por deixarem prescrever processos" é incorrecta e não contém a informação efectivamente relevante.
Nesse período, apenas 8 magistrados do Ministério Público foram condenados pelo CSMP com motivo na "prescrição de processos" (1 em 211, 6 em 2012 e 1 em 2013), sendo as penas 6 de advertência, 1 de multa e 1 de suspensão do exercício de funções. Muito longe, pois, daquilo que o Diário de Notícias quer fazer crer.
Entre 2011 e 2013, o Ministério Público tramitou perto de dois milhões de inquéritos. Não é conhecido o número exacto de prescrições do procedimento criminal em fase de inquérito, mas é certo que não ultrapassa a centena anual. A maior parte dessas prescrições não foram da responsabilidade dos magistrados do Ministério Público, tendo antes causa na participação muito tardia dos factos (muitas vezes já após a prescrição), motivo porque o número de condenações é tão reduzido. A percentagem de prescrições é por isso ínfima.
Qualquer prescrição deve ser evitada. Sendo da responsabilidade dos magistrados do Ministério Público, constitui infracção disciplinar e deve merecer a legal sanção.
Comentários (8)
Exibir/Esconder comentários
disparidade de critérios
E viva a cunha...
Nos juízes idem aspas aspas...há quem tenha sido transferido das ilhas para Lisboa, mas outros que não são operários nem usam avental são ostracizados e despachados sem motivo...
csm no seu melhor...
Por causa de uns...são os outros Fp a ficarem sem subsídios, redução de vencimentos, etc.
É que há juízes que nem sequer sabem do curto prazo de prescrições das contraordenações e não marcam logo os julgamentos ou fazem logo as decisões, confundindo o prazo criminal de prescrição com o contraordenacional.
No entanto depois de deixarem prescrever vários processos ainda levam com a classificação de Bom ou Bom com distinção como acontece por esse país fora.
É caso para dizer a ignorância compensa.
...
Presidentes dos Tribunais
Será que tal não oferece relevância para o funcionamento dos tribunais e que não mereça atenção deste Forum?
Não será tal matéria relevante para um debate alargado?
...
Isto é de quem parece não não conhecer os TAF´s e portanto a opinião, no meu entender não tem o valor que poderia ter ( se fosse fundamentada, por exemplo)..
Não há nenhum processo atrasado nos TAF´s que sejam da responsabilidade do MºPº.
Por uma razão simples: têm quinze dias para "dar" o parecer e que seja do meu conhecimento não têm as prateleiras com centenas e centenas de processos, como os juízes têm.
Também não será da responsabilidade dos juízes tal situação, mas da organização dos TAF´s e dos funcionários adstritos.
...
-quantas acções é que cada agente do m.p. junto de cada taf e de cada tca interpôs em média por ano?
a resposta é assustadora e humilhante, só q quase ninguém sabe.
quanto a pareceres..., pareceres há muitos. e poucos são originais ou lidos.
ai, povo enganado... ai, orçamento do estado enganado...
Escreva o seu comentário
< Anterior | Seguinte > |
---|