Três juizes, um procurador e um oficial de justiça são os meios destacados hoje, na 3.ª Vara Criminal de Lisboa, para o julgamento de um jovem de 16 anos que roubou pizas a um motociclista da empresa Telepizza quando este foi entregar a encomenda feita online, no valor de 31,50 euros.
Indignado com a "distração" do Ministério Público, "que mandou este processo por roubo para um coletivo" nas varas criminais, o advogado de defesa oficioso do menor, Vítor Parente Ribeiro, garantiu, em declarações ao DN, que as custas judiciais para o seu cliente "serão bem mais elevadas do que o produto do roubo". "Se o miúdo for condenado, terá de pagar os meus honorários que rondam os quatrocentos e tal euros e as custas nunca inferiores a três unidades de conta. No conjunto, mais de mil euros. Mas como ele não tem condições para pagar, vai ser o Estado a suportar estes custos", sublinhou.
O crime de roubo, punível com pena até oito anos, pode ser sempre julgado por um coletivo. Mas há exceções, sobretudo quando "não houve uso de violência nem arma". "Quando há a possibilidade de vir a aplicar-se uma pena inferior a cinco anos, a lei obriga o Ministério Público a enviar o processo para os juízos criminais, que têm apenas um juiz, mas isso não aconteceu nesta situação", explicou Vítor Parente Ribeiro. Uma opinião partilhada pelo bastonário dos Advogados e pelo presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ) que também sublinharam ao DN o "insólito" deste caso. "O que parece é que o Ministério Público quis fazer chicana com este caso. Os magistrados portugueses não têm bom senso", comentou o bastonário Marinho e Pinto. "É um exagero ser um coletivo a julgar um caso destes! Só a perda de tempo e o desperdício de recursos que isto implica, num tempo em que escasseiam os juizes nos tribunais", criticou Fernando Jorge, o presidente do SFJ.
Pizas, asas de frango e gelatina Segundo o despacho de acusação a que o DN teve acesso, a 27 de março deste ano, pelas 17.26, no Beato (Lisboa), o jovem arguido e um outro indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, atuando em conjunto, encomendaram online à Telepizza duas pizas médias, uma piza infantil, asas de frango, bebidas, gelados, gelatina, no total de 31,50 euros. O motociclista da Telepizza, Samuel M., dirigiu-se à morada indicada no pedido, tocou à campainha e foi logo ameaçado por um dos jovens (aquele cuja identidade não foi apurada). "Para a moto e dá cá as pizas", terá ameaçado. O arguido, Gabriel C, pôs-se atrás do motociclista, e este, alegadamente com receio pela sua integridade física, não reagiu e deixou os rapazes levarem a encomenda. Só Gabriel foi identificado, o outro alegado cúmplice neste "plano concertado" de comer pizas sem pagar continua até à presente data por identificar. O jovem arguido já está referenciado por furtos.
FENÓMENO
> Têm sido inúmeros os ataques a motociclistas da Telepizza, sobretudo no bairro dos Olivais, em Lisboa, como o DN noticiou a 11 de outubro.
Jovens, dos 15 aos 17 anos, andam a roubar as pizas no momento de estas serem entregues. Esperam pelos motociclistas à entrada dos prédios, e, com agressividade, encostam-nos à parede ou aos elevadores, para levar as encomendas que estes deveriam entregar ao cliente. Os prejuízos já são avultados na Telepizza dos Olivais: um rombo superior a 4000 euros - durante um ano - em pizas encomendadas e roubadas.
Rute Coelho | Diário de Notícias | 27-11-2013
Comentários (11)
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trajectos...
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Inadmissível
Estes são os casos que devem ser denunciados porque constituem algo que deve ser extirpado do sistema. E o órgãos superiores da hierarquia do MP tb deveriam ser chamados à responsabilidade por permitirem que este tipo de situações se tenha infelizmente tornado corrente (que ninguém tenta dúvidas que isto sucede todos os dias em vários tribunas do pais).
Parabéns à jornalista. Esta notícia, pelas consequências que terá na organização do MP, evitará casos similares no futuro
Mist !!
O regresso deste país ao Séc XIX promovido pelo MP! (não chegava o governo com as suas medidas pró esclavagistas)
Roubo de um pão mesmo que redondo e chato com um molho de tomate com umas coisas em cima, julgado por três Juízes?
Isto para lá das aparentemente duvidosas envolventes relativas á identificação do acusado...
A publicidade ao evento parece um cartaz das touradas:
Grandioso julgamento do roubo das pizzas com 3 Juízes 3 ! *
*Oferta de umas asas de galinha e gelatinas aos aficionados presentes...
Isto já bateu no fundo mesmo!
Aguardo ansiosamente os próximos capítulos!
Crime de Roubo - 1 a 8, 3 a 15 e 8 a 16
1 - Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
2 - A pena é a de prisão de 3 a 15 anos se:
a) Qualquer dos agentes produzir perigo para a vida da vítima ou lhe infligir, pelo menos por negligência, ofensa à integridade física grave; ou
b) Se verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos n.os 1 e 2 do artigo 204.º, sendo correspondentemente aplicável o disposto no n.º 4 do mesmo artigo.
3 - Se do facto resultar a morte de outra pessoa, o agente é punido com pena de prisão de 8 a 16 anos.
...
confusões?
Cidadão preocupado:
Onde é que a parte sublinhada se enquadra?
"..."Para a moto e dá cá as pizas", terá ameaçado. O arguido, Gabriel C, pôs-se atrás do motociclista, e este, alegadamente com receio pela sua integridade física, não reagiu..."
...
Normativos inconstitucionais
[...]
