Antes de chegar ao nome de João Caupers, juizes tiveram várias recusas. Salário e exclusividade desencorajam.
Na passada quinta-feira, 27 de Fevereiro, ficou a conhecer-se o nome do novo juiz do Tribunal Constitucional (TC). João Caupers, catedrático de Direito Administrativo da Universidade Nova de Lisboa, vai substituir no cargo Maria João Antunes, cujo mandato terminara já em Outubro do ano passado. Pelo meio, houve vários convites, a especialistas em Direito Constitucional, que culminaram em recusas. E o novo juiz acabaria, afinal, por ser um especialista em direito público, sim, mas da área do administrativo.
Maria João Antunes, catedrática de Coimbra, especialista em penal, chegou ao TC em 2004 e já terminou o seu mandato há quatro meses.Foi cooptada- escolhida pelos restantes magistrados - portanto teria de ser também essa a forma de escolha do seu substituto. Contudo, o processo de substituição não foi fácil. O salário será, desde logo, um factor desencorajador. O outro será o facto de se exigir exclusividade, ou seja, durante nove anos, tantos quantos dura o mandato, um juiz do TC não faz mais nada e é obrigado a deixar de lado toda a sua actividade profissional habitual. Se dá aulas, pode continuar a fazê-lo, mas não será remunerado por isso. Por outro lado, como é sabido, são em regra pessoas que se dedicam a emitir pareceres sobre questões conturbadas do direito e que são bem pagos por isso. Uma vez no TC, não poderão continuar a fazê-lo. E benesses que existiam, como as subvenções vitalícias ou o subsídio de reintegração foram cortados há já algum tempo.
Rui Moura Ramos, ex-presidente do TC, desdramatiza e admite que, neste caso, o atraso na substituição possa estar relacionado com os processos de fiscalização preventiva que têm passado pelo tribunal, já que "não faria sentido que o colectivo que estava em funções fosse alterado no meio do processo decisório". De resto, lembra, já tem havido outros casos em que a cooptação demorou algum tempo. Actualmente, recorde-se, o TC tem em mãos a fiscalização sucessiva do Orçamento do Estado para 2014 e, que se saiba, não haverá ainda uma decisão tomada.
João Caupers: um crítico da austeridade
"A escalada da guerra ao funcionário público continua e intensificase. Os patéticos argumentos com que a justificam (?) não conseguem esconder a clara e simples verdade: o Governo espreme-nos, espolia-nos e esmaga-nos". E desta forma que começa um texto de João Caupers, publicado no site da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa. Trata-se de "uma guerra em que vale tudo"e"a pobre da Constituição já é pouco mais do que um papel", prossegue. O professor, que será mais próximo da esquerda política, não tem poupado nas críticas à austeridade imposta pelo Governo. Recentemente participou, como convidado, na conferência "Liberdade, Segurança e Justiça" do ciclo Novo Rumo, organizada pelo PS, onde falou sobre forças de segurança Incógnita sobre o futuro da CES João Caupers tomará agora o lugar de Maria João Antunes que, dadas as dificuldades que o colectivo encontrou para a substituir, foi ficando no cargo, o que significou um exercício pleno de funções, com uma participação normal e regular nas decisões que o tribunal tem em mãos. E isso poderá ter a sua relevância, dada a forma como decidiu no passado recente em alguns processos importantes. Veja-se o caso da contribuição extraordinária de solidariedade (CES), que foi viabilizada por sete votos contra seis. Maria João Antunes fez parte do grupo dos sete, mas será que quem agora a vai substituir terá uma orientação semelhante? Embora o Presidente tenha abdicado da fiscalização preventiva, tudo indica que o TC terá de se pronunciar sobre a CES agravada que saiu do Orçamento Rectificativo, nem que seja pela mão dos partidos da oposição.
Segundo o Negócios apurou, há o entendimento interno de que a escolha dos novos magistrados, quando cooptados, não deve potenciar alterações nas orientações de natureza ideológica já assumidas pelo tribunal. O objectivo é assegurar que o TC mantém uma linha decisória coerente, uma questão particularmente relevante num período em que tem sido chamado a decidir sobre temas sociais e políticos fracturantes.
Filomena Lança e Eva Gaspar | Jornal de Negócios | 03-03-2014
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