Estatuto dos Magistrados. Conselho Superior da Magistratura vai fazer uma proposta de alteração às regras em vigor há três anos, que beneficiam os candidatos ao Tribunal da Relação e ao Supremo Tribunal com o currículo académico mais extenso. Estatuto dos Magistrados Judiciais vai ser revisto para premiar o mérito. Atualmente currículo académico vale mais.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) está a preparar uma proposta de revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais de forma a que a progressão na carreira seja feita apenas com base na experiência e classificação do mérito dos juízes.
Desde 2010 que o currículo académico de um magistrado judicial é um dos fatores a ter em conta para a promoção à segunda e última instância: Tribunal da Relação ou Supremo Tribunal de Justiça. A este critério, diz a atual lei, juntam-se a antiguidade (mais de 20 a 25 anos de experiência profissional) e avaliação de mérito, feitas de quatro em quatro anos (ver caixa ao lado).
"Acho que isso não faz sentido nenhum, algo está mal na lei", explica o juiz-conselheiro António Joaquim Piçarra, eleito em março para o cargo de vice-presidente do órgão de fiscalização da magistratura. Desta feita, o anterior presidente do Tribunal da Relação de Coimbra garantiu ao DN que está a preparar uma revisão do estatuto, de forma a que estas regras voltem ao que eram há três anos. Ou seja: que um juiz seja promovido apenas com base na experiência e na avaliação feita pelo próprio CSM. "Essa alteração, feita em 2010, ao Estatuto da Magistratura Judicial, foi consagrada contra a opinião dos juízes, na altura", explica. "Agora, pretendemos repor as coisas no seu sítio", adianta ainda ao DN.
Ou seja: para o CSM faz mais sentido promover um juiz que tenha mais experiência em julgar do que aquele que possua um currículo académico recheado de pós graduações, mestrados ou doutoramentos. "O verdadeiro juiz é aquele que sabe o que é julgar, que acumulou decisões ao longo da sua vida. Isso é o verdadeiro sinal de antiguidade", diz António Piçarra. Atualmente, a avaliação de um currículo de um magistrado, feita nos movimentos anuais, é da responsabilidade de um júri.
"Os juízes devem ser promovidos em função das decisões emitidas ao longo do seu percurso profissional e não em função de currículos académicos", concorda Eurico Reis, juiz desembargador no Tribunal da Relação de Lisboa. O magistrado foi um dos maiores críticos, em 2010, desta alteração. "Acho uma ótima notícia que o CSM volte atrás nesta matéria", sublinha.
Aliás, desde 2010 que os recursos enviados ao Supremo Tribunal de Justiça de magistrados insatisfeitos com as promoções deliberadas pelo Conselho Superior aumentaram em flecha. A média anual era de dois a três recursos. No último ano, essas "reclamações" chegaram aos 13 casos. "O que demonstra que a magistratura não está satisfeita", explica Eurico Reis.
Segundo o que António Piçarra adiantou ao DN, há de facto muitos juízes descontentes. "Quem exerce o poder disciplinar e quem gere a carreira de quase duas mil pessoas qualificadas, o que espera? Não se pode agradar a todos, mas isso não é de agora", sublinha. "Em cem pessoas que se candidatam por ano aos tribunais superiores, só temos dez vagas. Há pelo menos noventa pessoas que ficam descontentes", concluiu.
Eurico Reis explica ainda que "a formação académica é importante mas desfavorece os juizes que estão nos tribunais com mais trabalho e a quem não é possível ter tempo livre para mais nada".
Críticas que são partilhadas por António Martins, ex-presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses : "O mérito e a excelência devem ser os fatores predominantes para a progressão na carreira e não tem sentido que a avaliação do trabalho do juiz seja condicionada por cursos de formação."
O DN tentou contactar o atual presidente da ASJP, Mouraz Lopes, mas sem sucesso. Atualmente existem cerca de 1700 magistrados judiciais. Em março, 1600 votaram para a eleição do vice-presidente do CSM e António Piçarra obteve mais 119 votos do que o concorrente Serra Baptista. O lugar de presidente do CSM é ocupado, por inerência, pelo presidente do Supremo.
