O Estado português pagou, nos últimos três anos, mais de 10 milhões de euros em multas por atrasos na justiça. O valor resulta, segundo dados do Ministério da Justiça, de 85 processos que culminaram em condenação por parte do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (35) ou em acordo entre as partes (50).
Perícias que demoram, julgamentos que se arrastam e sentenças que tardam são os problemas mais comuns.
A discussão sobre a lentidão na justiça é tão antiga como a própria. Há cerca de três semanas, durante uma audição parlamentar de membros do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), a propósito da reforma do Código de Processo Civil, o tema ressurgiu, mas centrou-se depressa na questão dos atrasos das sentenças.
Em causa está uma alteração que prevê que os atrasos superiores a 10 dias, em relação à data esperada, sejam comunicados ao juiz presidente e, depois, ao Conselho Superior da Magistratura (CSM). Na audição, a procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, sugeriu que fosse introduzido "um mecanismo de maior sanção disciplinar quando os juizes não cumprissem prazos além dos três ou seis meses".
Na mesma ocasião, a PGR e os membros do CSMP defenderam que os 10 dias previstos podem ter um efeito perverso, inundando o CSM de inquéritos e desvalorizando os casos mais graves.
As palavras da procuradora-geral causaram algum desconforto junto dos juizes. "Não nos opomos a esse princípio de responsabilização. De resto, já existe para juizes e funcionários judiciais. Mas não existe para os magistrados do Ministério Público", disse ao Expresso Mouraz Lopes, presidente da Associação Sindical dos Juizes. "0 que está em discussão é saber o que é um prazo razoável e que efeitos pode ter a questão dos 10 dias".
Mouraz Lopes reconhece que há problemas com atrasos nas sentenças, mas sublinha que não são os únicos. "Por vezes, as partes tem interesse em que o processo se arraste. As próprias perícias causam atrasos".
A base do atual Código de Processo Civil português remonta a 1939. Em dezembro, a Fundação Francisco Manuel dos Santos divulgou um estudo de 850 páginas em que se defendia a revogação do código — considerado demasiado complexo, demasiado rígido, muito afastado do cidadão e das empresas e desfasado da realidade económica. "Mesmo que as ideias de reforma sejam boas, tememos que tudo se mantenha na mesma", admitiu, na altura, ao Expresso Mariana França Gouveia, uma das autoras do trabalho.
Os números a que chegaram os investigadores ajudam a traçar o retrato do processo civil: o adiamento de uma audiência representa um acréscimo de 89 dias no processo. Um incidente adicional implica mais 317 dias e uma prova pericial pode acrescentar mais 220. "Os atrasos têm custos", afirmou na audição parlamentar de fevereiro o deputado do PSD Carlos Peixoto, numa alusão às conclusões do estudo. "O Estado tem de pagar pelos atrasos na resolução dos processos".
0 ano mais caro do último triénio foi 2010, com as multas aplicadas pelo Tribunal Europeu e os acordos a somarem 4,9 milhões de euros. No ano seguinte, os custos rondaram os 4,2 milhões e em 2012 a conta veio em 1,2 milhões de euros. Ao contrário, e analisando os processos pendentes, verifica-se que, dos 44, sete entraram em 2010, 10 em 2011 e 27 no ano passado.
"Há uma tendência de subida nas queixas para o tribunal europeu, que não deverá alterar-se", admite uma fonte parlamentar, que solicitou anonimato. O Governo espera que o novo Código de Processo Civil entre em vigor em setembro.
Ricardo Marques | Expresso | 09-03-2013
Comentários (5)
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3 anos, 4 anos, ... não é?
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A causa das coisas
JÁ AGORA: os países centrais e desenvolvidos da Europa são condenados mais vezes do que POrtugal pelas mesmas razões. O problema não é, no essencial, pois, «nacional».
Reflita-se sobre os dados. Não se limitem a engoli-los sem sequer os «mastigar»...
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