As frases são recorrentes: "Isaltino Morais apresentou último recurso para se livrar da prisão", "Já só resta um recurso para Isaltino ser detido". Mas os recursos após a condenação em primeira instância - que, somados, já dão 44 - parecem nunca se esgotar. Afinal quem tem o poder de ordenar o cumprimento da pena de dois anos de prisão a que foi condenado e pôr um ponto final num processo que a Relação de Lisboa por duas vezes já disse ter transitado em julgado? A teia de recursos atrás de recursos montada pela defesa do presidente da Câmara de Oeiras é tão complexa que as fontes judiciais ouvidas pelo i não sabem como se pode desenredá-la.
Noronha Nascimento, enquanto presidente do Conselho Superior da Magistratura (CSM), até pode intervir, dizem fontes da magistratura judicial e do Ministério Público (MP), mas só "em privado". E "com cautela", já que tal pode ser encarado como uma forma de interferência na decisão dos juizes. Além disso, Noronha Nascimento esbarra noutro problema: dois dos três recursos pendentes de Isaltino Morais estão no Tribunal Constitucional, que não está dentro do leque dos tribunais judiciais e por isso foge do controlo disciplinar do CSM.
Um membro do CSM ouvido pelo i confessa que a questão já foi discutida entre os seus elementos informalmente, mas formalmente estão de mãos atadas. O sentimento de que o caso contribui para o descrédito da justiça é generalizado - "é um desconsolo ver este circo de recursos sem que o condenado esteja preso", diz -, mas o CSM, entende, só poderá intervir propondo alterações legislativas - que nunca terão efeitos retroactivos, ou seja, no máximo evitam outros casos como o de Isaltino Morais -, ou propondo uma aceleração processual.
Para isso bastava que o processo estivesse parado há demasiado tempo numa instância ou tivessem sido ultrapassados os prazos. Mas mais uma vez isso só se aplica quando o atraso acontece num tribunal judicial. "Se o Constitucional fosse, como muitos defendem, uma secção do Supremo Tribunal de Justiça, aí podia pedir-se a aceleração processual", diz outra fonte.
A incompreensão pela lentidão de um processo que o MP de Oeiras insiste já ter transitado em julgado há ano e meio é tal que um procurador desabafa: "Cada vez percebo menos de Processo Penal. O que vejo é uma coisa diferente da que está escrita." Isto porque a lei aparentemente é mais simples do que transparece no caso Isaltino Morais: se o processo transitou em julgado, acabaram-se as possibilidades de recurso, ou seja, a pena é para cumprir. Até porque a partir da data de trânsito em julgado entra em vigor o prazo de prescrição da pena.
Baseado no artigo 467.° do Código de Processo Penal (CPP), que estabelece que "as decisões penais condenatórias transitadas em julgado têm força executiva", outro magistrado do MP insiste que a juíza de Oeiras que tem em mãos o processo tem de ter a "coragem" de emitir um mandado de captura. "A partir do momento em que está transitado em julgado é para executar. Nenhum recurso terá influência sobre a condenação."
Depois de a juíza Carla Cardador ter emitido um mandado de captura, em Setembro de 2011, e menos de 23 horas depois ter sido obrigada a assinar um pedido de libertação (porque um juiz da Relação fixou efeito suspensivo num recurso), também ajuíza Marta Rocha Gomes, que a substituiu no Tribunal de Oeiras, já se recusou a analisar um dos últimos recursos apresentados por Isaltino, relacionado com a alegada prescrição do crime de fraude fiscal de 2002, mas foi obrigada a voltar atrás porque a Relação de Lisboa deu razão ao autarca e disse que o Tribunal de Oeiras era obrigado a analisar o recurso. Além disso, a juíza estará "encurralada" por um acórdão da Relação de Lisboa, de Abril de 2012, que entrou numa aparente contradição ao dizer que "apesar do trânsito em julgado da decisão condenatória deve considerar-se inexequível até ao trânsito em julgado da decisão relativa à prescrição suscitada pelo arguido". Essa decisão está há meses pendente no Tribunal Constitucional. O i tentou perceber em que estado está o recurso mas não obteve respostas até à hora de fecho da edição.
