Governo desafiou magistrados já aposentados a ajudarem a acabar com processos que estão parados. Só dois juízes aceitaram, mas não para os tribunais de primeira instância, onde o problema é maior.
Os últimos orçamentos do Estado desafiavam os juizes jubilados a regressarem aos tribunais para ajudarem na resolução de processos parados, mas o apelo do Governo não teve eco naqueles magistrados. Segundo dados recolhidos pelo Diário Económico junto do Conselho Superior da Magistratura (CSM), apenas dois magistrados jubilados regressaram aos tribunais e ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ), onde o número de processos parados até baixou o ano passado - nenhum voltou aos tribunais de primeira instância, onde a ministra da Justiça trava uma luta contra o tempo para resolver no prazo imposto pela 'troika' (2014) mais de 1,7 milhões de pendências.
Para ajudarem nestes tribunais judiciais, onde só no primeiro trimestre de 2013 se verificou uma inversão na tendência de subida das pendências, disponibilizaram-se zero juízes jubilados dos 370 existentes.
"Actualmente, encontram-se a exercer funções no Supremo Tribunal de Justiça dois senhores juizes conselheiros jubilados, não se encontrando quaisquer outros juízes jubilados a exercer funções noutros tribunais", confirmou o órgão que disciplina e regula a magistratura judicial.
Apesar de não existirem juizes jubilados na primeira instância (apenas nos tribunais superiores), Mouraz Lopes, presidente da Associação Sindical dos Juizes (ASJP) diz ao Diário Económico que "em teoria não há nada que impeça" os jubilados de regressarem aos tribunais de base, mas que "na prática não está a acontecer". Para o juiz desembargador é uma questão de incentivos: "Isto apenas poderia ocorrer se fossem dadas condições justas e atractivas para que pudesse haver um regresso ao trabalho na primeira instância".
O incentivo dado pelo Executivo aos jubilados que decidissem ajudar na resolução de pendências, adianta o CSM, passaria pelo pagamento dos transportes e de ajudas de custo por cada sessão, valores que são pagos de igual maneira aos magistrados no activo. Este incentivo é menor do que aquele que foi dado aos médicos reformados que, a pedido do Governo, regressaram ao Serviço Nacional de Saúde (ver caixa ao lado).
Acções executivas são o grande problemas nos tribunais
O desafio do Governo, repetido nos orçamentos do Estado desde 2011, surgiu depois de o FMI, o BCE e a Comissão Europeia terem exigido ao Ministério da Justiça que resolvesse até 2014 os mais de 1,6 milhões de processos parados em 2011. Entretanto, este número já subiu para 1,7 milhões. A proposta de apelo aos jubilados tinha partido da ASJP e o Governo acolheu-a.
As acções de cobrança de dívidas são aquelas que mais preocupam o Governo porque desde então não pararam de crescer, muito pôr causa da própria crise económica, que levou muitas pessoas a deixarem de assumir os compromissos ou a entrarem em insolvência. Consequência? A litigância aumentou. As chamadas acções executivas representam 70% do total dos processos pendentes.
A juntar a estas, a litigância laboral, comercial e tributária também têm aumentado e dificultado o trabalho do Governo em cumprir a meta da 'troika'. Meta que nenhum dos operadores da justiça contactados pelo Diário Económico acredita ser possível de cumprir.
Com a ministra da Justiça a lançar uma série de medidas urgentes e transitórias (ver texto ao lado) para tentar estancar os processos judiciais e retira-los dos tribunais, limpando estatísticas, só no início deste ano os efeitos começaram a fazer-se sentir. Ainda assim, o recuo das acções de cobrança de dívidas paradas nos tribunais recuou apenas 1,6% face aos primeiros três meses de 2012.
No Ministério da Justiça acredita-se que o novo Código de Processo Civil (CPC), que entra em vigor em Setembro, poderá fazer baixar drasticamente as pendências, mas os efeitos só se farão sentir em 2014. Consciente de que o cumprimento da meta é difícil, o Ministério da Justiça tem argumentado junto dos técnicos da 'troika' que o conceito de pendência levado em conta no levantamento feito ainda em 2011 pelo ministro Alberto Martins, que apurou 1,6 milhões de acção paradas, não é correcto.
O Governo tem defendido que não pode ser considerado pendência um qualquer processo que deu entrada no tribunal porque alguns estão a seguir os trâmites normais. Pendência seria apenas os que revelam atrasos. Este conceito baixaria o número que agora está a ser levado em conta mas ainda se desconhece para quanto. ¦
376 médicos reformados voltaram
Nos últimos três anos regressaram ao Serviço Nacional de Saúde 376 médicos aposentados, a pedido das instituições, de acordo com dados do Ministério da Saúde em resposta a questões colocadas pelo grupo parlamentar do PCP, em Junho deste ano.
