Um homem que gritou durante as cerimónias do 10 de Junho, em Eivas, "vai mas é trabalhar" na direção do Presidente da República foi imediatamente identificado pela polícia e, já ontem, condenado em tribunal a pagar uma multa de 1300 euros. Carlos Costal, detido no 10 de Junho por ter mandado o Presidente "trabalhar", diz estar a ser alvo de um processo "exemplar", mas tem "fé" de que Cavaco ainda interfira no caso.
"De forma alguma quis difamar o Presidente da República, nem tive intenção de me referir à sua pessoa. Fiz um desabafo político, fruto do momento que o País vive. Quis demonstrar que não estou contente com as políticas atuais. Não fui agressivo para ninguém. Só disse 'Vai mas é trabalhar!' e que me sentia roubado." As palavras pertencem a Carlos Costal, 25 anos, que foi detido após as comemorações do 10 de Junho, em Eivas, e julgado no dia útil seguinte, ou seja, na terça-feira.
O residente em Campo Maior revelou ao DN que fez uma "deslocação lúdica com a família" para ver uma exposição e que, no local, agiu "espontaneamente", motivo também pelo qual considera a multa de 1300 euros – à razão de 6,50 euros/dia num total de 200 dias -, decretada pelo Tribunal de Ervas, "bastante pesada".
"Para já, apuraram esse valor, mas ainda falta adicionar as custas judiciais. Pressuponho que o tribunal me dê a possibilidade de efetuar o pagamento faseadamente, porque é uma quantia superior ao meu ordenado. Teria de fazer uma enorme ginástica e várias escolhas para conseguir pagar a multa. Mas tenho fé que o senhor Presidente reveja toda a situação, a analise bem e interfira no sentido de que o processo seja arquivado", frisou Carlos Costal, que admite estar a ser tratado como um "caso exemplar", para dissuadir outras iniciativas de protesto.
"Estavam 2000 pessoas a chamar nomes e identificaram mais alguém? De Norte a Sul, está na moda vaiar e ofender as mais altas instâncias e o que é que acontece a essas pessoas? Eu sou o 'Zé da esquina' e vejo que grandes tubarões cometem infrações idênticas e não sofrem nada. Há dois pesos e duas medidas", explicou sem querer referir-se concretamente ao caso de Miguel Sousa Tavares – chamou "palhaço" a Cavaco Silva em entrevista ao Jornal de Negócios. "As pessoas que produziram declarações com caráter ofensivo estão tranquilamente em casa, a ver a banda passar", lamentou ainda.
Identificação e polícia à paisana Carlos Costal não se conforma com a decisão judicial que lhe foi imposta e sustenta mesmo que está a ser tratado "como um criminoso", até pela celeridade com que o processo foi conduzido. Mas aquilo que, segundo salientou ao DN, o indignou mais foi o comportamento das forças de segurança do chefe de Estado, bem como da própria PSP.
"Enquanto lá estava a comunicação social, as coisas foram tratadas muito discretamente. Só se aproximou um senhor – que eu vim a saber que era um agente policial à paisana – que me aconselhou a ter calma. Depois de a comitiva presidencial ter passado, esse mesmo senhor pediu-me a identificação, que eu tinha deixado no carro. Desloquei-me ao carro e aí, já longe de tudo e todos, disseramme que estava detido, por indicação de alguém da segurança do Presidente", contou.
A juntar a isto, Carlos Costal salientou a "vergonha" que sentiu por ter sido detido diante dos próprios filhos e lembrou que esteve perto de três horas na esquadra de Eivas à espera de uma "indicação" de alguém afeto à segurança de Cavaco Silva para saber se o caso terminaria com a sua identificação ou se seguiria para julgado.
CASOS
Protestos, "palhaço" e o agravamento legal
Mesmo tendo ensaiado um discurso agregador e apelado à "coesão nacional em tempos difíceis", o Presidente não se livrou de uma monumental vaia em Eivas, nas comemorações do 10 de Junho. Cerca de 2000 pessoas assobiaram e ofenderam Cavaco Silva, algo que tem vindo a suceder também com membros do Governo. Já no dia 24, Miguel Sousa Tavares – que reconheceu ter-se excedido chamara"palhaço" ao chefe de Estado, o que motivou a abertura de um processo da Procuradoria-Geral da República. Refira-se ainda que o Código Penal, no artigo 328.°, prevê que injuriar ou difamar o PR pode valer até três anos de prisão.
