Após a polémica declaração de voto do vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura (CSM), que lançou suspeitas sobre o trabalho da comissão interna que seleccionou os juízes presidentes das novas comarcas, deram entrada no Supremo Tribunal de Justiça (STJ) duas acções a impugnar as nomeações feitas por aquele órgão.
Trata-se de dois procedimentos cautelares que pedem a suspensão da eficácia da decisão do CSM, tomada na sessão de 9 de Abril. "Ambos os procedimentos foram distribuídos no STJ, no dia 21 de Abril", informou supremo, num email enviado ao PÚBLICO. Se o STJ decidir suspender a decisão do CSM, os juízes presidentes nomeados (a lista foi publicada esta quarta-feira no Diário da República) não deverão tomar posse, o que poderá comprometer o arranque do novo mapa judiciário, marcado para 1 de Setembro.
Os presidentes das novas 23 comarcas (que irão substituir as 231 existentes, que serão extintas) são uma figura criada no âmbito da reorganização do funcionamento dos tribunais e constituem um lugar de enorme relevância já que lideram os órgãos de gestão destas unidades, em parceria com o procurador coordenador e o administrador judiciário.
Estes conselhos de gestão das comarcas é que deverão preparar a transição do antigo para o novo modelo, estando previsto na lei que entrariam em funções seis meses antes do arranque da reforma. Tal, contudo, já não poderá ocorrer já que faltam pouco mais de quatro meses para a entrada em vigor do novo mapa judiciário e só ontem foram empossados os primeiros elementos deste conselhos, os procuradores coordenadores. Faltam agora tomar posse os juízes presidentes que, por sua vez, terão de nomear os administradores judiciários e só aí os órgãos de gestão das comarcas estarão completos.
O STJ precisa que uma das acções foi intentada pelo juiz Jorge Loureiro, que exerce funções na Relação de Coimbra e era candidato à presidência da comarca conimbricense, tendo sido preterido pela colega Isabel Namora. Na segunda acção são requerentes outros três magistrados judiciais, Edgar Valentes, desembargador na Relação de Guimarães, Maria Beatriz Borges, juiz presidente do Tribunal de Família e Menores de Faro e Belmira Felgueiras, juíza no Tribunal de Família e Menores de Setúbal,candidatos a diferentes comarcas.
Segundo o PÚBLICO apurou, esta última juíza concorreu numa primeira fase a três lugares, juiz presidente da comarca de Setúbal, da de Lisboa e da de Beja. Os dois primeiros candidataram-se, respectivamente, a Évora e a Faro. Para já não é claro se estes juízes pretendem impugnar apenas as nomeações relativas aos lugares a que se candidataram ou se querem anular todo o processo de selecção.
O supremo adianta que este tipo de procedimentos são urgentes e, por isso, "a decisão deve ser proferida no mais curto espaço de tempo, logo que obtidos pelo STJ todos os elementos necessários à respectiva elaboração".
Para ter efeito prático a decisão deve ser tomada antes da tomada de posse dos juízes escolhidos prevista para a próxima quarta-feira, dia 30 de Abril, em Lisboa. Antes disso, contudo, o plenário do CSM volta a reunir, podendo tomar alguma posição sobre esta polémica.
Funções indefinidas
Entretanto, tomaram ontem posse os magistrados do Ministério Público que vão coordenar as futuras 23 comarcas do país. A indefinição de algumas das funções que terão de assumir não passou despercebida nos discursos oficiais. "É necessária uma adaptação dos estatutos do Ministério Público e dos restantes órgãos do poder judicial que permita definir com mais clareza os contornos do desempenho das novas funções", observou a Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal.
Falando em nome dos restantes 22 colegas, também o procurador que vai coordenar a comarca do Porto, Eduardo Loureiro, se queixou de que o novo modelo de organização dos tribunais sofre, ainda, de algumas indefinições. "Há alguma sobreposição de funções entre os novos coordenadores e os procuradores-gerais distritais. Urge definir esta questão, para evitar bloqueios e dificuldades", avisou, apelando à ministra no sentido de serem ultrapassados os obstáculos burocráticos existentes e disponibilizados os meios humanos e materiais, incluindo os meios financeiros, que permitam levar a missão dos magistrados a bom termo. "Há uma incompatibilidade entre o actual estatuto do Ministério Público e a nova lei" do mapa judiciário, resume o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Rui Cardoso, segundo o qual será impossível que a adaptação estatutária, que está em curso, fique pronta a 1 de Setembro.
Mariana Oliveira e Ana Henriques | Público | 24-04-2014
Comentários (19)
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25 de Abril SEMPRE
A questão é que não têm nem nunca tiveram vergonha....