Para combater a falta de alguns médicos especialistas no SNS, a antiga ministra da Saúde, Ana Jorge, criou um regime para os médicos aposentados que quisessem regressar aos hospitais e centros de saúde. Em Junho passado o Conselho de Ministros aprovou o prolongamento deste regime por mais dois anos (até Junho de 2015). Os médicos nesta situação podem optar pelo salário e um terço da pensão ou vice-versa.
Mas a proposta de lei que prevê a convergência das regras da Caixa Geral de Aposentações com a Segurança Social, e que ainda está a ser discutida com os sindicatos, prevê o fim de qualquer acumulação de salário com pensão. O caso dos médicos ainda está a ser analisado, confirmou ao Diário Económico fonte do Ministério das Finanças. C.D.
JUBILADOS NO ACTIVO
Número de magistrados judiciais já aposentados que decidiram continuar a trabalhar, mas apenas no STJ.
ACÇÕES PENDENTES
17 milhões
Número de processos parados nos tribunais no final de Dezembro de 2012, uma subida face a 2011. A tendência tem sido esta nos últimos anos e as acções executivas representam 70%. Até Março deste, ano, pela primeira vez, começaram a descer.
Medidas que estão no terreno para estancar processos parados
Tirar litígios dos tribunais, criar 'task forces' e agilizar processos têm sido as apostas. Há dois anos que a ministra da Justiça tem focado grande parte do seu trabalho num objectivo: limpar estatísticas de processos parados nos tribunais para conseguir cumprir a imposição da 'troika' de resolver todas as pendências até 2014. Estão parados neste momento mais de 1,7 milhões de processos. A ministra regulamentou formas extra-judiciais de conflitos, determinou a retirada de certos litígios dos tribunais, reviu o Código de Processo Civil, criou equipas especiais de acção, chamou jubilados para ajudarem (sem sucesso) e implementou medidas urgentes para impedir que o fenómeno cresça. Conheça as medidas que estão no terreno.
1. GRUPO DE TRABALHO INTERINSTITUCIONAL
Paula Teixeira da Cruz criou uma equipa multidisciplinar para analisar processos executivos pendentes e identificar as razões dos atrasos. Já foram analisados 980 mil processos e encerrados 260 mil.
2. EXTINÇÃO DE ACÇÕES EXECUTIVAS INVIÁVEIS
Como o Código de Processo Civil só entrava em vigor em Setembro, a ministra lançou em Janeiro desde ano um conjunto de medidas urgentes para as acções de cobrança de dívidas (que representam a esmagadora maioria das pendências). Assim, os processos anteriores a Setembro de 2003 que estivessem parados nos tribunais foram extintos caso não houvesse bens a penhorar.
3. ACELERAR OS LITÍGIOS DE BAIXO VALOR
Foram criadas equipas de juizes no Porto, Gaia, Lisboa, Maia e Oeiras (onde havia mais processos parados de pequeno valor) para agilizar as acções de dívidas de valor até dez mil euros, a chamada litigância em massa.
4. EQUIPAS PARA PROCESSOS TRIBUTÁRIOS
Por um lado, Paula Teixeira da Cruz implementou medidas excepcionais na área da jurisdição fiscal para tentar fechar processos desta natureza. Por outro, e por imposição directa da 'troika', criou duas equipas especializadas de juízes nos tribunais administrativos para resolverem o mais rápido possível as acções fiscais de valor acima de um milhão. Estão neste momento parados nos tribunais mais de seis mil milhões de euros nestes processos.
5. CRIAÇÃO DE MECANISMOS EXTRA-JUDICIAIS
Vai ser criado um procedimento que permitirá ao credor tentar fora do tribunal cobrar a dívida ao devedor de forma amigável. No caso das insolvências, foi criado um sistema extra-judicial (Sireve) e Paula Teixeira da Cruz aprovou a Lei da Arbitragem Voluntária. A ministra quer também retirar dos tribunais os processos de inventário e ainda as expropriações.
6. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
É a grande aposta de Paula Teixeira da Cruz (a par do Mapa Judiciário). As novas regras para as acções cíveis declarativas e executivas (cobrança de dívidas) só entram em vigor em Setembro mas a ministra acredita que em 2014 o impacto nas pendências já poderá ser visível. O novo código agiliza os processos, impede muitas acções executivas e responsabiliza mais todos os operadores judiciários pelos atrasos
Inês David Bastos | Diário Económico | 26-08-2013
Comentários (8)
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Aspirinas
Eterno descanso aos jubilados
Isto precisa é de sangue novo!
Por isso, eterno descanso aos jubilados, menos aos que nunca se cansaram nada!
...
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Sim, os médicos voltaram, mas o Estado está-lhes a pagar, o que até acho bem. Agora juízes a trabalhar de borla, mesmo depois da forma como foram tratados ppr esta cambada toda?
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Regalias é com eles...
Aqui os defensores oficiosos nada recebem, vai tudo para o saco dos mesmos, sociedades de advogados e juíozes...
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