In Verbis


icon-doc
REVISTA DE 2013

Justiça condena em apenas dois dias por difamar Cavaco Silva

  • PDF

Um homem que gritou durante as cerimónias do 10 de Junho, em Eivas, "vai mas é trabalhar" na direção do Presidente da República foi imediatamente identificado pela polícia e, já ontem, condenado em tribunal a pagar uma multa de 1300 euros. Carlos Costal, detido no 10 de Junho por ter mandado o Presidente "trabalhar", diz estar a ser alvo de um processo "exemplar", mas tem "fé" de que Cavaco ainda interfira no caso.

"De forma alguma quis difamar o Presidente da República, nem tive intenção de me referir à sua pessoa. Fiz um desabafo político, fruto do momento que o País vive. Quis demonstrar que não estou contente com as políticas atuais. Não fui agressivo para ninguém. Só disse 'Vai mas é trabalhar!' e que me sentia roubado." As palavras pertencem a Carlos Costal, 25 anos, que foi detido após as comemorações do 10 de Junho, em Eivas, e julgado no dia útil seguinte, ou seja, na terça-feira.

O residente em Campo Maior revelou ao DN que fez uma "deslocação lúdica com a família" para ver uma exposição e que, no local, agiu "espontaneamente", motivo também pelo qual considera a multa de 1300 euros – à razão de 6,50 euros/dia num total de 200 dias -, decretada pelo Tribunal de Ervas, "bastante pesada".

"Para já, apuraram esse valor, mas ainda falta adicionar as custas judiciais. Pressuponho que o tribunal me dê a possibilidade de efetuar o pagamento faseadamente, porque é uma quantia superior ao meu ordenado. Teria de fazer uma enorme ginástica e várias escolhas para conseguir pagar a multa. Mas tenho fé que o senhor Presidente reveja toda a situação, a analise bem e interfira no sentido de que o processo seja arquivado", frisou Carlos Costal, que admite estar a ser tratado como um "caso exemplar", para dissuadir outras iniciativas de protesto.

"Estavam 2000 pessoas a chamar nomes e identificaram mais alguém? De Norte a Sul, está na moda vaiar e ofender as mais altas instâncias e o que é que acontece a essas pessoas? Eu sou o 'Zé da esquina' e vejo que grandes tubarões cometem infrações idênticas e não sofrem nada. Há dois pesos e duas medidas", explicou sem querer referir-se concretamente ao caso de Miguel Sousa Tavares – chamou "palhaço" a Cavaco Silva em entrevista ao Jornal de Negócios. "As pessoas que produziram declarações com caráter ofensivo estão tranquilamente em casa, a ver a banda passar", lamentou ainda.

Identificação e polícia à paisana Carlos Costal não se conforma com a decisão judicial que lhe foi imposta e sustenta mesmo que está a ser tratado "como um criminoso", até pela celeridade com que o processo foi conduzido. Mas aquilo que, segundo salientou ao DN, o indignou mais foi o comportamento das forças de segurança do chefe de Estado, bem como da própria PSP.

"Enquanto lá estava a comunicação social, as coisas foram tratadas muito discretamente. Só se aproximou um senhor – que eu vim a saber que era um agente policial à paisana – que me aconselhou a ter calma. Depois de a comitiva presidencial ter passado, esse mesmo senhor pediu-me a identificação, que eu tinha deixado no carro. Desloquei-me ao carro e aí, já longe de tudo e todos, disseramme que estava detido, por indicação de alguém da segurança do Presidente", contou.

A juntar a isto, Carlos Costal salientou a "vergonha" que sentiu por ter sido detido diante dos próprios filhos e lembrou que esteve perto de três horas na esquadra de Eivas à espera de uma "indicação" de alguém afeto à segurança de Cavaco Silva para saber se o caso terminaria com a sua identificação ou se seguiria para julgado.

