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REVISTA DE 2014

Governo atrasa pagamentos que TC decidiu

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O Tribunal Constitucional (TC) chumbou três normas do Orçamento do Estado para 2014 e poupou o Governo a ter de pagar com efeitos retroativos a 1 de janeiro os salários da função pública, afirmando que o mesmo produz efeitos à data da decisão – 30 de maio. Mas Passos Coelho ficou com dúvidas se os juízes quiseram dizer 30 ou 31 de maio. O último dia do mês já simplificaria as contas ao Governo. Esta é uma das "obscuridades" ou "ambiguidades" que o primeiro-ministro aponta ao acórdão dos juizes do Palácio Ratton.

Numa carta de quatro páginas dirigida à presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, em que Passos Coelho pede a aclaração do texto, o primeiro-ministro explica a razão de ser da data. "Tendo em conta que o mês de maio tem 31 dias e o Tribunal decidiu que a decisão devia reportar os seus efeitos à data da sua prolação (30 de maio), coloca-se também a dúvida de saber se o Tribunal pretendia referir-se com a expressão 'data da presente decisão' ao último dia do mês – de forma que os seus efeitos só verdadeiramente abrangerão o mês de junho, o que, evidentemente, simplificaria a carga administrativa de recalculo das remunerações em causa -, ou se pretendia antes abranger nos efeitos da sua decisão também o remanescente do mês de maio".

Contas feitas aos dias, Passos Coelho começa a carta – cujo conteúdo será discutido hoje numa conferência de líderes parlamentares extraordinária, convocada por Assunção Esteves – a recordar que o acórdão "só" produz "efeitos a partir da data da presente decisão", há "três questões quanto ao exato alcance temporal [da] restrição de efeitos", por se aplicarem "reduções remuneratórias a todos os trabalhadores do sector público", incluindo os cortes dos subsídios de férias e de Natal. Assim, argumenta o primeiro-ministro, é preciso determinar os efeitos do chumbo desses cortes dos funcionários públicos para processar os dois subsídios.

Por um lado, avisa Passos Coelho, os juízes têm de clarificar se "os duodécimos já pagos [do subsídio de Natal] se encontram ressalvados pela referida restrição", ou seja, se estes não terão de ser pagos retroativamente.

Já sobre o subsídio de férias, o primeiro-ministro diz que "pode colocar-se a dúvida de saber qual a data relevante para decidir o montante desse subsídio: aquela na qual se constituiu o respetivo direito (1 de janeiro de cada ano) ou aquela em que se processa o respetivo pagamento". Ou seja: o subsídio de férias é pago pelo valor que os funcionários públicos recebiam a 1 de janeiro ou que receberão agora, com a decisão de repor os salários?

Outra questão apontada pelo primeiro-ministro é a "de saber", uma vez que o subsídio de férias é pago em diferentes meses, "se da aplicação prática da referida restrição de efeitos não resultarão, em matéria de subsídio de férias, situações de desigualdade no cumprimento das obrigações de reposição/redefinição que possam ser evitadas por uma aclaração do Tribunal que reduza essa ambiguidade".

O primeiro-ministro enviou a carta para Assunção Esteves porque, como refere, "o órgão autor das normas declaradas inconstitucionais é a Assembleia da República", apelando ao "espírito de cooperação interinstitucional".

TC espera pelo pedido

À esquerda, PCP e BE já avisaram contra esta tentativa de mudar "na secretaria" a decisão dos juízes. "É uma decisão inequívoca e sem dupla interpretação do TC: que se pague aquilo que é de direito pagar a partir do momento da decisão", afirmou Pedro Filipe Soares (BE). João Oliveira (PCP) apontou o dedo ao Governo por querer usar o Parlamento como "arma de arremesso" contra o TC, insistindo que o acórdão "não levanta dúvidas".

O PS fica à espera do que decidirá hoje Assunção Esteves para se pronunciar. E à espera estão ainda os juízes: "O TC não se pronuncia sobre um pedido que não deu entrada", afirmou ao DN fonte oficial do Tribunal Constitucional.

Pensões de junho com corte

O Governo tem dúvidas quanto aos salários, mas o mesmo já não se passará com as consequências do acórdão do TC nas pensões e noutras prestações sociais.

As pensões de viuvez pagas pela Segurança Social ainda vão chegar este mês aos seus beneficiários com corte. Este apenas será suspenso em julho porque o processamento das reformas deste mês foi iniciado antes de ser conhecida a decisão do TC (que considerou inconstitucionais as normas do Orçamento do Estado que criaram a redução das pensões de sobrevivência e as taxas de 5% e 6% sobre os subsídios de doença e de desemprego)

As pensões deste mês chegarão aos seus beneficiários a 10 de junho, segundo indica o calendário disponível no site da Segurança Social. Num comunicado ontem emitido, o Instituto de Informática da Segurança Social adianta que a restituição dos cortes que desde janeiro está a ser aplicada aos viúvos reformados com um valor mensal de pensões acima dos dois mil euros apenas ocorrerá em agosto. Já as taxas de 5% e 6% sobre os subsídios de doença e de desemprego vão ser suspensas a partir de julho e a restituição dos valores retidos desde janeiro vai ser feita em julho.

O instituto refere que "a aplicação da contribuição sobre o subsídio de doença e sobre o subsídio de desemprego será suspensa a partir do processamento relativo a julho de 2014 e a restituição dos valores anteriormente retidos ocorrerá nesse mesmo processamento". Segundo o já referido calendário, as prestações de doença e de desemprego são pagas a 23 deste mês.

PS quer carta já enviada ao FMI

Parlamento A bancada do PS entregou ontem um requerimento a Assunção Esteves a exigir "com carácter de urgência que o Governo dê conta ao Parlamento e publicite a carta de intenções remetida ao FMI", depois de, durante semanas, o Executivo ter garantido que o conteúdo da carta não traria novidades e Passos Coelho ter afirmado que a mesma só seria conhecida em junho.

No requerimento, assinado pelo líder parlamentar Alberto Martins, a que o DN teve acesso, os socialistas recordam que " [na segunda-feira], soube-se pelas declarações da ministra de Estado e das Finanças que a carta não só já foi enviada para o FMI como terá de ser revista. Fica claro que a carta de intenções não é um mero procedimento formal no final da avaliação do PAEF [Programa de Assistência Económica e Financeira] , conforme o Governo tentou fazer crer, mas constitui um verdadeiro programa pós-troika".

Maria Luís Albuquerque tinha admitido na segunda-feira a existência da carta ao FMI e que a mesma agora terá de ser alterada em função do chumbo do Tribunal Constitucional. No entanto, a 8 de maio, dizia-se que o documento só seria fechado mesmo em cima da aprovação da última tranche pela direção do FMI, a 16 de junho.

A direção do PS veio entretanto acusar o Governo de preparar "com a troika um programa 'pós-troika' e pretende fazê-lo nas costas dos portugueses". Segundo disse a fonte da direção socialista ao DN, como "a carta de intenções do Governo não é um mero formalismo mas contemplará medidas que afetarão os portugueses e a economia nacional, o conhecimento público do documento é da maior importância".

"O Governo não pode esconder os compromissos que tem com o FMI como se de um negócio particular se tratasse", reiterou a referida fonte. O pedido de "transparência" ao Executivo é feito também no quadro do Documento de Estratégia Orçamental.

Miguel Maduro | Diário de Notícias | 04-06-2014

Comentários (1)


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uma pura garotice. triste país este que é governado por garotos políticos, que transformam a política num nojo.
ui , 04 Junho 2014 - 18:17:04 hr.

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