O valor a cortar na factura com a função pública representa 2172 milhões entre 2013 e 2014, o que equivale a 46,2% do total de 4700 milhões. Valor inclui saídas que não são compensadas com entradas.
Entre este ano e o próximo, o Governo vai ter de poupar um total de 4700 milhões de euros no âmbito da reforma do Estado, dos quais 46% incidem sobre a função pública.
De acordo com o memorando de entendimento entregue pelo executivo à troika de credores internacionais (FMI, BCE e Comissão Europeia) na sequência da sétima avaliação e divulgado nesta quinta-feira pelo FMI, neste ano haverá uma redução de despesa no valor de 1411 milhões de euros, seguida de nova redução de 3289 milhões de euros em 2014, com um forte ênfase nos cortes da função pública, em termos de funcionários e de salários.
Estes cortes, que somam 4700 milhões, incluem uma poupança de 479 milhões neste ano através de saídas de pessoal que não são compensadas com entradas. De acordo com fonte oficial do Ministério das Finanças, esta é uma medida já em curso, decorrente de um compromisso assumido anteriormente, e explica a diferença entre o total de cortes referidos neste relatório para 2013 e 2014 (4700 milhões) e o total que Passos Coelho referiu numa carta enviada à troika em Maio deste ano (cerca de 4300 milhões).
Questionado sobre se o Governo se comprometeu a antecipar em um ano, de 2015 para 2014, cortes no âmbito da reforma do Estado, o responsável do FMI para Portugal, Abebe Selassie, já tinha afirmado que os números não são exactamente comparáveis e garantiu que o FMI não pediu mais ajustamentos a Portugal. "Os números não são estritamente comparáveis. O Governo alterou o pacote de medidas, o cenário-base macroeconómico] também foi alterado. O ponto-chave é que não há ajustamento adicional a ser feito em 2014 nem em 2015. Nós não pedimos mais ajustamentos", explicou o responsável do FMI na missão da troika em Portugal, em conferência de imprensa telefónica, citado pela Lusa.
"As poupanças", refere o executivo, "vão ser geradas sobretudo pela limitação dos gastos com salários e pensões, que ascendem a quase 60% da despesa primária", através da adopção de "medidas que aumentem a equidade e a eficiência na provisão de transferências sociais e de serviços públicos".
Corte de 2172 milhões na função pública
Ao todo, o valor a cortar na factura com a função pública representa 2172 milhões entre 2013 e 2014, o que representa 46,2% da reforma a implementar. O maior impacto será sentido no ano que vem, com medidas sobre os funcionários públicos no valor de 1395 milhões. Este montante será atingido, de acordo com o Governo, através de mudanças nas tabelas salariais e suplementos remuneratórios (445 milhões), seguido pela convergência das regras de trabalho entre o sector público e privado, como o aumento do horário de trabalho (365 milhões). A não-renovação de contratos a prazo vale 214 milhões, as rescisões por mútuo acordo outros 252 milhões, a que se somam 119 milhões por via do sistema de requalificação (que substitui a mobilidade especial). Para as indemnizações, o Governo prevê gastar 507 milhões de euros, num custo extraordinário.
Para este ano, os cortes nas despesas com pessoal são de 777 milhões, ao incluir a poupança de 479 milhões por via das saídas que não são compensadas. Sem isso, contabiliza-se 122 milhões, por via da requalificação (48 milhões) e da não-renovação de contratos a prazo (74 milhões).
Pensões valem 1378 milhões
Para 2014, o Governo comprometeu-se a cortar 1378 milhões de euros nas despesas com pensões, mas este valor inclui a polémica taxa sobre os pensionistas que dividiu os partidos da coligação e que será implementada apenas se não forem encontradas medidas alternativas, no valor de 436 milhões. A convergência do sector público com o privado está avaliada em 672 milhões de euros, e o aumento previsto em um ano da idade da reforma sem penalizações, para os 66 anos, valerá 270 milhões de poupanças, de acordo com as contas do Governo.
