Crime. Atualmente estão pendentes três mil análises, menos oito mil do que há cinco anos. As mais demoradas poderão bloquear os processos que deveriam ser resolvidos em quatro meses.
O homicida do Fundão, que em meados de abril matou a mulher à paulada, foi um dos primeiros arguidos acusado de um crime violento a ser julgado em processo sumário. Ou seja: casos em que a sentença deverá ser conhecida no prazo limite de quatro meses.
Mas se a primeira sessão de julgamento de Manuel Ramalho teve lugar 15 dias após o crime - 2 de maio - a segunda esperará quase um mês (está marcada para dia 28). A razão foi explicada pelo Tribunal do Fundão: o Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária (LPCPJ) não consegue apresentar o resultado das perícias mais cedo.
A verdade é que o tempo de análise da prova - ainda mais nos casos em que possa estar contaminada, ou seja, adulterada - poderá vir a ser uma "força de bloqueio" na concretização das leis penais. Desde final de março que o Código Penal prevê que os crimes em flagrante delito, ou quase, terão de ser julgados em processo sumário, independentemente da moldura penal do crime em questão ser inferior ou superior a cinco anos.
"Nos casos em que as perícias sejam mais exigentes ou em que a prova venha contaminada, pode acontecer", explicou ao DN Duarte Nuno Vieira, presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML). Anualmente, o instituto recebe cerca de 200 mil perícias. O médico aponta, por exemplo, os casos dos métodos de "análise de fragmentos de órgãos em que aí já será totalmente impossível ter resultados rápidos". E que, assim sendo, irão atrasar os julgamentos que se querem céleres.
No LPCPJ são os exames de escrita manual que mais "dores de cabeça" dão aos peritos forenses. "Se na droga e na balística, por exemplo, temos resultados excelentes", adiantou Carlos Farinha, diretor do laboratório da PJ, "no caso de análise de escrita manual, temos muitos atrasos". Mas, lembra que houve uma melhoria desde há três anos. Carlos Farinha acrescenta que as análises toxicológicas (veneno num cadáver, por exemplo), as documentais e as análises químicas (como decifrar a composição de um spray) são as perícias resolvidas mais rapidamente. Ou seja: muitas no prazo de 48 horas ou 15 dias.
"Mas convenhamos que em casos de flagrante delito não existe a mesma necessidade de prova, nem de reproduzir toda a factualidade", acrescentou.
Duarte Nuno Vieira sublinha que, mesmo nos casos de atrasos, "o juiz é o perito dos peritos, por isso pode sempre prescindir da prova". E se em 2008 o número de perícias à espera de resultados chegava aos 11 mil, atualmente são "apenas" três mil casos. No ano passado, o LPCPJ realizou 32 702 perícias, mais 2500 do que no ano anterior. Duarte Nuno Vieira acrescenta que, em média, 98% das perícias são resolvidas no prazo previsto pelas "boas práticas forenses europeias". Ou seja: 90 dias.
Fonte da Procuradoria-Geral distrital de Lisboa admite que "as perícias, sejam médico-legais ou de outro tipo como falsificações de CD ou filmes ou peritagens a máquinas de jogo ilícito, pode dificultar e até bloquear o processo sumário", explica. "Já para não falar em perícias financeiras/contabilísticas ou informáticas que são muito demoradas..." concluiu.
4 PERGUNTAS A... CARLOS FARINHA
Diretor do Laboratório de Polícia Científica
- A demora de algumas perícias é compatível com os prazos dos julgamentos sumários?
- Os resultados das perícias são muito mais céleres do que há três/quatro anos. Há casos em que se consegue ter um exame pronto ao fim de 48 horas ou mesmo de 15 dias... E até aqui já fazíamos prova para crimes em processo sumário com pena de prisão até cinco anos.
- Mas em tempo útil?
- Sim. Há três anos, o Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária celebrou um protocolo com as várias procuradorias distritais - de Lisboa, Coimbra e Porto - em que se incentivava o cumprimento das perícias de crimes sumários em tempo útil. Oito dias consecutivos ou cinco dias úteis.
- Mas neste caso temos processos sumários para uma lista de crimes mais abrangentes e mais graves...
- É claro que isto obriga a alguma pressão da nossa parte. Mas se fosse há uns três anos seria muito mais complicado... com a redução de perícias pendentes, o cenário mudou.
- E o que mudou exatamente?
- Um maior empenho das pessoas, a simplificação de um conjunto de procedimentos, quer internos aqui no Laboratório quer externos. E houve igualmente uma aposta para uma melhor articulação entre quem precisa das perícias e quem as faz. Ou seja: entre os tribunais e a Polícia Judiciária, PSP, GNR e o Instituto Nacional de Medicina Legal.
Filipa Ambrósio de Sousa | Diário de Notícias | 14-05-2013
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