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REVISTA DE 2013

TCA chumba motoristas e cozinheiros nos tribunais

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Tribunal considera concurso nulo e põe assim em risco o lugar de ex-polícias, ex-militares, ex-cozinheiros e ex-funcionários de autarquias que escolheram trabalhar nos tribunais

Mais de 500 funcionários judiciais estão com o lugar em risco, depois de o Tribunal Central Administrativo do Sul ter declarado nulo o concurso lançado pelo Ministério da Justiça (MJ) em 2007 para preenchimento de vagas nas secretarias judiciais. A que concorreram ex-polícias, militares, cozinheiros e funcionários de autarquias, todos com vínculo à função pública. Segundo decisão judicial de 24 de abril, a que o DN teve acesso, em causa está o facto de o recurso interposto pelo MJ ter sido apresentado tarde demais. "No desrespeito do prazo legal", pode ler-se na sentença.

O Ministério da Justiça anunciou dois concursos - um em 2007 e outro em abril deste ano - em que cerca de 600 funcionários públicos teriam uma formação "relâmpago" de três meses para exercer a função de oficial de justiça. Acabaram por serem preenchidas apenas 250 vagas em 2007 e no mês passado mais 250. Este concurso, logo em 2007, indignou o Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOF), que levou a questão para os tribunais.

Quatro anos volvidos, em novembro de 2011, o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa considerou o concurso nulo. Razões? O facto de o único requisito pedido para exercer a função de oficial de justiça ser o de 11,° ano de escolaridade e não o bacharelato que até então era obrigatório. O protocolo assinado pelo MJ com a Universidade de Aveiro, em 2003, em que se admitia que as vagas do curso para Técnico Superior de Justiça teriam colocação nos tribunais, agravou ainda mais a situação. Isto porque o tribunal considerou que este concurso - que apenas pedia três meses de formação -lograva as expectativas da Universidade de Aveiro e do Ministério da Educação e do Ensino Superior.

"Ainda assim, depois disto tudo, a atual ministra da Justiça [Paula Teixeira da Cruz] insistiu num segundo concurso", explica Carlos Almeida, presidente do SOI, "mesmo depois de em primeira instância o concurso idêntico ter sido considerado nulo" (ver perguntas a). O DN tentou obter uma reação do gabinete de Paula Teixeira da Cruz mas, até ao fecho desta edição, mas não foi possível.

As estatísticas mais recentes do MJ revelam que, em 2011, existiam 7435 funcionários judiciais, menos 300 do que no ano anterior e menos 400 do que em 2008. Só em 2012, foram apresentados 686 pedidos de reforma. O próprio MJ já avançou que seriam necessários 1400 funcionários para que os quadros ficassem completos.

Segundo Fernando Jorge, do Sindicato dos Funcionários Judiciais, foram mais de 1500 os técnicos "perdidos" pelos tribunais, nos últimos três anos. A maioria dos casos por pedidos de reforma. "E neste último concurso, de abril, começaram por serem abertas 300 vagas, foram preenchidas 290 e entretanto já só estão 250 porque alguns vão desistindo pelo caminho, já que não conseguiram responder às exigências que a profissão neste momento apresenta", concluiu.

"Este é um concurso aberto para funcionários que queiram aceder à carreira. Depois dos três meses de formação ainda podem alguns não entrar, isso será avaliado", explicou o Ministério da Justiça, na altura do anúncio do segundo concurso.

COMPETÊNCIAS

ONDE TRABALHAM?
Os funcionários judiciais trabalham nas secretarias dos tribunais ou nos serviços do Ministério Público. É a eles que compete a execução dos atos dos magistrados, bem como a prática de cada vez mais atos processuais.

FUNÇÕES
São responsáveis pela receção e tratamento dos requerimentos, pela apresentação dos autos a despacho dos magistrados, pelo cumprimento das suas decisões, pela elaboração das atas das diligências e julgamentos, pelas citações, notificações e pela liquidação das taxas de justiça.

HIERARQUIA
Este grupo profissional distribui-se pelos seguintes grupos de pessoal: oficial de justiça, informática, técnico-profissional, administrativo, operário e técnico auxiliar.

4 PERGUNTAS A... CARLOS ALMEIDA, Sindicato dos Oficiais de Justiça
"A ministra insistiu num concurso ilegal"

- Quantos oficiais de justiça a menos é que têm os nossos tribunais?
- São 1400 os oficiais de justiça que faltam nos quadros dos tribunais, assumidos pelo diretor-geral de Administração da Justiça, Pedro Lima Gonçalves, que emitiu um parecer em janeiro de 2012 nesse sentido e em que era invocando o interesse público da necessidade de reforçar o quadro de oficiais de justiça. Assumiu ainda que, sem este quadro preenchido, Portugal não poderia atingir os objetivos da troika (FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia). Mas pelos vistos isso não foi suficiente, a ministra não quer resolver o problema.

- Mas estes dois concursos - de 2007 e de 2013 - não iriam ajudar a colmatar essa lacuna?
- O Ministério da Justiça insistiu em ter um concurso ilegal, sem condições nenhumas de trabalho para os funcionários públicos em causa. E insistiu em contrariar a necessidade de preencher os quadros. Porque a verdade é que os dois concursos só preenchem 500 vagas. Não as mais de mil que seriam necessárias... E com isto chegámos à situação em que estamos.

- Quantos oficiais de justiça existem atualmente?
- Cerca de 7500 colocados. Mas só em 2012 recebemos 686 pedidos de reforma e no ano anterior um número semelhante. Depois temos as pessoas a trabalharem nas piores condições. A verdade é que perdemos quase 1500 funcionários no País todo nos últimos dois, três anos...

