O professor catedrático Luís Menezes Leitão considera que o pedido de aclaração que o Governo pediu à presidente da Assembleia da República que solicitasse ao Tribunal Constitucional "não tem qualquer base legal" no novo Código de Processo Civil.
"O presente pedido de aclaração não tem qualquer base legal, com base no novo Código de Processo Civil de 2013, que o próprio Governo fez aprovar", concluiu Menezes Leitão, quando confrontado pela Agência Lusa com o documento oficial em que o Governo anuncia essa intenção.
Analisado o documento, o professor de Direito é de opinião que parece haver "uma grande confusão" neste pedido de aclaração que o Governo pediu a Assunção Esteves que solicitasse ao Tribunal Constitucional (TC).
"É um facto que, com base na disposição do artigo 669.º do anterior Código do Processo Civil, que permitia às partes pedir o 'esclarecimento de alguma ambiguidade ou obscuridade da decisão', o TC tem apreciado pedidos de aclaração, assim acontecendo nos Acórdãos 429/91, 1145/96, e 128/2003, citados pelo Governo. Sucede, porém, que esses pedidos de aclaração foram todos indeferidos, por o Tribunal ter considerado não existir qualquer obscuridade ou ambiguidade nas suas decisões", refere Menezes Leitão.
Atualmente - explicou ainda - foi eliminada, no atual Código do Processo Civil, a possibilidade de solicitar a aclaração das decisões, já que o correspondente artigo 616.º do novo Código apenas prevê o pedido de reforma da sentença quanto a custas e multa.
"Hoje não é possível por isso pedir aclarações. Por esse motivo, o Governo vem invocar os preceitos dos artigos 614º, nº 1, e 615º, nº 1, c), do novo Código de Processo Civil. Só que a primeira norma refere-se antes à existência de erros materiais (erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexatidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto), o que não é o caso. Já a segunda norma refere-se ao facto de a sentença ser nula por existir alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, o que também não é o caso", conclui.
Pelo exposto, Menezes Leitão sustenta que o "presente pedido de aclaração não tem qualquer base legal, com base no novo Código de Processo Civil de 2013, que o próprio Governo fez aprovar".
Na carta enviada pelo primeiro-ministro à presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, Pedro Passos Coelho sublinha que "na análise do acórdão e dos seus fundamentos foi detetado um conjunto de questões de ambiguidade ou obscuridade para cujo esclarecimento é ainda e também competente o Tribunal Constitucional (TC)".
O chefe de Governo lembra ainda que o autor das normas declaradas inconstitucionais é a Assembleia da República, apelando por isso a que "num espírito de cooperação interinstitucional", Assunção Esteves promova junto do TC a aclaração de duas matérias: por um lado, que esclareça os efeitos do acórdão no pagamento dos subsídios de férias e de Natal aos funcionários públicos e, por outro, que clarifique se a decisão dos juízes se aplica a partir de 30 ou 31 de maio.
Ouvidos pela Lusa, os constitucionalistas Jorge Miranda e Bacelar Vasconcelos consideraram que o pedido de aclaração "não tem efeitos suspensivos" quanto à decisão de sexta-feira.
A presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, convocou para quarta-feira, às 14.30 horas, uma conferência de líderes extraordinária para debater o pedido de aclaração que o Governo pretende que seja solicitado ao Tribunal Constitucional através do parlamento.
Na sexta-feira, o TC chumbou três normas do Orçamento do Estado para 2014, incluindo o corte dos salários dos funcionários públicos a partir dos 675 euros.
Jornal de Notícias | 03-06-2014
Comentários (7)
Exibir/Esconder comentários
Um golpe de génio
Dá ideia de que nem sequer falam uns com os outros, porque num governo normal a ministra da Justiça avisaria logo o primeiro-ministro acerca dessa impossibilidade.
...
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar.
Guerra Junqueiro, in 'Pátria (1896)'
Tema(s): Portugal
...
para bom entendedor...
" Para além do sancionamento dos comportamentos dilatórios da parte, instituem- se os mecanismos processuais aptos a preveni-los, permitindo pôr-lhes termo prontamente: para além das normas limitativas do direito ao recurso quanto a meras decisões interlocutórias, de reduzido relevo para os direitos fundamentais das partes, anteriormente referidas, reduz-se a possibilidade de suscitação de incidentes pós- decisórios – aclarações ou pretensas nulidades da decisão final, – a coberto dos quais se prolonga artificiosamente o curso da lide. Assim: Elimina-se o incidente de aclaração ou esclarecimento de pretensas e, na esmagadora maioria dos casos, ficcionadas e inexistentes obscuridades ou ambiguidades da decisão reclamada – apenas se consentindo ao interessado arguir, pelo meio próprio, a nulidade da sentença que seja efectivamente ininteligível; "
Ou seja, o Prof. Menezes Leitão disse há dois dias o que o governo deu a conhecer ao universo jurídico há 1 ano atrás...saiu do próprio governo as linhas que se transcreverem e onde, preto no branco, se diz que as aclarações são manobras dilatórias de maus perdedores.
Como se interpreta a inconstitucionalidade da constituição?
- Fiscalização preventiva da constitucionalidade,
- Fiscalização concreta da constitucionalidade e da legalidade,
- Fiscalização abstracta da constitucionalidade e da legalidade,
- Inconstitucionalidade por omissão.
Fiscalização preventiva da constitucionalidade:
Aplica-se na base de criação das normas, antes da sua publicação. Têm poder para requerer a fiscalização preventiva as entidades previstas no artigo 278º, nº 1, 2, 3 e 4, da CRP.
Se existir pronunciamento sobre a constitucionalidade o tribunal fundamenta a decisão através dos elementos constitutivos dos factos e do direito aplicável, demonstrando-se porque é que a norma é inconstitucional através das consequências ou objectivos em relação ou comparação com o caso contrário, idêntico ou em causa (como e porquê).
Cabe ao PR a decisão última, embora deva vetar o diploma, apenas se a fundamentação do TC for eficaz e legal (artigo 279. nº 1 e 2 da CRP).
Fiscalização preventiva concreta da constitucionalidade e da legalidade:
Aplica-se para as necessidades de recurso contra as decisões dos tribunais, por exemplo que recusem ou apliquem normas fundamentadas na sua inconstitucionalidade ou quando a inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante um processo.
Fiscalização abstracta inconstitucionalidade da constitucionalidade e da legalidade.
É apenas aplicável a normas em vigor ou publicadas (de qualquer norma e a qualquer tempo, mas depois de publicadas porque se trata de uma maneira de se poder identificar erros inconstitucionais em qualquer altura).
Neste caso a norma em causa tem efeito de repristinação; ou seja, volta ao modo antigo ou lei anterior revogada pela norma considerada posteriormente inconstitucional (artigo 282º, nº 1 da CRP).
A inconstitucionalidade por Omissão.
Quando há omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais.
Esta norma é a que torna a própria Constituição e todas as leis inconstitucionais, porque nenhuma destas normas tem regulamento interpretativo. Assim, a interpretação das normas e dos seus termos ou processo é sempre arbitrária, gerando a confusão.
Na verdade, sem o regulamento interpretativo nenhuma norma é exequível de aplicação prática, uma vez que qualquer fundamentação serve, por seu lado porque se pode atribuir à verdade a condição de opinião, retirando pois o direito ao considerá-lo como uma mera ideologia ou política; em suma um interesse particular.
Escreva o seu comentário
< Anterior | Seguinte > |
---|