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REVISTA DE 2014

Cortes salariais foram para todos. Aumentos só para alguns

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Seja sob a forma de subsídios ou suplementos remuneratórios, seja por via de promoções, milhares de funcionários públicos de algumas corporações conseguiram aumentos salariais, em contra-corrente com aquilo que tem sido a maré de cortes desde a chegada da troika a Portugal.

A regra dos últimos três anos na Administração Pública tem sido cortar. Cortar nos salários. Cortar nas férias. Cortar nas pensões. Mas como em toda a regra, também aqui há excepções. Nesta balança da austeridade, o segundo prato tem sido preenchido com aumentos salariais a certos grupos profissionais. Médicos, enfermeiros, polícias e militares sofreram nestes três anos os cortes salariais transversais à Função Pública, mas conseguiram, por diferentes vias, acréscimos nos vencimentos, graças ao poder que cada um deles detém: seja o das "armas", seja o da capacidade de mobilização, seja o da influência social.

O aumento mais recente foi o do subsídio de fardamento dos polícias (PSP e GNR), que passou de 25 para 50 euros mensais (600 anuais) e entra em vigor em Abril. Mas os acréscimos salariais não se ficam por aqui. Desde a chegada da troika, em Maio de 2011, que as progressões na carreira estão genericamente congeladas, mas não para todos.

Ainda recentemente o ministro da Defesa, Aguiar-Branco, veio falar na "discriminação positiva" de que têm sido alvo os militares no caso das promoções. Em 2012 e 2013 houve mais de 18 mil promoções nas Forças Armadas. Ao Negócios, o vice-presidente da Associação Nacional de Sargentos, Mário Ramos, explicou que "as promoções resultam não de um privilégio, mas directamente de uma necessidade, quer operacional, quer orgânica".

Na semana passada também o ministro da Saúde, Paulo Macedo, frisou que não vê a política do seu ministério "em termos de concursos e progressão de carreira noutras áreas da administração pública".

Em 2013 foram concluídos dois concursos para grau de consultor, com a aprovação de mais de 2.800 médicos, e foi lançado um concurso com 130 vagas para o topo da carreira (assistente graduado sénior).

Nas polícias houve igualmente promoções anuais, "no caso dos oficiais de forma automática", explicaram Paulo Rodrigues, presidente da Associação Sindical dos Profissionais de Polícia, e Pedro Gouveia, vice-presidente da Associação Nacional Autónoma de Guardas da GNR. Este último frisou porém que "não se pode tomar a parte pelo todo", exemplificando com um guarda com 15 anos de serviço que ganha menos do que há 10 anos.

Acordos anteriores à troika também ditaram aumentos

Na base de alguns aumentos estiveram acordos anteriores à chegada da troika e que este Governo não quebrou. Foi o que sucedeu aos enfermeiros cuja nova grelha salarial, de 2010, se traduziu numa subida de 180 euros no início da carreira.

Ficou definido que o reposicionamento seria feito ao longo dos três anos seguintes, o que acabou por se concretizar. Cerca de 6.000 enfermeiros foram reposicionados. Também em 2010 PSP e GNR foram integradas na tabela remuneratória única da Função Pública, mas como os reposicionamentos não foram todos feitos de imediato, para corrigir essa situação, o actual ministro da Administração Interna, reposicionou, segundo os sindicatos, mais de 2.000 guardas principais no final de 2012, e 14 mil polícias de segurança pública em 2013.

Quem estava no início de carreira teve um aumento de cerca de 40 euros. No caso dos chefes, a diferença rondou os 100 euros, relatou ao Negócios Paulo Rodrigues. Além destes ajustes salariais, os polícias viram ainda ser actualizados, tal como previsto em 2010, o subsídio de fardamento e o suplemento de forças de segurança, tanto em 2011 como em 2013. No caso do fardamento passaram a receber 300 euros anuais, o dobro do que recebiam em 2010.

Mas Pedro Gouveia explica que "isso visou compensar o investimento em fardamento novo". Uma mudança que ainda não aconteceu. Paulo Rodrigues valorizou os "ajustamentos", mas também não os vê como "um benefício". "O estatuto tinha de ser aplicado. O desbloqueamento era uma necessidade para garantir que tudo funcionaria na normalidade".

Quem beneficiou ainda de uma nova grelha salarial foram os médicos, em 2012. Os clínicos foram os únicos que conseguiram acordar mais dinheiro pelas 40 horas semanais. Mário Jorge Neves, da FNAM, lembra que "essa questão estava definida nos acordos colectivos, há mais de quatro anos" e acrescentou que "o que é injusto é este Governo impor o alagamento de horário aos restantes funcionários públicos sem os remunerar por isso".

CORTES APLICADOS A TODA A FUNÇÃO PÚBLICA

REDUÇÃO DE VENCIMENTOS ACIMA DOS 1.500 EUROS
A primeira medida com um impacto significativo nos salários foi tomada ainda durante o Governo de Sócrates, de forma temporária, mas manteve-se até ao final do ano passado. Consiste num corte nominal dos salários superiores a 1.500 euros.