CASOS

Protestos, "palhaço" e o agravamento legal
Mesmo tendo ensaiado um discurso agregador e apelado à "coesão nacional em tempos difíceis", o Presidente não se livrou de uma monumental vaia em Eivas, nas comemorações do 10 de Junho. Cerca de 2000 pessoas assobiaram e ofenderam Cavaco Silva, algo que tem vindo a suceder também com membros do Governo. Já no dia 24, Miguel Sousa Tavares – que reconheceu ter-se excedido chamara"palhaço" ao chefe de Estado, o que motivou a abertura de um processo da Procuradoria-Geral da República. Refira-se ainda que o Código Penal, no artigo 328.°, prevê que injuriar ou difamar o PR pode valer até três anos de prisão.

Octávio Lousada Oliveira | Diário de Notícias | 13-06-2013

Comentários (10)


Exibir/Esconder comentários
José Pedro Faria (Jurista) - Algo mais se deve ter passado
Muito mal iria a magistratura se alguém fosse condenado por gritar "vai mas é trabalhar!", ainda para mais num contexto de desabafo inserido num clima de forte convulsão política, e de pré-catástrofe social decorrente de uma desgovernação e incompetência gritantes por parte do atual poder político.

Portanto, deve ter acontecido mais qualquer coisa que não consta deste texto.

Ademais os tribunais têm sido frequentemente tolerantes com a crítica política (por vezes altamente verrinosa, no limite da injúria).

Recordo aqui algumas palavras do colendo Conselheiro Alves Velho (em acórdão do STJ), que apontei em bloco de notas eletrónico:

Como é sabido e geralmente aceite, os cidadãos que exercem cargos públicos, nomeadamente políticos, como os exercidos pelas Partes neste processo, estão sujeitos à crítica, quer das colectividades pela satisfação de cujos interesses devem pautar o exercício das respectivas funções, quer dos titulares de entidades que tutelem interesses conflituantes, do ponto de vista da sua própria perspectiva de satisfação do bem comum.
(…) [a]s pessoas que ocupam lugares de relevância política ou altos cargos na administração pública estão sujeitas a figurar como alvos de mais e de mais intensas críticas que os demais cidadãos, provenham elas de seus pares ou não.
Em democracia, a tutela da honra pessoal e reputação dos políticos é, por isso, também menos intensa que a dos cidadãos em geral"
(sublinhado meu). Respeitei a ortografia original.

Portanto, repito, algo mais deve ter sucedido, porque se tivesse sido só aquilo que está em causa nesta notícia, podem ter a certeza que eu, se pudesse (i.e. se a função pública não fosse incompatível com o exercício de advocacia - é a tal "igualdade" com os privados), eu próprio tomaria a iniciativa de prestar auxílio jurídico gratuito a este cidadão.
José Pedro Faria (Jurista) , 13 Junho 2013
...
Registo as queixas quanto à celeridade do processo!
O Candidato , 13 Junho 2013
...
Dizer "Vai mas é trabalhar" não é crime e ponto final.

Acredito que a condenação não foi por essa expressão.
Contribuinte espoliado , 13 Junho 2013
...
Recuso-me a acreditar que tenha sido apenas por "Vai mas é trabalhar!" Se foi, fico de queixo caído.
Juiz de Direito , 13 Junho 2013
...
Detesto Cavaco mas não acredito que o arguido tenha sido condenado por dizer aquilo... quanto à celeridade, nada a assinalar: trata-se d eum processo sumário e isso é normal nessa forma de processo. Alguém está a querer confundir a opinião pública, só isso.
Sun Tzu , 13 Junho 2013
...
Existe hoje em Portugal um jornalismo que nos toma por parvos.
Ainda por cima um jornalismo medíocre.
A história, manifestamente mal contada, do passeio lúdico a Elvas, para ver uma exposição, que originou uma malvada coincidência de presenças, no mesmo local e hora, deste arguido e do PR, e a sua espontaneidade ao gritar, obviamente apenas "vai trabalhar", já toma o leitor por estúpido.
Pressupor e escrever que foi apenas isto que motivou a condenação é tomar por estúpido o próprio Juiz que lavrou a sentença.
Querer que acreditemos nisso é, declaradamente, chamar-nos estúpidos.
Ora, seja o que for que o sujeito tenha dito, que o jornalista devia ter averiguado, parece-me mais grave o jornalista insinuar, sem que nada suceda, que o Tribunal agiu mal e nós somos todos idiotas.
Parece que, para além de certos malcriados, também alguns jornalistas têm de começar a ser exemplarmente punidos. Liberdade de imprensa não significa protecção da bacorada jornalística.
Mário Rama da Silva , 14 Junho 2013
...
«decretada pelo Tribunal de Ervas,»

