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REVISTA DE 2013

Nova lei baixa em 40% queixas de roubos nos 'super'

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Nova lei do Governo limitou as queixas por furtos em estabelecimentos comerciais. Os responsáveis do sector dizem que a descida é fictícia e garantem que este crime está a aumentar. Autoridades acham prematuro relacionar a descida com a nova legislação

As participações de furtos em supermercados diminuíram mais de 40% nos primeiros meses deste ano, segundo dados oficiais da PSP e da GNR. Responsáveis pela segurança deste sector de atividade dizem que a quebra não reflete a realidade -garantem que os furtos estão a aumentar-, atribuindo-a a um "golpe administrativo". Em causa está uma alteração legislativa, que o Governo justificou para travar as "bagatelas penais" - o furto de bens com valor inferior a 102 euros -, que estará a deixar de fora grande parte das queixas dos comerciantes.

O impacto da nova lei nas estatísticas oficiais foi assumido pelo gabinete do secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), no relatório da criminalidade do primeiro trimestre de ano. "É provável que o crime de furto em supermercado venha a sofrer um decréscimo significativo, uma vez que face à nova lei, em que os lesados têm de se constituir como assistentes, obrigando a um gasto de, aproximadamente 200 euros, pode vir a observar-se um desincentivo das queixas de furtos cujo valor seja inferior ao referido", foi escrito no documento reservado apresentado às forças de segurança no início deste mês.

Este era um tipo de crime que chegou a ser dado como "barómetro" do impacto da austeridade nas famílias portuguesas. Alguns casos de furtos (ver casos em baixo) serviram como exemplo da necessidade de livrar os tribunais destas queixas, que se tomam dispendiosas para a Justiça, e transmitir a ideia de alguma tolerância com as dificuldades sociais. No entanto, os alimentos nem são os produtos mais roubados (ver lista).

Diretores de segurança de algumas das maiores superfícies comerciais da área de Lisboa sustentam que as estatísticas oficiais "estão muito longe da realidade" e, segundo dados que mostraram ao DN, pouco mais de 10% dos furtos são denunciados. "Embora possa haver exceções, como as que vieram a público, por regra sempre participámos apenas os casos de reincidentes ou os mais graves", afirma um destes responsáveis. Ou seja, diz outro diretor de segurança, "se houve menos participações este ano, terão sido da parte dos pequenos comerciantes, que são quem está a sofrer mais".

Nada que a Confederação de Comércio de Serviços (CCS) não tivesse previsto: "Colocar fora do sistema penal crimes de furto e obrigar os comerciantes a apresentarem queixas particulares com todos os custos inerentes a esses processos é um incentivo ao pequeno furto e ao agravamento da criminalidade, sobretudo num cenário de crise que se tem traduzido num aumento exponencial de furtos em estabelecimentos comerciais e de serviços", advertiram na altura da discussão da alteração legislativa, mantendo agora a mesma posição.

A clivagem entre os furtos que realmente acontecem e as denúncias faz surgir a sombra das cifras negras. Apesar de ter previsto o reflexo que a nova legislação teria nas estatísticas, o SSI considera agora "prematuro estabelecer qualquer tipo de ligação, uma vez que o período em análise é reduzido e para se poder observar uma relação causa efeito é necessário ter dados relativos a períodos mais longos e se possível mais de um ano de comparação". Quanto à ameaça das cifras negras, esta "só poderá ser devidamente avaliada se forem apoiada por um inquérito de vitimação, que é o instrumento de eleição para se poder aferir da sua dimensão".

NÚMEROS

369
Foi o número de denúncias de furtos em supermercados recebidas pela PSP nos primeiros seis meses deste ano. Menos 40,3% em relação às 618 do mesmo período de 2012, ano em que tinha sido registada uma subida de sete por cento...

92
Participações feitas à GNR, até final de abril. Menos 47% do que as 186 no primeiro quadrimestre do ano passado e o valor mais baixo de sempre.

143 MILHÕES DE EUROS
Foi o valor total de perdas por furtos registadas pelas distribuidoras de grandes superfícies comerciais em 2012, segundo o relatório da APED. Os clientes foram responsáveis por 48%, os empregados por 19% e os fornecedores por 7%.

Chocolates
Um sem-abrigo foi julgado no Porto e condenado no ano passado a pena de multa por ter furtado seis chocolates de um supermercado Lidl. O arguido foi travado pelo segurança quando abandonava o estabelecimento, e os chocolates, no valor de 14,34 cêntimos, foram restituídos. O julgamento foi várias vezes adiado pela dificuldade em notificar o arguido, que foi julgado à revelia.

Polvo e shampô
Um homem, de 30 anos, foi julgado no ano passado no Porto suspeito de ter tentado roubar uma embalagem de champô e outra de polvo, num dos supermercados Pingo Doce. Os artigos tinham o valor de 25,66 euros e o segurança recuperou-os. No entanto, a cadeia de supermercados do grupo Jerónimo Martins não desistiu da queixa. O homem foi condenado a pena de multa.

Creme para mãos
Uma mulher, de 70 anos, foi a julgamento, em 2008, acusada de ter furtado um creme para as mãos, no valor de 1,39 euros, no supermercado Lidl de Paços de Ferreira. Quando foi interpelada pelo segurança, à saída do supermercado, a idosa alegou que se tinha esquecido do creme no interior do saco e mostrou-se disponível para o pagar. A justificação não evitou a queixa por parte do Lidl.

