O novo presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), juiz conselheiro Henriques Gaspar, disse hoje que a justiça "sofre a crise e as consequências das perturbações da economia", não estando demonstrada qualquer relação entre esta e o crescimento económico.
"A justiça não fez a crise; bem ao contrário, sofre a crise e as consequências das perturbações da economia; tendo a função de definir direitos, não pode inventar valor onde valor não exista", disse Henriques Gaspar, no seu discurso de tomada de posse.
O novo presidente do STJ adiantou que "a relação de causalidade direta ou quantificada entre a justiça e o crescimento económico não está demonstrada".
No seu discurso, Henriques Gaspar tentou desfazer estereótipos "progressivamente instalados", nomeadamente no que toca às relações entre a justiça e o crescimento económico e a questão da morosidade da justiça.
"Num sistema de valores, as decisões judiciais não são determinadas pelas consequências que possam ter na economia; a justiça não é consequencialista; é deontologista", sublinhou.
Henriques Gaspar adiantou que, "em geral, as instituições da justiça, e especificamente os tribunais, respondem razoavelmente no plano sistémico, e estudos comparados revelam resultados que se situam na média dos parâmetros europeus".
Reconheceu, no entanto, que "existem casos problemáticos de não respeito pelo prazo razoável, que não têm justificação e afetam a imagem interna e externa" da justiça.
"Há que reconhecer também que, não obstante os resultados positivos deste ano, a ação executiva assume uma dimensão quantitativa que esmaga o sistema; e que são acentuadas as dificuldades em processos de insolvência e de liquidação", destacou no seu discurso.
Nesse sentido, concluiu que "boa parte das representações e perceções negativas que afetam a confiança na justiça, são muito provavelmente induzidas por mediações exógenas".
Henriques Gaspar, que vai estar à frente do STJ durante cinco anos, adiantou que "é cada vez mais necessário reforçar a imagem da justiça", sendo "urgente trazer de novo o rigor, a cultura, a pedagogia e a inteligência à formação da opinião sobre a justiça".
"Para tanto, a prestação de contas, tantas vezes apontada como deficitária, pode contribuir para acrescentar confiança", referiu, esclarecendo que a "prestação de contas" deve estar relacionada com o "sistema e condições de funcionamento" e "não tem por objeto a discussão sobre decisões concretas".
O novo STJ disse igualmente que a justiça deve estar sujeita "à discussão pública" e "à crítica", que devem ter "por objeto a valoração dos fundamentos e do rigor da argumentação", que, por vezes, são "afrontosos".
"A legítima -- e necessária -- discussão das decisões dos tribunais terá como limite a desconsideração gratuita, e deve respeitar também as exigências impostas pelo núcleo essencial do princípio da separação de poderes, constitutivo do sistema democrático", sustentou.
No seu discurso de tomada de posse, Henriques Gaspar considerou também que "o Estado e as suas instituições fundamentais, particularmente a instituição judicial, não são, nem podem ser tratados, como empresas em regime de mercado".
"Mesmo nas conceções ideológicas do Estado mínimo, a justiça tem de estar do lado do melhor Estado; Estado mínimo exige justiça máxima", acrescentou.
O juiz conselheiro Henriques Gaspar tomou hoje posse como presidente do STJ para um mandato de cinco anos, sucedendo no cargo a Noronha Nascimento.
Lusa / DN | 12-09-2013
Comentários (7)
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Não é esse o caminho!
Se dúvidas existissem sobre a permeabilidade entre as duas realidades basta verificar a ineficácia do mesmo sistema de Justiça no que toca à criminalidade económica e financeira com reflexo num sentimento de impunidade que assola o País
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Em suma o que o ilustre Presidente do Supremo Tribunal de Justiça pretendeu dizer é que a ineficiência do sistema de justiça não pode ser assacado aos operadores judiciários (maxime Tribunais e MP) mas sim à legislação absurda e gradual empobrecimento do judiciário (o que, naturalmente, é da responsabilidade do poder político).
