Procuradores e juízes, PSP e GNR todos se manifestam contra a intenção da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, de concentrar na Polícia Judiciária (PJ) as investigações que impliquem o recurso a escutas telefónicas. A proposta de revisão da Lei de Organização da Investigação Criminal obriga os restantes órgãos de polícia criminal a remeterem o caso à PJ em investigações em curso onde se conclua ser necessário recorrer àquele meio de obtenção de prova.
O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público arrasa o proposta de revisão, sublinhando que "discorda por completo" desta alteração. "Na prática, desestruturará a investigação criminal e afundará a PJ na investigação de pequenos crimes que ou ficarão sem investigação adequada ou atrasarão a investigação daqueles mais graves que já são sua competência", resume o SMMP, num parecer.
O sindicato sublinha que nos termos em que a proposta está redigida a competência reservada da PJ não inclui só os processos que impliquem escutas. "Todos os processos em que seja necessário obter um mero registo de uma telecomunicação - meio de obtenção de prova utilizado com frequência incomensuravelmente superior ao de intercepção e gravação de conversações ou comunicações - passarão a ser da competência reservada da PJ", notase no parecer do Ministério Público. E completa-se: "Uma de duas coisas acontecerá: se a PJ quiser prosseguir efectivamente a investigação em todos os inquéritos, todos demorarão muito mais tempo do que já demoram e todos ficarão prejudicados, principalmente os cidadãos neles envolvidos e o próprio país; se, compreensivelmente, quiser manter a prioridade dos inquéritos que já são hoje da sua competência - crimes mais graves e complexos - então serão os inquéritos que transitarão de outros órgãos de polícia criminal que ficarão parados".
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) é mais diplomática nos termos, mas acaba por levantar muitos dos problemas identificados pelos procuradores e admite que a mudança pode acabar por ser "contraproducente". "Uma lei de organização da investigação criminal não deve normativizar regras de controlo dos meios de obtenção de prova, nomeadamente das escutas telefónicas, na medida em que a salvaguarda dos direitos do arguido não depende da polícia que investiga (todas elas devem obediência à lei), mas sim do conjunto de garantias normativas consagradas na Constituição e no Código do Processo Penal", referem, por seu lado, os juízes no seu parecer. E questionam se, em determinadas situações, a transição do inquérito para a PJ não porá em causa a eficiência da investigação. "Quer por retirar processos a polícias que podem estar no terreno há meses, com várias diligências de investigação já praticadas, e se porventura em determinados casos não implicará cometer à PJ a investigação de crimes relativos à pequena criminalidade, o que poderá consubstanciar uma errática racionalização de meios humanos, técnicos e materiais", realça a ASJP.
Para o SMMP, esta proposta revela uma desconfiança injustificada sobre o trabalho da PSP, GNR e do SEF. O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, Paulo Rodrigues, concorda e considera que esta proposta "é um retrocesso completo sem qualquer benefício". O sindicalista diz que "isto é acabar com a investigação criminal" na PSP e na GNR e poderá ter efeitos perversos. "Para não perder alguns meses de trabalho, os agentes optarão por recorrer a outros meios de prova, como as buscas domiciliárias. Os inquéritos vão demorar mais tempo, sem terem garantias de sucesso". Já o presidente da Associação dos Profissionais da Guarda, César Nogueira, afirma que "jamais irá aceitar que retirem a investigação criminal à GNR", sublinhando que a polícia tem feito um bom trabalho nesta área. César Nogueira realça ainda que a PJ não tem efectivos suficientes para assumir um número tão grande de inquéritos.
O presidente da Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da PJ, Carlos Garcia, diz desconhecer a proposta, recusando, por isso, fazer comentários.
Na exposição de motivos da proposta defende-se: "A opção feita apresenta a virtualidade de concentrar numa única entidade a responsabilidade pelo cumprimento da legalidade da execução de um meio de prova que, pelos direitos que potencialmente é susceptível de atingir, não se compadece com a sua dispersão por diversos órgãos de polícia criminal".
Mariana Oliveira | Público | 10-07-2013
Comentários (9)
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Interesses...
A PJ não tem meios para fazer mas também não quer que outros possam fazer pois isso incomoda muito!!
O melhor seria acabar com estas "quintas" todas e criar uma Polícia Nacional mas que também não interessa!!!!!!!
Ainda interesses...
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Se for, efectivamente, útil ou necessário diversificar competências pois que assim seja. Se for mais vantajoso concentrá-las que seja essa a opção. A opção não pode é ser norteada nem pelos penachos que cada um pretende arvorar nem pela simples comodidade (que nada tem a ver com eficácia) dos investigadores.
Posto isto, há um argumento vertido na notícia que, a ser verdadeiro, me deixa estupefacto: a concentração na PJ (discutível, é certo) das investigações dos processos que impliquem o recurso a escutas vai afundar a PJ na investigação de pequenos crimes?
Mas será que a banalização de um meio de investigação tão intrusivo na intimidade das pessoas (que não são apenas os investigados mas toda a parentela e amigos) já chega à pequena criminalidade?
Será isso investigação ou uma simples forma de fishing cómodo mas que só a comodidade pode justificar?
É que se já se usam tão largamente as escutas para a pequena criminalidade o que é preciso é regular restritivamente a utilização das escutas e punir fortemente o seu abuso, sejam elas feitas por quem forem. Designadamente punir quem as ordene ou autorize abusivamente.
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Nas modernas sociedades a criminalidade não é garnde nem pequena pois tudo hoje funciona de forma interligada, o crime transnacionalizou-se, não possui tamanho!!!!!!!
Empurrar a PSP/GNR constantemente para a prevenção é algo completamente desfasado da realidade. É um cenário de há 50 anos cuja coreografia deixou de fazer qualquer sentido. Só tem sentido para aqueles que defendem interesses mesquinhos e que estão com receio do progresso dos outros.
É à PSP/ GNR (que constantemente querem ver relegadas para a prevenção) que a PJ vai BEBER muita informação e quem fala na PJ fala também no SIS pois são a PSP/ GNR que detêm nos dias de hoje um património de informações resultante de um vasto e árduo trabalho de contacto com o público na rua!! É que os crimes investigam-se na rua e não em gabinetes. O factor humano não poder ser relegado para segundo plano numa investigação criminal de gabinete apoiada em escutas e mais escutas!!!!
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