Cortes por explicar
Ao nível dos ministérios, há neste ano uma diminuição das despesas intermédias (como consultoria, por exemplo) no valor de 284 milhões, mas ficam por explicar outros 50 milhões nesta rubrica. Da mesma forma, há 300 milhões inscritos nas poupanças para 2013 que também não são discriminados. No ano que vem, a diminuição das despesas intermédias passa a ser de 470 milhões de euros, totalizando assim 754 milhões. No entanto, há outros 50 milhões que também ficam por explicar. O relatório do FMI alerta ainda que a dívida pública pode chegar aos 140% do PIB e que o consenso político e social no país é "significativamente mais fraco".
Público | 13-06-2013
Comentários (1)
Exibir/Esconder comentários
José Pedro Faria (Jurista) - Filme de terror de Classe B
A dívida pública é crescente? Bom, então a solução consiste em reduzir salários da função pública, atacar as pensões, despedir trabalhadores públicos, criando uma situação própria de um filme de terror de Classe B, pleno de clichés, de receitas conhecidas e repetitivas, que transformam Portugal numa espécie de gigantesca Gower Street para consumo interno.
Estas considerações acerca da alegada "má gestão pública" não resistem a uma análise sumária.
A crise que vivemos hoje não tem a ver com o crescimento da dívida pública per se, mas antes com o descalabro da gestão privada, facilitada, é certo, pela desregulação do mercados. Mas mesmo esta foi opção de indivíduos ligados à gestão privada e que se dedicaram a gerir (da forma desastrosa que conhecemos) os destinos da coisa pública.
O que originou o aumento brutal das dívidas públicas europeias? Foi o sector público? Terão sido os salários dos trabalhadores públicos? Não. O que se passou foi que a iniciativa privada financeira, sob o beneplácito do ultraliberalismo dominante, criou uma multiplicidade de produtos e subprodutos financeiros (exemplos: ABS, CDO e, principalmente os desastrosos CDS (credit default swap),), sem qualquer base razoável de sustentação financeira, o que originou um monumental colapso de todo um sistema, assente que estava em pés de barro financeiro.
Quando se deu a crise do subprime nos EUA, as agência de rating, que sabiam perfeitamente que o sistema estava em vias de estoirar, continuavam, no entanto, a a atribuir notas máximas a diversas entidades. Exemplos: a AIG (a maior seguradora mundial) e o Banco Bear Strearns tinham notação máxima antes dos respetivos colapsos. Cerca de 10 minutos antes do Lehman Brothers anunciar a falência, ainda a este gigante da finança era atribuída a nota AA. incompetência? Evidentemente que não, o que acontece foi as agências de rating são tudo menos independentes, vivem do dinheiro que os seus grandes acionistas e clientes lhes pagam e da rede de interesses privados que as rodeiam.
Que fizeram os Estados na sequência desta catástrofe? Obrigaram os povos a pagar os resultados da irresponsabilidade da gestão (privada!) da banca. Obviamente as dívidas públicas aumentaram de forma astronómica. Quantos à maior parte dos banqueiros e outros financeiros responsáveis pela violenta crise financeira e económica que hoje vivemos, permaneceram incólumes, muitos deles foram mesmo promovidos, ocupando novos e importantes lugares de topo na finança mundial, sendo que alguns encontram-se mesmo colocados em postos que influenciam diretamente as políticas públicas europeias.
Gestão privada, melhor que a pública. É isto que não se cansa de repetir o inefável António Borges. É preciso reduzir o peso do Estado. É preciso despedir trabalhadores públicos. Pois é, nós percebemos. O Estado atrapalha. Antes conduzir um povo inteiro à miséria do que afrontar os interesses instalados que estão na origem da crise. Nada de falar de auditar a dívida pública, nada de falar de juros exorbitantes e usurários, nada de falar sobre a forma tecnicamente correta de abandonar de forma ordeira a Zona Euro, nada de democratizar as instituições europeias, nada de falar sobre o desastre das políticas de austeridade, cegas, estúpidas e incompetentes, nada de falar sobre o que realmente interessa.
O que é preciso é destruir o setor público. Rapidamente e em força. Infelizmente alguns filmes de terror de Classe B acabam muito mal para alguns dos "maus da fita", e tenho a sensação (pelo menos a esperança...) que este é um deles.
Escreva o seu comentário
< Anterior | Seguinte > |
---|