Bem me parece que anda ali erva a mais.
Zé da Laurinda , 14 Junho 2013
Ministério Público pede nulidade de julgamento que determinou multa de 1.300 euros
As pessoas são inocentes são presumidas inocentes até trânsito em julgado da sentença condenatória.

Por que não dar o benefício da dúvida ao Jornalista? É certo que na comunicação social a desinformação, em matérias do foro, é frequentíssima. Mas não vamos dizer que é o Jornalista que fez mal o seu trabalho sem provas concretas disso. Também não vamos dizer que é o Juiz sem termos provas disso. Aguardemos pois, serenamente.

Talvez esta notícia tenha relevo: "Ministério Público pede nulidade de julgamento que determinou multa de 1.300 euros por insultos a Cavaco Silva"

«“O Ministério Público requereu a declaração de nulidade insanável da audiência de julgamento realizada em processo sumário pelo crime de ‘Ofensa à Honra do Presidente da República’, por não ser admissível, no caso deste crime, o uso daquela forma processual, nos termos do artigo 381.º, n.º 2, do Código de Processo Penal”, refere uma nota enviada à comunicação social pela Procuradoria-Geral da República.»

No Jornal de Negócios.

(Não faço ideia se o MP tem razão. Não tenho comigo aqui o CPP.)
Gabriel Órfão Gonçalves , 14 Junho 2013
...
Que liberdade nesta democracia. Os Tribunais ajudam a festa dos politiqueiros. Em vez de proteger os mais fracos e os detentores da democracia e fragilizar quem é eleito perante o povo, é exactamente o contrário.

É a cultura portuguesa, da doutorice, dos venerandos, mui ilustres, dos presidentes de ..., ministros. O resto são os ignorantes. Está passar a pouco e pouco com o boom da educação; cada vez mais iguais e mais interventivos os jovens. Se me lembro do presidente de uma câmara à janela: "meu povo" e os idiotas todos em baixo à espera dele para o venerar.
Parecia a america latina, mas não, é Portugal.

Os Cavacos ainda pensam que continuamos a ser idiotas, a bajular os funcionários do estado.
Esta gente que vive de poderes públicos tem de se sujeitar ao que o povo diz e pensa: afinal quem paga manda.

O tempo dos poderes públicos que pensam que nos dão favores está a acabar.
Mas ainda há que dê trabalho aos Tribunais para entreter os funcionários com "p******os" e "vai trabalhar".
Cavenon , 14 Junho 2013
...
Algo mais se terá passado?
Sim!
Sem Dúvida!
Dois bófias paisanos com aspirações a pide!
E são esses que "fazem fé" no MP!
Ou anda a dar um ataque de coçeira cerebral aos distintos comentadores com o "algo mais"? Algo mais o quê? Alguém já ouviu falar?
Neo N , 15 Junho 2013 | url

Escreva o seu comentário

reduzir | aumentar

busy

Últimos conteúdos

A crise trouxe dúvidas novas sobre a situação do país e a actuação dos políticos. As televisões portuguesas responderam ...

Com o termo do ano de 2013, cessaram as publicações de conteúdos nesta Revista Digital de 2013.Para aceder aos conteúdos...


Isabel Moreira - Ouvindo e lendo as epifanias sobre o Tribunal Constitucional (TC) que descobriram ali um órgão de sober...

Últimos comentários

Tradução automática

Atualidade Tribunais Justiça condena em apenas dois dias por difamar Cavaco Silva

© InVerbis | 2013 | ISSN 2182-3138.

Arquivos

Sítios do Portal Verbo Jurídico