Sílvia Caneco | ionline | 13-03-2013
Comentários (20)
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Abuso de direito
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Pedem coragem, mas no lugar da colega fariam exatamente o mesmo, pois os doutos acórdãos do sempre douto TRL (que foi a grande causa de eu optar pelo cível de "baixo valor", pois não tinha "andamento" para tão douta jurisprudentiae iuridica) são um verdadeiro nó górdio para mandar o barão mexicano para a choldra.
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Independência e coragem: de quem?
Esta senhora juiz está entre a espada e a parede. É a vida dela, e dos seus filhos, que se joga aqui.
Se tivessemos uma Relação à altura e, sobretudo, um CSM à altura, há muito que ela teria sentido o conforto institucional e a defesa da sua independência necessários à passagem dos mandados.
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O que sei é que assim não vamos lá, e a mim não me agrada.
Parece-me que a melhor alternativa para isto tomar rumo seria uma amnistia geral para todos os crimes cometidos até determinado dia. Menos os de sangue.
Os que caíram e os que foram tramados poderiam recomeçar de cara lavada, de modo a que quem tem acesso a informação privilegiada deixasse de poder fazer o que lhe apetece...
Nota:
Compreendo que se escandalizem com o que proponho, mas seria interessante que então apresentassem uma alternativa melhor do que a que vivemos.
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mas qual coragem, qual quê?!
"Além disso, a juíza estará "encurralada" por um acórdão da Relação de Lisboa, de Abril de 2012, que entrou numa aparente contradição ao dizer que "apesar do trânsito em julgado da decisão condenatória deve considerar-se inexequível até ao trânsito em julgado da decisão relativa à prescrição suscitada pelo arguido". Essa decisão está há meses pendente no Tribunal Constitucional."
A questão não é de coragem. Isso serviu, apenas para vender a notícia.
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Novidades?
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Lembro que nos últimos anos houve 3 amnistias que beneficiaram centenas de LADRÕES que colocaram o dinheiro em offshores/paraísos fiscais. Esses amnistiam eles... A troco de 7,5% - bem menos que o que pagamos de iva e irs... - o dinheiro passou a ser "legítimo", "abençoado" pelo Estado sem que se preocupasse com a sua proveniência.
Se essa gente consegue isso... é porque o topo está tomado; se até o SIS usaram...
E parece-me que já de nada vale uns tantos insistirem na moralização - o mais provável é perderem a carreira ou até a vida. O sistema está podre!!! Tem pois de haver uma acção radical, e de momento só me surge a amnistia. Não implicaria uma mudança de regime, mas tiraria os "subditos" a essa gente que sistematicamente rouba o País. Sangue "purificado" para que todos possam ser livres, fraternos e iguais.
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Haja olhos e cérebros para o perceber e coragem para reformar o que tem de ser reformado, e o caso Isaltino terá valido a pena.
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A seguir queria ver coragem do Advogado do Isaltino a intentar uma acçao de indemnizacao civil contra o magistrado do MP por incompetencia.
Por mim vou começar a intentar acções de indemnizaçao contra os magistrados do
MP que para mim são o cancro da nossa justiça crriminal. Só quem nao anda pelas comarcas e não vê a vergonha que são os inqueritos é que nao se sente indignado.
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Acho graça
O nosso Isaltimo está a tornar-se um "case study" de como gente da justiça devia andar calada e não beber tão avidamente tudo o que lê no CM e órgãos similares.
Acho graça às supostas declarações do Sr. juiz Noronha do Nascimento. Acho graça o MP andar a pedir nos jornais que prendam o Isaltino (quando o podia fazer no processo) como se os efeitos dos recursos só se aplicassem aos restantes 10 499 999 portugueses (+-).
Acho muita graça que o MP não acuse ninguém no caso Furação ( segundo consta, houve casos de crimes fiscais e tendo pago o imposto devido, ninguém foi dentro) como acho graça que o mesmo Isaltino, que pediu nova liquidação do imposto, não possa beneficiar desse princípio.
Com tanta gente ressabiada, desconfio que ele deu para trás a muita gente em Oeiras!
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