Artigo 14.º
Competência do tribunal colectivo
1 - Compete ao tribunal colectivo, em matéria penal, julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal do júri, respeitarem a crimes previstos no título iii e no capítulo i do título v do livro ii do Código Penal e na Lei Penal Relativa às Violações do Direito Internacional Humanitário.
2 - Compete ainda ao tribunal colectivo julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal singular, respeitarem a crimes:
a) Dolosos ou agravados pelo resultado, quando for elemento do tipo a morte de uma pessoa e não devam ser julgados em processo sumário; ou
b) Cuja pena máxima, abstratamente aplicável, seja superior a 5 anos de prisão mesmo quando, no caso de concurso de infrações, seja inferior o limite máximo correspondente a cada crime e não devam ser julgados em processo sumário.
Artigo 15.º
Determinação da pena aplicável
Para efeito do disposto nos artigos 13.º e 14.º, na determinação da pena abstractamente aplicável, são levadas em conta todas as circunstâncias que possam elevar o máximo legal da pena a aplicar no processo.
Artigo 16.º
Competência do tribunal singular
1 - Compete ao tribunal singular, em matéria penal, julgar os processos que por lei não couberem na competência dos tribunais de outra espécie.
2 - Compete também ao tribunal singular, em matéria penal, julgar os processos que respeitarem a crimes:
a) Previstos no capítulo ii do título v do livro ii do Código Penal; ou
b) Cuja pena máxima, abstractamente aplicável, seja igual ou inferior a 5 anos de prisão.
c) Que devam ser julgados em processo sumário.
3 - Compete ainda ao tribunal singular julgar os processos por crimes previstos na alínea b) do n.º 2 do artigo 14.º, mesmo em caso de concurso de infracções, quando o Ministério Público, na acusação, ou, em requerimento, quando seja superveniente o conhecimento do concurso, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a 5 anos.
4 - No caso previsto no número anterior, o tribunal não pode aplicar pena de prisão superior a 5 anos.
[fim do artigo 16º]
Não poucos juristas consideram o nº 3 deste último artigo (que foi acima referido num comentário), e que permite ao MP "escolher" o tribunal de julgamento... inconstitucional! Por razões muito, muito óbvias.
E mais flagrantemente inconstitucional é o nº 4 do mesmo artigo.
Por mim, sempre achei piada a um legislador que entende que o MP deve poder determinar a competência de um tribunal (!!) e, consequentemente o limite máximo da pena a aplicar!
Aliás, põe-se o caso de saber o seguinte: se o tribunal singular (assim escolhido pelo MP) chegar à conclusão de que deve, tendo em conta o processado em audiência(s) de julgamento, aplicar pena superior a 5 anos de prisão, sob pena de ilegalidade, que deve o tribunal fazer? Declarar-se incompetente, dizendo que chegou à conclusão de que o tribunal competente é o colectivo? É uma excelentíssima perda de tempo, ou não? Ou deve esquecer o Código Penal, o dever de obediência à lei, e, só porque o CPP o diz, limitar - ainda que o CP apontasse para o contrário, tendo em conta o produzido em julgamento - a pena a não mais do que 5 anos de prisão? Chegamos então à conclusão de que uma decisão de um magistrado do MP tem o condão de alterar as molduras do Código Penal! E alguns dirão: pois tem - autoriza-o o Código de Processo Penal. Ao que direi: era só o que mais faltava.
Deixo este caso prático para reflexão. Trabalhávamos este caso nas práticas na FDUL. Obrigava, entre outras coisas, a consultar a Constituição...
(Muito grato estou ao Mestre Noronha Silveira, que tive a sorte de ter como docente quer nas teóricas quer nas práticas na FDUL, e que tinha a particularidade de ensinar esta cadeira de Direito adjectivo fazendo os alunos reflectir profundamente, em termos substantivos, sobre cada norma do Código de Processo Penal que ensinava).
Do texto da notícia:
«"Quando há a possibilidade de vir a aplicar-se uma pena inferior a cinco anos, a lei obriga o Ministério Público a enviar o processo para os juízos criminais, que têm apenas um juiz, mas isso não aconteceu nesta situação", explicou Vítor Parente Ribeiro.»
A lei obriga? É um significado novo do verbo obrigar? É que a norma - para mim, inconstitucional - diz claramente «(...) quando o Ministério Público (...) entender (...)». Se é quando entender, não é "obrigado".
Mas, repiso, os nºs 3 e 4 do artigo 16 são, em meu entender, inconstitucionais. Não vislumbro uma leitura que os torne conformes à CRP.
Não gostam, alguns, de colectivos? Bem, eu sou de opinião contrária: nenhum processo penal deveria ser conduzido senão por um colectivo. É ideia que tenho desde que fui aluno e que mantenho até hoje.
Os colectivos ficam caros? Ficam. O Direito não é para ser barato nem caro. É para ser. Poupe-se em estádios de futebol, auto-estradas desnecessárias, negócios do Estado ruinosos, e teremos melhor Direito e melhor Civilização. Ainda creio que 3 cabeças, 3 pares de olhos e 3 pares de ouvidos pensam, vêem e ouvem mais e melhor do que um só. Até me parece (talvez esteja enganado) que é essa a razão de ser... dos colectivos.
Ao primeiro comentador: a jornalista limitou-se a dar a notícia. Não vejo no artigo quaisquer traços de demagogia. Naturalmente, uma notícia destas é chamativa e vende. Mas antes isto do que andar a devassar obscenamente a vida de familiares de ex-ministros que eticamente não têm onde cair mortos (os ex-ministros, e não os familiares deles, se dúvidas houvesse).
É de muito tempo...
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