Octávio Lousada Oliveira | Diário de Notícias | 13-06-2013
Comentários (10)
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José Pedro Faria (Jurista) - Algo mais se deve ter passado
Portanto, deve ter acontecido mais qualquer coisa que não consta deste texto.
Ademais os tribunais têm sido frequentemente tolerantes com a crítica política (por vezes altamente verrinosa, no limite da injúria).
Recordo aqui algumas palavras do colendo Conselheiro Alves Velho (em acórdão do STJ), que apontei em bloco de notas eletrónico:
Como é sabido e geralmente aceite, os cidadãos que exercem cargos públicos, nomeadamente políticos, como os exercidos pelas Partes neste processo, estão sujeitos à crítica, quer das colectividades pela satisfação de cujos interesses devem pautar o exercício das respectivas funções, quer dos titulares de entidades que tutelem interesses conflituantes, do ponto de vista da sua própria perspectiva de satisfação do bem comum.
(…) [a]s pessoas que ocupam lugares de relevância política ou altos cargos na administração pública estão sujeitas a figurar como alvos de mais e de mais intensas críticas que os demais cidadãos, provenham elas de seus pares ou não.
Em democracia, a tutela da honra pessoal e reputação dos políticos é, por isso, também menos intensa que a dos cidadãos em geral" (sublinhado meu). Respeitei a ortografia original.
Portanto, repito, algo mais deve ter sucedido, porque se tivesse sido só aquilo que está em causa nesta notícia, podem ter a certeza que eu, se pudesse (i.e. se a função pública não fosse incompatível com o exercício de advocacia - é a tal "igualdade" com os privados), eu próprio tomaria a iniciativa de prestar auxílio jurídico gratuito a este cidadão.
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Acredito que a condenação não foi por essa expressão.
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Ainda por cima um jornalismo medíocre.
A história, manifestamente mal contada, do passeio lúdico a Elvas, para ver uma exposição, que originou uma malvada coincidência de presenças, no mesmo local e hora, deste arguido e do PR, e a sua espontaneidade ao gritar, obviamente apenas "vai trabalhar", já toma o leitor por estúpido.
Pressupor e escrever que foi apenas isto que motivou a condenação é tomar por estúpido o próprio Juiz que lavrou a sentença.
Querer que acreditemos nisso é, declaradamente, chamar-nos estúpidos.
Ora, seja o que for que o sujeito tenha dito, que o jornalista devia ter averiguado, parece-me mais grave o jornalista insinuar, sem que nada suceda, que o Tribunal agiu mal e nós somos todos idiotas.
Parece que, para além de certos malcriados, também alguns jornalistas têm de começar a ser exemplarmente punidos. Liberdade de imprensa não significa protecção da bacorada jornalística.
Ministério Público pede nulidade de julgamento que determinou multa de 1.300 euros
Por que não dar o benefício da dúvida ao Jornalista? É certo que na comunicação social a desinformação, em matérias do foro, é frequentíssima. Mas não vamos dizer que é o Jornalista que fez mal o seu trabalho sem provas concretas disso. Também não vamos dizer que é o Juiz sem termos provas disso. Aguardemos pois, serenamente.
Talvez esta notícia tenha relevo: "Ministério Público pede nulidade de julgamento que determinou multa de 1.300 euros por insultos a Cavaco Silva"
«“O Ministério Público requereu a declaração de nulidade insanável da audiência de julgamento realizada em processo sumário pelo crime de ‘Ofensa à Honra do Presidente da República’, por não ser admissível, no caso deste crime, o uso daquela forma processual, nos termos do artigo 381.º, n.º 2, do Código de Processo Penal”, refere uma nota enviada à comunicação social pela Procuradoria-Geral da República.»
No Jornal de Negócios.
(Não faço ideia se o MP tem razão. Não tenho comigo aqui o CPP.)
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É a cultura portuguesa, da doutorice, dos venerandos, mui ilustres, dos presidentes de ..., ministros. O resto são os ignorantes. Está passar a pouco e pouco com o boom da educação; cada vez mais iguais e mais interventivos os jovens. Se me lembro do presidente de uma câmara à janela: "meu povo" e os idiotas todos em baixo à espera dele para o venerar.
Parecia a america latina, mas não, é Portugal.
Os Cavacos ainda pensam que continuamos a ser idiotas, a bajular os funcionários do estado.
Esta gente que vive de poderes públicos tem de se sujeitar ao que o povo diz e pensa: afinal quem paga manda.
O tempo dos poderes públicos que pensam que nos dão favores está a acabar.
Mas ainda há que dê trabalho aos Tribunais para entreter os funcionários com "p******os" e "vai trabalhar".
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