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REVISTA DE 2014

Todos os testes de álcool têm margem de erro

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Os tribunais da Relação de Évora e de Lisboa - em duas decisões deste ano, com intervalo de um mês decidiramque a margem de erro dos alcoolímetros que deve ser tida em conta pelas autoridade quando fazem os testes aos condutores é para aplicar também a factos anteriores a janeiro de 2014.

Desde essa data que o novo Código da Estrada passou a determinar que, após a realização de testes de alcoolemia aos condutores, no auto de notícia seja mencionado o valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível (8%). O que na prática significa que este conceito passou a ser relevante para decidir a culpabilidade e a pena do arguido. Agora, os magistrados vêm dizer que esta lei é apara aplicar também a situações anteriores à sua entrada em vigor.

No caso de Évora, os factos remontam a maio de 2013, em que um condutor de um veículo ligeiro de mercadorias foi mandado parar pela GNR. Feito o teste, foi detetada uma taxa de álcool no sangue de 1,84 g/1, superior à permitida por lei, (l,2g/l). Meses depois, foi condenado em primeira instância a pagar uma multa de 400 euros, pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, e ficou proibido de conduzir veículos motorizados por um período de cinco meses.

Inconformado com a sua condenação, o condutor recorreu para o Tribunal da Relação de Évora defendendo que a sentença não tinha tido em consideração o facto de ele tomar uma medicamento para asma que certamente teria tido influência no resultado do teste. Não aceitando este argumento, a Relação, porém, acabou por considerar que o novo regime da margem de erro deveria ser aplicável nesta situação, apesar de à data dos factos ainda não estar em vigor.

"Por ser o regime mais favorável ao arguido, esta reduziu a taxa de alcoolemia para 1,69 g/l aplicando os 8% de desconto previstos como erro máximo admissível para os alcoolímetros", explicou o juiz-desembargador no acórdão datado de fevereiro de 2014, a que o DN teve acesso. Como consequência, o condutor viu a sua pena reduzida para uma multa de 150 euros e apenas quatro meses de inibição de conduzir.

"Aqui a questão é que a jurisprudência já considerava admissível esta margem de erro porque veio a perceber-se que muitos dos resultados eram enganosos", explica o advogado Pragal Colaço, em declarações ao DN. "E agora tem uma lei para se fundamentar, apesar de serem factos anteriores a essa lei."

O advogado acusa as autoridades policiais de pouco rigor na definição da taxa de alcoolemia. "E essas autoridades é que deveriam logo a priori admitir essa margem de erro porque escusava de se gastar tempo e meios da justiça com tantos recursos como estes", sublinha, acusando ainda o poder político de não dar formação aos polícias e equipamentos com qualidade para que "se evitem estes erros".

No caso da Relação de Lisboa, de 21 de janeiro, o resultado foi ainda mais significativo: o arguido, depois de admitida a margem de erro no teste, acabou por ser absolvido por se concluir que a taxa de alcoolemia era de menos de l,2g/l. "Assim, sempre que sejam utilizados aparelhos devidamente aprovados, à taxa inicialmente indicada no alcoolímetro terá obrigatoriamente que ser reduzida a margem de erro máximo admissível do mesmo", explica o acórdão.

4 PERGUNTAS A...CARLOS BARBOSA, Presidente do ACP
"A punição em Portugal é demasiado leve"

- Os testes de alcoolemia são feitos com o rigor técnico necessário?
- Acho estranho que em todas as operações stop que se façam e em todas as fiscalizações operadas pelas autoridades policiais existam efetivas margens de erro como estes casos denunciados pelas decisões dos tribunais da Relação de Évora e de Lisboa. Mas claro que, se houver essa margem de erro, tem de ser corrigida.

- A punição que é feita pelos tribunais aos condutores sob o efeito do álcool em Portugal é suficiente?
- Não. É insuficiente. Devia haver a punição máxima. Sou cada vez mais defensor de penas mais graves e acho que os nossos tribunais são muito brandos. Se há uma primeira condenação, fica-se sem carta durante um ano. Se há uma segunda, durante dez anos. Mas à terceira o condutor deveria ficar sem a carta de condução.

- Os números revelam que há cada vez mais casos de participações às autoridades destas situações. Há mais atuação da polícia?
- Sem dúvida que há. E, como é suposto que aconteça num país civilizado, faz-se uma fiscalização e é feito um aviso que vai acontecer e onde.

- Os portugueses são inconscientes a conduzir?
- Temos de fazer ver aos condutores que não podem conduzir sob o efeito do álcool. A verdade é que esta não é uma distração, não é um erro igual ao excesso de velocidade.

CASO: Tribunal admite álcool no trabalho
O Tribunal da Relação do Porto obrigou, em agosto do ano passado, a empresa Greendays a readmitir um trabalhador que recolhia lixo com uma taxa de alcoolemia de 2,3 gramas por litro. No acórdão, os juízes consideraram que "com o álcool, o trabalhador pode esquecer as agruras da vida e empenhar-se muito mais".

