Os juizes consideram que os futuros cortes salariais para a Função Pública correm o risco de serem inconstitucionais. Num parecer enviado para o Parlamento, a Associação Sindical dos Juizes Portugueses (ASJP), que representa 90% do total de juizes, lembra que as reduções salariais impostas desde 2011 foram aceites por serem enquadradas pelo programa de ajustamento.
"A drástica redução dos rendimentos de todos os cidadãos - por via do aumento da carga fiscal - é agravada, no caso dos servidores públicos, incluindo os juizes, pela manutenção das reduções remuneratórias agora pretendidas e também pelo aumento das taxas referentes aos descontos para a ADSE (neste momento, 3,5%)", dizem os juizes no parecer.
Segundo cálculos dos juizes, a capacidade contributiva envolve uma dimensão "que nalguns casos comporta mais de 50% do rendimento auferido". É esta a razão que leva os juizes a pôr em causa o respeito pelas normas constitucionais na proposta do Executivo. "Não pode, por isso, deixar de se duvidar que as medidas agora propostas cumpram os princípios constitucionais da igualdade e, sobretudo, da proporcionalidade na repartição de sacrifícios que uma situação financeira grave impõe que sejam disseminados por todos os cidadãos", lê-se no parecer. Este aspecto deverá ser analisado pelo Tribunal Constitucional (TC) já que o Governo pediu ao Presidente da República que envie a legislação para fiscalização preventiva.
A ASJP, presidida por José Mouraz Lopes, estima que a capacidade contributiva envolve uma dimensão que pode ultrapassar 50% do rendimento auferido.
A proposta do Governo, que está em discussão na Assembleia da República, prevê a reposição dos cortes salariais implementados pela primeira vez em 2011 quando José Sócrates liderava o Executivo.
Quando a lei entrar em vigor, os trabalhadores da Função Pública com salários acima de 1.500 euros sofrem um corte na remuneração que varia entre 3,5% e 10%. A opção do Executivo pela reposição deste corte surge depois do chumbo do TC às reduções salariais agravadas (para salários acima de 675 euros e a variar entre 2,5% e 12%) previstas no Orçamento do Estado para 2014.
Perante este obstáculo, o Governo decidiu recuperar os cortes antigos, que o próprio Constitucional foi viabilizando ao longo dos anos. No entanto, os juizes consideram que a situação agora é diferente. A associação presidida por José Mouraz Lopes argumenta que o programa de ajustamento "já terminou" e que as anteriores reduções salariais "só foram admitidas e consideradas excepcionalmente justificadas tendo em conta a crise financeira em que o país vivia e que levou à situação de "protectorado" na expressão do próprio Governo".
Além disso, os juizes consideram que as razões e a "política financeira conjunturais que levaram à admissibilidade constitucional" das reduções salariais impostas em 2011 "não justificam" face às metas para o défice em 2014 e 2015 (de 4% e 2,5%, respectivamente) o novo corte remuneratório, "aplicado apenas a uma parte da população".
A associação de Mouraz Lopes defende ainda que, ao contrário do que defende o Executivo na exposição de motivos da sua proposta de lei, a reversão "não abrange os rendimentos que foram retirados por via dos cortes salariais estabelecidos nas leis dos Orçamentos de 2011, 2012 e 2013". Os juizes querem a "reversão total" dos cortes, o que implica devolver os montantes retirados desde 2011.
Marta Moitinho Oliveira | Diário de Notícias | 15-07-2014
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