- Que pode acontecer a estes 500 funcionários judiciais (250 do primeiro e mais 250 do segundo concurso), já que o primeiro foi declarado nulo?
- Isso é com o Ministério da Justiça, não vou ser eu a responder a isso. Mas a verdade é que o tribunal considerou que o Ministério da Justiça violou frontalmente a lei aplicável e tomou inútil o protocolo celebrado entre o Ministério da Justiça e o Ministério da Educação, relativo ao curso de Técnicos Superiores de Justiça na Universidade de Aveiro.

Filipa Ambrósio de Sousa | Diário de Notícias | 17-05-2013

Comentários (8)


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Bacharelato?
"O facto de o único requisito pedido para exercer a função de oficial de justiça ser o de 11,° ano de escolaridade e não o bacharelato que até então era obrigatório".
Quem me sabe dizer qual a média de habilitações dos juncionários judiciais? e destes, quantos são bacharéis?
Luis , 17 Maio 2013 | url
...
Nenhum deles com menos do 11º ou 12º ano, e uma boa parte já licenciados!!!
Jurista , 17 Maio 2013
...
Acho que se mantém essa premissa, o 11º ou 12º ano. De todos os funcionários com que me tenho cruzado nenhum era licenciado aquando a ingressão, muitos licenciaram-se, e bem, já no decorrer da sua atividade profissional. Chegou ao meu conhecimento que alguns destes "cozinheiros" e "motoristas" (profissões que fui educado a respeitar, tal como médico, mecânico e até Jurista) até são licenciados, vários em direito até.. Pormenores!
Sem titulo académico, só nome. João , 18 Maio 2013
...
Sou oficial de justiça e tenho com habilitações literárias o 12.º ano de escolaridade. Desde já aqui afirmo que bacharelato/licenciatura não é, de todo, sinónimo de competência, dedicação, brio profissional ou profissionalismo. É bom relembrar como são concluídas algumas licenciaturas neste País (Relvas, Sócrates, são só os casos mais mediáticos), bem como não é bom esquecer uma universidade que existia ali para os lados da Figueira da Foz onde se tiravam cursos de Direito "às três pancadas". Digo isto por experiência profissional que eu tenho do dia-a-dia, porque nada tenho contra essas pessoas.
Analfabeto , 18 Maio 2013
Para o ANALfabeto
Tomara tu teres o curso de Direito tirado ali para os lado da Figueira da Foz... Enfim.. Azia...
Para o ANALfabeto , 20 Maio 2013 | url
Esclarecimentos
Gostaria de esclarecer alguns pontos desta notícia:
1º - Não existem dois concursos, mas um só, com dois momentos de admissão.
2º - Os candidatos têm vínculo à função pública exercendo as mais variadas funções, e estão aptos a candidatarem-se para exercer as funções de oficiais de justiça de acordo com o seu estatuto. Art.ºs 7º e 8º, capítulo II, secção I, subseção I, - http://www.verbojuridico.com/d...ca2008.pdf
3º - A formação de três meses, não é extraordinariamente relâmpago, pelo menos nos últimos 14 anos o período de estágio foi sempre este.
4º - O que nos parece é que existe um incumprimento do protocolo estabelecido entre o MJ e o ME relativamente ao ingresso dos licenciados pela Universidade de Aveiro, mas isso são contas de outro rosário que tem que ser resolvido em sede própria e não colocar ao barulho estas pessoas que estão a estagiar e aqueles que já exercem funções há cerca de 5 anos nas serectarias judiciais, e que irão contribuir de uma forma positiva para o bom funcionamento dos Tribunais. Nesta situação existem lobbies de que o SOJ faz parte, caso contrário não haveria esta guerra tão cerrada contra este concurso que irá ser uma gota de água para as necessidades dos Tribunais, mas ainda assim necessária. O SOJ está a criar uma onda de desestabilização. Não nos parece ser este o caminho.
Oficial de Justiça , 20 Maio 2013 | url
comentario

É triste saber que o curso profissional Serviços Juridicos de nada vale, agora é só licenciados........
Eu tenho a formação de 3 anos e eu como muitos colegas estivemos nos tribunais durante 3 anos, mas parece que nada serviu, tiveram mão de obra barata mas muito eficiebte e eficaz, é com muitas pena que este país continue a desperdiçar, como sempre faz
sonia , 20 Maio 2013 | url
ressalvo o já descrito pela minha colega Sónia
Pelo título, será escusado adiantar muito mais.
Eu também faço parte dos alunos do Curso Técnico de Serviços Jurídicos, e de igual modo estive durante três anos a contrato a termo certo a exercer funções de Oficial de Justiça no Tribunal de Comarca de Sintra, hoje designado por Tribunal da Comarca Grande Lisboa Noroeste, isto faz um total de 6 anos de experiência nesta área.
Compreendo perfeitamente que o Estado Social atravessa uma crise, mas no meu mais sensato entender, suponho que não será com esta mobilidade que se fará a "devida Justiça", pois o que o país necessita neste momento é de jovens ambiciosos, e com muita energia para dar.
Como eu, há neste momento dezenas, centenas, quiça milhares de alunos tanto do Curso Técnico como do Curso Superior desempregados, ou com trabalhos precários, rezando todos os dias para que a Ministra se digne a abrir concurso externo.
Mais relevo, a existência de um concurso externo já aberto em 2009, de onde entraram 200 de 314 aprovados.
Comecem por colocar esses 114 diamantes já lapidados que farão logo muita diferença, tal como os 130 que entraram em 2008 com contratos precários fizeram.
Bem Haja a todos.
Nelson Alves
Nelson Alves , 21 Maio 2013 | url

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