Magistrados do MP alertaram para o risco de impunidade
A natureza particular do crime inviabiliza a detenção em flagrante, que é um dos principais mecanismos de prevenção

O Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) considera que a nova lei sobre os furtos em supermercados "pode aumentar o clima de impunidade, grave neste tipo de fenómenos criminais". No parecer em que analisou a proposta de lei do Governo - em vigor desde março -, o CSMP diz que a "natureza particular" que passa a ser atribuída a este crime "inviabiliza a detenção do agente em flagrante delito e exige ao ofendido, e ao sistema de Justiça, uma burocracia processual e encargos com a constituição de assistente, como condição para o início da investigação".

Segundo a lei, o crime depende de acusação particular - em que o lesado paga cerca de 200 euros sempreque se verificarem as seguintes condições: o furto ocorra num estabelecimento comercial durante o período de abertura ao público, tenha como objeto produtos expostos, as coisas furtadas tenham um valor diminuto (até 102 euros), os bens furtados tenham sido recuperados e que o crime tenha sido praticado por uma só pessoa.

Os procuradores concordam com a "total inadequação do envolvimento de recursos elevados para a punição das denominadas 'bagatelas' penais", mas sublinham que a possibilidade de deter o agente "no momento dos factos, normalmente logo à saída do estabelecimento, seguida de uma reação do sistema de justiça - seja pelo julgamento sob a forma sumária, seja, nos casos menos graves, pela imediata imposição de injunções no âmbito da suspensão provisória do processo-, constitui um dos principais mecanismos de prevenção geral positiva e celeridade da justiça".

Para o CSMP, "uma solução que inviabilize uma reação deste tipo" e que impeça esclarecer se se tratou de um caso pontual ou um modo de vida "poderá gerar um espírito de impunidade, potenciador da prática de crimes", logo que o agente perceba que "a única consequência para o flagrante é a devolução do bem".

Valentina Marcelino | Correio da Manhã | 15-07-2013

Comentários (1)


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Mal-disposto com tanto dislate
Os maiores ladrões são os hipermercados e alguns supermercados. Sempre que vou a uma destas superfícies comerciais levo um lápis ou esferográfica e com eles aponto, no produto, o preço anunciado na estante. Quantas vezes já me aconteceu chegar à caixa e o preço ser superior!

Não sei se por obrigatoriedade da lei, se por na altura não haver os leitores de códigos de barras, há 20 anos todos os produtos vendidos num supermercado tinham a sua etiqueta do preço colada. Depois isso desapareceu. Deixo-vos a recomendação de conferirem bem o preço marcado na estante com o preço que aparece na caixa para pagamento. Quando começarem a fazer isto sistematicamente, vão ver as surpresas desagradáveis que apanham.

Quanto à lei referida no artigo, é uma desgraça. Só os grandes hipermercados vão ter arcaboiço económico para lidar com isto. Não duvido de que se trata de um arranjinho entre os donos dos maiores hipermercados em Portugal com o Governo para extinguir parte da competição e / ou desencorajar a criação de competidores. E depois há-de vir um parolo do Governo a dizer: "o crime baixou!" Idi*tas!

«"É provável que o crime de furto em supermercado venha a sofrer um decréscimo significativo, uma vez que face à nova lei, em que os lesados têm de se constituir como assistentes, obrigando a um gasto de, aproximadamente 200 euros, pode vir a observar-se um desincentivo das queixas de furtos cujo valor seja inferior ao referido"»

Coitadinho! Tão novinho - intelectualmente - e já secretário de Estado! E a confundir quantidade de crimes com quantidade de participações desses crimes. Reparem bem na frase: "uma vez que" é conjunção causal. E qual o raciocínio deste artista? Assistir-se-á ao decréscimo significativo deste crime uma vez que as pessoas se sentirão desincentivadas para apresentar queixa. Bravo, Ambrósio! Agora vai dar um pacote de Ferreros Rocher à tua Patroa! Vai, desaparece.

Um tipo lê isto e não acredita até que ponto um texto emanado do Governo, que sobre uma matéria tão simples nem deveria ter de ser relido para eventuais correcções mais do que uma vez, pode conter um disparate desta colossal dimensão! É que é demais, cara*o!

Deixo uma sugestão ao Parlamento: para o crime de injúrias ou mesmo de ofensas corporais ligeiras (par de estalos, puxões de orelhas, rasteiras pró tipo cair e ir marrar com os c*rnos no chão, etc.) contra membros do Governo, estes, querendo processo criminal, teriam de pagar, para dar início a esse procedimento criminal, custas judiciais no valor de 1 milhão de euros.

«Quanto à ameaça das cifras negras, esta "só poderá ser devidamente avaliada se forem apoiada por um inquérito de vitimação, que é o instrumento de eleição para se poder aferir da sua dimensão".»

Crie-se já um observatório para essa charanga! Já! O "Observatório para os Inquéritos de Vitimação no Âmbito dos Furtos em Estabelecimentos Comerciais e Crimes Análogos". E ponham um boy, ou um par de boys - mas bem encabrestados! - a presidir a essa treta!

«Quanto à ameaça das cifras negras, esta "só poderá ser devidamente avaliada se forem apoiada por um inquérito de vitimação, que é o instrumento de eleição para se poder aferir da sua dimensão".»

"Deveria estar abrangido o furto de gravadores a jornalistas durante entrevistas", disse-me, desiludido, um deputado. Ao que acrescentou: "com este Governo não vamos lá". smilies/grin.gif

O problema deste garotos é que quando eram pequeninos nunca levaram um par de estalos de mão aberta.

(Desculpem a agressividade - que não é dirigida a pessoas, mas aos dislates que elas dizem - mas é que o estado deste País põe-me mesmo doente.)
Mal-disposto com tanto dislate , 17 Julho 2013

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