CORTES NOS SUBSÍDIOS DE FÉRIAS E DE NATAL
Em 2012, os funcionários públicos que ganham acima de 1.100 euros não receberam subsídio de férias nem de Natal. Entre os 600 euros e os 1.100 euros o corte foi parcial. Esta medida foi declarada inconstitucional, mas o Tribunal Constitucional permitiu que se aplicasse nesse ano. No ano seguinte, o Governo decidiu o "enorme" aumento de impostos.

AGRAVAMENTO DOS CORTES
No início deste ano, o Governo agravou os cortes salariais que se estavam a aplicar desde 2011. As reduções passaram a aplicar-se a todos os funcionários que ganham acima de 675 euros, com um corte que começa nos 2,5% e que chega aos 12% para quem tem um salário de 2.000 euros brutos.

REDUÇÃO NAS HORAS EXTRAORDINÁRIAS
A compensação por prestação de horas extraordinárias caiu para metade. No caso de quem trabalha apenas 35 horas, o valor é ainda mais baixo. O horário de trabalho aumentou para as 40 horas.

AUMENTOS PARA A CGA E PARA A ADSE
A taxa de descontos para a CGA passou de 10% para 11% em 2011. Já os descontos para a ADSE subiram sobretudo desde o ano passado, de 1,5% para 2,5%. O Governo pretende que chegue aos 3,5%.

CONGELAMENTO DE PRÉMIOS E PROGRESSÕES
As diferentes formas de valorizar salários, como as progressões, estão genericamente proibidas desde 2011. O Governo tem vindo a abrir, no entanto, algumas excepções.

Marlene Carriço | Jornal de Negócios | 31-03-2014

Seja sob a forma de subsídios ou suplementos remuneratórios, seja por via de promoções, milhares de funcionários públicos de algumas corporações conseguiram aumentos salariais, em contra-corrente com aquilo que tem sido a maré de cortes desde a chegada da troika a Portugal  
 
MARLENE CARRIÇO  
 
A regra dos últimos três anos na Administração Pública tem sido cortar. Cortar nos salários. Cortar nas férias. Cortar nas pensões. Mas como em toda a regra, também aqui há excepções. Nesta balança da austeridade, o segundo prato tem sido preenchido com aumentos salariais a certos grupos profissionais. Médicos, enfermeiros, polícias e militares sofreram nestes três anos os cortes salariais transversais à Função Pública, mas conseguiram, por diferentes vias, acréscimos nos vencimentos, graças ao poder que cada um deles detém: seja o das "armas", seja o da capacidade de mobilização, seja o da influência social.  
 
O aumento mais recente foi o do subsídio de fardamento dos polícias (PSP e GNR), que passou de 25 para 50 euros mensais (600 anuais) e entra em vigor em Abril. Mas os acréscimos salariais não se ficam por aqui. Desde a chegada da troika, em Maio de 2011, que as progressões na carreira estão genericamente congeladas, mas não para todos.  
 
Ainda recentemente o ministro da Defesa, Aguiar-Branco, veio falar na "discriminação positiva" de que têm sido alvo os militares no caso das promoções. Em 2012 e 2013 houve mais de 18 mil promoções nas Forças Armadas. Ao Negócios, o vice-presidente da Associação Nacional de Sargentos, Mário Ramos, explicou que "as promoções resultam não de um privilégio, mas directamente de uma necessidade, quer operacional, quer orgânica".  
 
Na semana passada também o ministro da Saúde, Paulo Macedo, frisou que não vê a política do seu ministério "em termos de concursos e progressão de carreira noutras áreas da administração pública".  
 
Em 2013 foram concluídos dois concursos para grau de consultor, com a aprovação de mais de 2.800 médicos, e foi lançado um concurso com 130 vagas para o topo da carreira (assistente graduado sénior).  
 
Nas polícias houve igualmente promoções anuais, "no caso dos oficiais de forma automática", explicaram Paulo Rodrigues, presidente da Associação Sindical dos Profissionais de Polícia, e Pedro Gouveia, vice-presidente da Associação Nacional Autónoma de Guardas da GNR. Este último frisou porém que "não se pode tomar a parte pelo todo", exemplificando com um guarda com 15 anos de serviço que ganha menos do que há 10 anos.  
 
Acordos anteriores à troika também ditaram aumentos  
 
Na base de alguns aumentos estiveram acordos anteriores à chegada da troika e que este Governo não quebrou. Foi o que sucedeu aos enfermeiros cuja nova grelha salarial, de 2010, se traduziu numa subida de 180 euros no início da carreira.  
 
