O que é uma embaixada? Foi em torno da precisão deste conceito que se decidiu uma das batalhas judiciais em disputa entre a República angolana e o Fisco português.
O Estado português quis cobrar IMI à embaixada de Angola, por instalações fora do edifício da Avenida da República, mas o Tribunal Central Administrativo do Sul não deixou: à luz do direito internacional, Portugal não pode cobrar impostos a países com quem tenha assinado a Convenção de Viena, concluiu o colectivo de juizes.
Na origem da contenda estiveram 13 fracções autónomas no Lumiar, compradas pela embaixada angolana, corria o ano de 1998. Chegados a 2011, o Fisco considerou que aquelas instalações não estão a ser usadas para as finalidades diplomáticas - a embaixada propriamente dita situa-se na Avenida da República e a lei manda que se conceda uma isenção ao chefe de missão (o embaixador) e às missões em Portugal (a embaixada). Estavam em causa cerca de 4.000 euros por ano em IMI e que, se fossem considerados devidos, se repetiriam todos os anos a favor dos cofres públicos. Mas depois de o tribunal tributário, em primeira instância, ter dado razão ao Estado, o tribunal superior reverteu a sentença e colocou-se do lado do queixoso.
A disputa gira em torno do artigo 23.° da Convenção de Viena, que prevê que "o Estado acreditante [neste caso Angola] e o chefe de missão [o embaixador] estão isentos de todos os impostos e taxas nacionais, regionais ou municipais sobre os locais da missão de que sejam proprietários ou inquilinos". Se parece não haver dúvidas sobre a identificação da residência do embaixador, já o conceito de "local de uma missão" - isto é, da embaixada podedar azo a interpretações diversas. Para o Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS) a "missão diplomática é o conjunto de pessoas nomeadas para um Estado, para exercer, sob a autoridade de um chefe de missão, funções de carácter diplomático, mas, na prática, significa o local onde as pessoas designadas pelo Estado acreditante trabalham". E os locais de missão representam "os edifícios, ou parte de edifícios, e terrenos anexos, seja quem for o seu proprietário, utilizados para as finalidades da missão".
Face a isto, o TCAS entende que se aplicam às fracções do Lumiar as mesmas regras que se aplicam às instalações da embaixada propriamente dita na Avenida da República - estão a salvo de qualquer tributação em território nacional.
Segundo o colectivo de juizes, liderado por Benjamim Barbosa, quando a Convenção de Viena estabelece uma isenção de todo e qualquer imposto às missões diplomáticas, nem sequer se está perante uma isenção no sentido estrito do termo. Está-se perante um "privilégio de direito internacional que impede que se estabeleça qualquer relação tributária em tudo o que diga respeito às missões diplomáticas". Dito de outro modo, o imposto nem sequer existe, não se podendo exigir o que não existe.
Este não é o único processo judicial que o Estado angolano mantém com Portugal. Num processo paralelo, a Autoridade Tributária e Aduaneira suspendeu igualmente a isenção de IMI à embaixada de Angola por ter detectado algumas dívidas fiscais por regularizar, numa operação que envolveu outros Estados. Este processo encontra-se ainda para decisão, nos tribunais.
Elisabete Miranda | Jornal de Negócios | 05-08-2014
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