Mais 4 mil condutores a conduzir embriagados
Balanço Relatórios de Segurança Interna revelam que, de 2009 a 2013, o número de participações destes crimes tem aumentado
O número de participações registadas pelas autoridades policiais pelo crime de condução sob o efeito do álcool tem vindo a aumentar em Portugal. Os dados - constantes dos vários Relatórios de Segurança Interna desde 2009 até ao ano passado - revelam que são mais quatro mil casos de condutores fiscalizados e acusados pelo Ministério Público (MP) por este fenómeno criminal (ver quadro ao lado). Aliás, o único ano em que houve uma descida destes casos, nos últimos oito anos, foi de 2008 para 2009 (21359 para 20 389 inquéritos).
"Estes dados revelam um aumento da fiscalização mas também dos condutores que acabam por beber álcool antes de se porem ao volante e isso tem de ser punido", explica Carlos Barbosa, presidente do Automóvel Club de Portugal (ACP), em declarações ao DN (ver entrevista em cima). "Porque esse ato é mais consciente do que uma distração como o excesso de velocidade ou falar ao telemóvel", conclui.
Segundo dados da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (PGDL), relativos ao ano passado, no total foram 203 348 os crimes investigados, menos 18 528 do que no ano anterior (uma redução de 8,9%). Na lista de crimes elencada por Francisca van Dunem, líder da PGDL, apenas os casos de violência nas escolas e de infrações rodoviárias (condução sem carta ou sob efeito de álcool) aumentaram no ano passado em relação a 2012. Ainda no distrito judicial de Lisboa (que perfaz quase 50% do território judicial) , dos 1374 crimes julgados de forma sumária, a larga maioria (quase 80%) são de casos relativos a condução sob efeito do álcool ou sem carta de condução

Filipa Ambrósio de Sousa | Diário de Notícias | 11-04-2014

Comentários (3)


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EMA do Alcool
O 170º do CE diz que se aplica os Erros máximos admissíveis, "caso exista". Não existe nada para o agente fiscalizador aplicar após o resultado quantitativo. A Tabela de erros que está a ser aplicada na fiscalização,(e mal) diz respeito à verificação do aparelho e é para uso exclusivo do IPQ ( ou seja o IPQ tem de efectuar a verificação do aparelho com o mesmo já a dar o desconto, por isso é que o aparelho vai ao IPQ todos os anos para se certificar estes resultados). O Art 170ª do CE com a nova redacção que lhe foi dada não tem qualquer norma inovatória como certos acórdãos dizem. A Aprovação do aparelho é que determina como o mesmo tem de ser utilizado por isso é que existe a aprovação do aparelho. Exemplo, no Radar sempre se aplicou os EMA`S, não por causa do Artº 170 (este não tinha a actual redacção) mas porque o aparelho foi aprovado nesse sentido... Por isso é que o artigo diz que se aplica os EMA's "caso exista". Ou seja, remete directamente para a aprovação dos aparelhos (aquando da aprovação este é que determina se existe margem de erro ou não). O que se esta a fazer é que o resultado já tem o EMA deduzido como indica a portaria e por um incorrecto entendimento o agente fiscalizador aplica novamente o EMA. Questionado o IPQ, o mesmo já disse por várias vezes que efectua a verificação com base nas margens de erro estabelecidas na portaria. Os Juízes num acórdão muito recente de Lisboa justificaram o duplo desconto, EMA, por terem dúvidas, mesmo depois de o IPQ dizer que tem em atenção aos EMAS e o aparelho dá valores correctos.
Rocas , 12 Abril 2014 - 11:42:49 hr.
...
O problema Rocas é que o legislador lançou a confusão e agora só o próprio é que pode desfazê-la (caso queira) esclarecendo.
Mas como não vai esclarecer vai vingar o pensamento, assente na nova versão da lei, de que tem que se fazer o desconto.
Também concordo consigo (a consideração do erro já está contido na leitura final) mas não vou lutar contra moinhos de vento, por isso faço o desconto e tchau baby auf wiedersehen.
Ai Ai , 13 Abril 2014 - 22:40:11 hr.
...
Sim é verdade, não vale a pena estar com coisas, é como alguém diz e pronto.

A minha leitura de "aplica-se os EMA´S, caso exista", pressupõe sempre a verificação da possibilidade de se aplicar ou não e da necessidade de saber se existe ou não.
Imaginem que era aprovado um sonómetro e na aprovação nada era mencionado de EMA'S visto o aparelho comprado pelo estado português ser o supra sumo dos sonómetros. O que é que os entendidos iam fazer, visto que se tem de aplicar alguma dedução porque sim?
Rocas , 15 Abril 2014 - 00:30:56 hr.

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