Temos direito a saber quais os critérios que foram utilizados para as escolhas dos colegas. Por que não são divulgados? O que justifica tal atitude? O que receiam? Que contactos telefónicos existiram?
Foi ou não considerado o facto de os cônjuges ou companheiros dos novos Juízes(as) presidentes exercerem funções nas comarcas que irão ser presididas por aqueles(as)?
O que se verifica - desde sempre, aliás - é um profundo atavismo metodológico no C.S.M. - resquício de tempos idos - que urge combater, onde o mérito profissional é secundário e as amizades, os grupos e as "tendências" se impõem ferozmente.
Por isso, neste dia tão especial, deixo aqui o meu apelo. Façamos o 25 de Abril na magistratura judicial.
A justiça e os cidadãos só teriam a ganhar.
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É a outra "troika", a de sempre - CSM, STJ, ASJP (e outras "sensibilidades" e "mãos fraternas").
É toda uma agência de empregos, um dispositivo de poder e um "modo funcionário" de viver na judicatura.
Já era tempo de o Direito ser mais do que uma camada da atmosfera que nunca chega ao 6.º andar da Rua Mouzinho da Silveira nem penetra na secção de contencioso do STJ.
A propósito, depois de ler a edição de hoje do Expresso, só me resta dar os parabéns ao "tal núcleo" que, de facto, "trabalha" muito bem! Quem é que aparece, só por acaso, na coluna "sobe e desce" a propósito das prescrições? É o Presidente do CSM? Claro que não! Tinha que ser o vice-presidente. Quem se mete com o "núcleo" leva...
o c.p.a. e os concursos limpinhos é só para o povo...
é tudo igual.
critérios pré-fixados e clarinhos... nunca. o c.p.a. e os concursos limpinhos é só para o povo...
como podem depois desejar que as pessoas respeitem os tribunais???
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Esta situação relativamente à escolha dos juízes presidentes das comarcas não é seguramente positiva.
Mas nada existe que seja apenas negativo ou apenas positivo.
O negativo contém sempre em si algo de positivo, basta procurá-lo.
2.
No caso concreto, ainda bem que a questão da aparente falta de regras preestabelecidas foi levantada.
O positivo disto reside no seguinte: que nunca mais este tipo de situações volte a acontecer.
3.
Quer-me parecer que as regras acerca da tomada de decisões sobre matérias que têm a ver com a coisa pública só podem ser (pelo menos) estas:
Em 1.º lugar, deve ser a lei a definir os critérios que irão ditar a decisão da entidade decisora.
Neste caso, andou mal a lei, pois nada disse.
Em 2.º lugar, esses critérios devem ser os apropriados ao caso e devem deixar a menor margem de manobra possível a quem vai decidir.
Em 3.º lugar, os conceitos utilizados na definição desses critérios devem ser preenchidos na decisão dos casos concreto com factos (e factos são acontecimentos situados no espaço e no tempo históricos).
Em 4.º lugar, se a lei nada diz, torna-se imperativo, face à omissão legal, que quem decide estabeleça previamente, justificando, os critérios adequado à decisão (pessoalmente não consigo ver-me a decidir algo sem proceder assim).
4.
Fundamentar-se algo dizendo apenas, por exemplo, que A ou B é pessoa «prestigiada», que tem grande «capacidade de liderança» ou «dinamismo», é nada dizer.
As decisões fundamentam-se a partir de factos.
Tudo o que sair disto não tem valor ou então o valor é negativo.
Se se diz que alguém é «dinâmico» isso tem de resultar dos factos.
Por exemplo, quantos julgamentos e sentenças fez A nos últimos anos?
Como se saiu A num julgamento altamente complexo (se porventura alguma vez presidiu a algum), etc.?
5.
Como disse, ainda bem que a questão foi levantada: negativo teria sido o silêncio.
alberto ruço
está a ser ingénuo. isto vai voltar a acontecer. até porque o stj não vai anular nada.
o mesmo parece que vem acontecendo no sta e no cstaf.
é que o art. 266 e o art 268 da crp, bem como os arts. 3 ss, 24 ss e 124 ss do cpa só valem para o povo, não nos conselhos superiores..., que dominam os tribunais para onde se pode recorrer...
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O STJ, para não variar, não vai anular nada.
E vai-se refugiar nas aldrabices do costume.
"Aldrabices" no preciso sentido que o Prof. Orlando de Carvalho usava quando, em desabafo, dizia que "o Direito é, em grande medida, uma aldrabice".
A jurisprudência da secção de contencioso do STJ é, de facto, uma aldrabice penosa de ler.