Por outro lado, existindo crise económica o supra referido agrava-se e a Justiça, mais uma vez, sai duplamente penalizada quer pelos diversos cortes (que desanimam as pessoas que trabalham no sector) quer pelo clima de confronto e instabilidade que se instala.
Resumindo e concluindo, que eu saiba não se fazem omoletes sem ovos e, assim sendo, que motivação e instrumentos são fornecidos pelo poder político para um aumento da eficiência do judiciário a que se refere ?
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O Sr Presidente do STJ, quando falou, esqueceu-se de que os tribunais tb têm uma tarefa essencial em tudo isto (incluindo o conferir efeito útil a leis propositadamente mal redigidas para não passarem de meramente platónicas em vez de, cobardemente, culparem o legislador - QUE É CULPADO - por fazer más leis).
Sistemas
Frederico Nietzsche
«sistema s.m. 1 conjunto de elementos concretos ou abstractos, intelectualmente organizado », in Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa
Para o matemático, o sistema representa muito mais do que para o filólogo. Se o sistema «é um conjunto de elementos concretos ou abstractos intelectualmente organizado» , existe uma razão para que o homem agarre uma parte da realidade – um conjunto de seres – os junte, os intelectualize e os coloque ao seu serviço. O conjunto dos seres vale como novo ser, relaciona-se com a realidade circundante como um todo coerente e tem um propósito justificativo da sua existência, tal como qualquer ser singular. No sistema cada ser deixa em parte de o ser, para ser parte de um novo ser – o sistema. Assim sendo, o sistema jamais deve ser visto como algo de substantivo .
Em Portugal, sistema é algo de misterioso que salda a inoperância com que os portugueses resolvem os seus problemas. Sempre que alguém não está a ser bem-sucedido, há sempre um sistema, o qual na maioria dos casos e sobretudo no «mundo do futebol», é controlado por alguém que não se nomeia, mas que se subentende. Repare-se, quando alguém é questionado sobre a saúde, a educação, a justiça, o futebol e outras áreas do nosso quotidiano, desata a falar no sistema. E quando se fala da justiça? A cada duas três palavras surgem expressões como sistema judicial ou sistema judiciário. No entanto, se pedirem a essa pessoa para identificar e caracterizar esse sistema, de que supostamente fala, ela será incapaz de o fazer. Em primeiro lugar porque não sabe o que é um sistema e, em segundo lugar porque não consegue isolar a realidade sobre a qual está a falar e estabelecer a sua ligação com as realidades circundantes. Em síntese, há uma incapacidade de conceptualizar em sistema, de forma a reflectir sobre essa realidade e suas ligações com o envolvimento exterior, no âmbito duma análise sistémica. Portanto, podemos afirmar quando algum jurista utiliza a expressão: «é a prova que o sistema funciona», a propósito dum qualquer recurso para o Tribunal Constitucional, não sabe do que está falando. Como igualmente não sabem do que estão falando os peritos que repetidamente nos são apresentados nos debates públicos feitos na comunicação social. Quando estão em causa acusações a pessoas das área do poder, a maioria dos recursos dirigidos ao Tribunal Constitucional, utilizados nos tribunais judiciais portugueses, servem o objectivo de fazer atrasar o processo, quando a pessoa sobre quem recaem acusações está em liberdade, ou então, minar as instruções até encontrar a decisão conveniente quando está detido preventivamente, a fim de sair da prisão preventiva. Grande parte dos acórdãos do Tribunal Constitucional é constituída por acções perversas e parasitárias de enfraquecimento do sistema judicial, uma vez que os diferentes sistemas de fiscalização concreta e concentrada de legalidade e constitucionalidade têm como propósito a destruição das decisões – outputs – do sistema judicial. São neutros, inócuos e inúteis, quando não alteram e, muito pior, são destrutivos quando alteram.
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