Cidadãos transformam conselho num 'balcão de queixas'
Todos os anos, mais de mil cidadãos enviam queixas ao Conselho Superior da Magistratura (CSM). Relativas ao conteúdo das decisões ou ao comportamento de alguns juizes. "Usam o CSM como se fosse um tribunal de recurso", explica fonte oficial do órgão. Mas praticamente todas as queixas são arquivadas.
Só no ano passado, foram registados 1032 casos, em que 70% acabaram em arquivamento e os restantes 30% ainda estão pendentes, em processo de decisão. "Muitas vezes as pessoas esquecem-se de que o CSM não é um tribunal de recurso, para isso existem os Tribunais da Relação e ainda o Supremo Tribunal de Justiça" explica ao DN António Piçarra, vice-presidente do CSM (ver entrevista ao lado).
Quase metade dessas reclamações têm origem em Lisboa (473) e 241 são do Porto. As restantes são do distrito judicial de Coimbra, Évora e 56 não identificadas.
"Há queixas delirantes e disparatadas", explica Rui Patrício, advogado que durante seis anos foi membro do CSM. "Há de tudo: as que se referem a questões processuais ou conteúdo das decisões, as que têm que ver com a conduta dos magistrados e até de advogados", diz o jurista. Algumas em tom de "desabafo".
O relatório anual do CSM, relativo a 2012, é claro nesta matéria. "O maior número de interpelações dos cidadãos ao Conselho sobre casos concretos de funcionamento do sistema tem por motivo a discordância com a decisão proferida pelo tribunal", pode ler-se no documento. "Apesar de manifestada, por vezes, à luz da expressão de incompreensão ou discordância em relação ao tratamento de questões procedimentais conexas com o exercício da autoridade disciplinar de atos processuais", explica o relatório.
Números relativos a este ano ainda não há mas a mesma fonte oficial garante que todos os anos a tendência é de aumento. "Houve um acréscimo do número de interpelações provenientes de todos os distritos judiciais, com exceção de Lisboa, que teve uma ligeira redução." Em 2010 o Conselho Superior recebeu 764 queixas de cidadãos, em 2011 foram 817. Menos 215 do que no ano passado. Porém foi em 2008 que se registaram mais reclamações: 1181 casos.
Carlos Rodrigues Lima e Filipa Ambrósio de Sousa | Diário de Notícias | 18-07-2013
Comentários (17)
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Dito isto, há que dizer que as pessoas foram na cantiga dos socratinos que, como é óbvio, quiseram premiar o «mérito» a que estavam habituados. resultado? Uma farsa: conheço Juízes, do meu curso, que estão a patinar enquanto há meninos que, após mestrados vários e processos despachado a menos, já os ultrapassaram. Viva o mérito do Sócrates, com as Universidades piratas a ganharem balúrdos e os cidadãos a pagarem.
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Já muitos mestrados acerca de coisa nenhuma serviram para ultrapassagem aos colegas.
Já muitos desembargadores existem que o são por vias 'travessas'.
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sustentar as faculdades de direito
CEJ
o resto não é bom para o país.
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Sentido de Justiça

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Apareça Zeka...
O Povo está consigo...
ohoh
Ó tempo, volta p´ra trás...
Antiguidade + avaliação, não é solução.
O problema é precisamente a avaliação, é tudo "Muito Bom" ou "Bom com distinção" !
Falta credibilidade ao processo de avaliação, há muita subjectividade nos próprios "avaliadores" e, sobretudo, falta ouvir, por exemplo, os outros intervenientes que bem conhecem os avaliados, como por ex. os funcionários, os outros magistrados, os advogados, etc.
Com o velho sistema, volta a valer o princípio que "para chegar ao Supremo basta não morrer "!
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No etc, têm de se incluir os arguidos, as partes, os assistentes, os funcionários, os presidentes das autarquias... Ou seja, no limite, é melhor e mais barato elegerem-se os juízes. Será mesmo isso que querem.
É que há uma alternativa, a mais usado no resto do mundo civilizado: os Juízes não são inspeccionados de mérito, só disciplinarmente. Para não terem medo de serem verdadeiros titulares de órgão de soberania. É claro que neste canto da terra já poucos sabem o que é que soberania significa.
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