Ficou definido que o reposicionamento seria feito ao longo dos três anos seguintes, o que acabou por se concretizar. Cerca de 6.000 enfermeiros foram reposicionados. Também em 2010 PSP e GNR foram integradas na tabela remuneratória única da Função Pública, mas como os reposicionamentos não foram todos feitos de imediato, para corrigir essa situação, o actual ministro da Administração Interna, reposicionou, segundo os sindicatos, mais de 2.000 guardas principais no final de 2012, e 14 mil polícias de segurança pública em 2013.  
 
Quem estava no início de carreira teve um aumento de cerca de 40 euros. No caso dos chefes, a diferença rondou os 100 euros, relatou ao Negócios Paulo Rodrigues. Além destes ajustes salariais, os polícias viram ainda ser actualizados, tal como previsto em 2010, o subsídio de fardamento e o suplemento de forças de segurança, tanto em 2011 como em 2013. No caso do fardamento passaram a receber 300 euros anuais, o dobro do que recebiam em 2010.  
 
Mas Pedro Gouveia explica que "isso visou compensar o investimento em fardamento novo". Uma mudança que ainda não aconteceu. Paulo Rodrigues valorizou os "ajustamentos", mas também não os vê como "um benefício". "O estatuto tinha de ser aplicado. O desbloqueamento era uma necessidade para garantir que tudo funcionaria na normalidade".  
 
Quem beneficiou ainda de uma nova grelha salarial foram os médicos, em 2012. Os clínicos foram os únicos que conseguiram acordar mais dinheiro pelas 40 horas semanais. Mário Jorge Neves, da FNAM, lembra que "essa questão estava definida nos acordos colectivos, há mais de quatro anos" e acrescentou que "o que é injusto é este Governo impor o alagamento de horário aos restantes funcionários públicos sem os remunerar por isso".  
 
MEDIDAS  
 
CORTES APLICADOS A TODA A FUNÇÃO PÚBLICA  
 
REDUÇÃO DE VENCIMENTOS ACIMA DOS 1.500 EUROS  
 
A primeira medida com um impacto significativo nos salários foi tomada ainda durante o Governo de Sócrates, de forma temporária, mas manteve-se até ao final do ano passado. Consiste num corte nominal dos salários superiores a 1.500 euros.  
 
CORTES NOS SUBSÍDIOS DE FÉRIAS E DE NATAL  
 
Em 2012, os funcionários públicos que ganham acima de 1.100 euros não receberam subsídio de férias nem de Natal. Entre os 600 euros e os 1.100 euros o corte foi parcial. Esta medida foi declarada inconstitucional, mas o Tribunal Constitucional permitiu que se aplicasse nesse ano. No ano seguinte, o Governo decidiu o "enorme" aumento de impostos.  
 
AGRAVAMENTO DOS CORTES  
 
No início deste ano, o Governo agravou os cortes salariais que se estavam a aplicar desde 2011. As reduções passaram a aplicar-se a todos os funcionários que ganham acima de 675 euros, com um corte que começa nos 2,5% e que chega aos 12% para quem tem um salário de 2.000 euros brutos.  
 
REDUÇÃO NAS HORAS EXTRAORDINÁRIAS  
 
A compensação por prestação de horas extraordinárias caiu para metade. No caso de quem trabalha apenas 35 horas, o valor é ainda mais baixo. O horário de trabalho aumentou para as 40 horas.  
 
AUMENTOS PARA A CGA E PARA A ADSE  
 
A taxa de descontos para a CGA passou de 10% para 11% em 2011. Já os descontos para a ADSE subiram sobretudo desde o ano passado, de 1,5% para 2,5%. O Governo pretende que chegue aos 3,5%.  
 
CONGELAMENTO DE PRÉMIOS E PROGRESSÕES  
 
As diferentes formas de valorizar salários, como as progressões, estão genericamente proibidas desde 2011. O Governo tem vindo a abrir, no entanto, algumas excepções.

Comentários (4)


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Os jornalistas económicos (!) são uma tristeza. Fazem por esquecer que a malta do BP, da CGD, etc não pagaram um chavo. Pandilha de mentirosos.
aldrabões , 01 Abril 2014 - 10:25:26 hr.
ASJP
Tenho a certeza que a ASJP com a sua luta de "apelar", "advertir", "fazer sentir", etc. irá conseguir conquistas idênticas. À PJ bastou um pré-aviso de greve (e o apoio do correio da manhã) para conseguir o aumento da compensação pelo piquete.
Pedro , 01 Abril 2014 - 14:05:06 hr.
...
Quem se lembra do «protocolo» celebrado com a dra. Celeste Cardona? Afinal não era para cumprir? Afinal não foi cumprido, pelo menos, com os enfermeiros? E os srs. militares, têm maior importância social do que os Juízes? Juízes a auferir € 1.500,00 não perturba o normal funcionamento das instituições? Venham mais uns estudos e pareceres, para a asjp se entreter...
o céptico , 02 Abril 2014 - 14:59:12 hr.
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Cortes salariais foram para todos. Cortes salariais foram para todos? O BAzevedo e o AAmorim tiveram cortes?
meu , 02 Abril 2014 - 16:36:47 hr.

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