De há meia dúzia de anos para cá dedica-se a copiar as alegações e a decisão sindicanda e a remeter para os argumentos desta, sem um mínimo juízo crítico. E a citar - mal, ainda por cima - alguma doutrina, na maioria desactualizada ou descontextualizada sobre a "discricionariedade" administrativa. Para, além, claro está, de citar as suas próprias decisões, em completa circularidade argumentativa.
É assim que se podem ler pérolas como: "não existem critérios objectivos que permitam distinguir a produtividade de dois juízes do mesmo tribunal" ou "a sindicância das decisões do Órgão faz-se, em última análise, pela via eleitoral", que "o CSM é o órgão superior de gestão processual" ou que "a última palavra caberá sempre ao CSM".
É preciso ler para acreditar, mas é mesmo assim - basta consultar a jurisprudência publicada. A Constituição foi revogada e, pelos vistos, só quem ainda recorre é que não se apercebeu!
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Ainda bem que vivo em democracia.
Viva o 25 de Abril.
utente
tem razão... infelizmente.
mas cada povo tem os juízes e o m.p. que merece.
e repito - os importantíssimos c.p.a. e art. 266 da c.r.p. não se aplicam nos nossos conselhos superiores de juízes e do m.p.
e quem refila, leva...
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O método é velho mas podemos dar-lhe um nome recente: "Mobbing".
Trata-se de atazanar o(a) desgraçado(a) com uma pleiade de processos disciplinares com base em "rumores" e "mexericos". Vale tudo, desde invadir o gabinete na ausência do visado até recorrer a "bufos" - prontamente promovidos a comissões de serviço - e vasculhar-lhe o telefone.
Não importa que os ditos processos tenham ou não fundamento - o que, de resto, nem é obstáculo para a condenação.
Basta cansar o visado até que, assoberbado de trabalho e torturado pelos constantes assédios disciplinares, este perca a calma e cometa um erro - leia-se, dê um qualquer pretexto, ainda que ridículo, para que o "Órgão" o puna com maior aparência de razão: basta reclamar em termos que o Órgão considere inadequados; há muita jurisprudência publicada, não estou a falar de cor.
Quanto à suposta carreira do(a) visado(a), é melhor esquecer... porque o Órgão não esquece aqueles que não lhe votam lealdade canina.
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ulisses veja
Há funcionários e magistrados predispostos a tudo para esmagarem os outros.
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Acredite que jamais foi minha intenção ofender os juízes.
De resto, devo deixar bem claro que a esmagadora maioria são um exemplo de dedicação, esforço e rectidão, em circunstâncias por vezes bem adversas.
Que trabalham muito - demais - e tentam sempre dar o seu melhor.
Para esses muitos e anónimos vai toda a minha admiração e votos de coragem para enfrentar um dia-a-dia cada vez mais penoso.
Estou a pensar em tantos que conheço, que todos os dias fazem um esforço hercúleo apenas por amor à função que, deveras, sinto muito se, com as minhas palavras, os ofendi.
Não me pareceu que criticar aquilo que eu considero estar mal - e a minha crítica não se dirigia aos juízes, se a ler com atenção - fosse equivalente a ofender.
Mas, se calhar, excedi-me na forma e, por isso, mais uma vez, peço que me desculpe.
Gosto demasiado da "independência felina"!
E também da indignação.
Não gosto de a ver tantas vezes castigada ou confundida com "dissidência", como efectivamente é.
Aceite um abraço (ainda que virtual).
Post Scriptum:
Nunca vi cameras, microfones ou luzes vermelhas e sou como S. Tomé: ver para crer.
O que já fui vendo é suficiente para me preocupar - não comigo, mas com "o estado a que isto chegou".
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As surpresas vão ser grandes.
Por estas regras do CSM vão ser movimentados juizes efectivos, mesmo que não queiram (lá vai a inamovibilidade ...)
Ulisses, quando
...
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Se alguém fizer o frete de reproduzir as tais "palavras fora do contexto" e o quiserem mesmo prejudicar, é quanto basta.
E nem é preciso que tenha dito quaisquer "palavras" - nunca vai conseguir provar que não as disse, é quanto basta.
Como calculo que já saiba, não temos um único grau de jurisdição em matéria de facto - só vale aquilo que o instrutor escreve nos autos, sem direito a audiência pública e contraditória.
O CSM decide sem contacto imediato com a prova, que não é gravada - limita-se a ler as súmulas que o instrutor escreveu.
E o STJ entende que não lhe cabe sindicar a decisão da matéria de facto.
Isto já para não não falar que se arranjam as mais mirabolantes desculpas para não aplicar as regras sobre obtenção - e proibição de valoração - da prova.
Perante esta total ausência de garantias processuais, nem é preciso contratar o tal homenzinho do escadote....
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