A Associação Sindical dos Juizes Portugueses (ASJP) e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) acham "inadmissível", "impraticável" e "totalmente desonesto" a criação de um quadro único de magistrados na nova geografia dos tribunais, apresentada pela ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, ao sector.
Em causa está a redução do número de juizes e procuradores no quadro, mesmo nos casos das comarcas em que a pendência processual é elevada. Os sindicatos representativos da magistratura têm agora vinte dias úteis - até 19 de novembro - para responderem à ministra e "desmontar" as contas feitas pelo Ministério da Justiça (MJ) relativamente à 'flexibilidade' dos quadros, "com um intervalo entre um número mínimo e um número máximo de magistrados por comarca", explica o anteprojeto do decreto-lei, a que o DN teve acesso.
"Esta proposta reduz enormemente o quadro de juizes em tribunais de maior pendência processual", explica José Mouraz Lopes, presidente da ASJP. O juiz acusa o MJ de fazer um trabalho econométrico que leva a uma "redução brutal, não realista, do quadro dos tribunais". E concretiza, alertando para o caso do Tribunal de Comércio de Lisboa, "um dos tribunais com uma das mais elevadas taxas de processos no país, que atualmente tem quatro juizes e nove magistrados auxiliares, e que irá ficar com apenas três". E fala ainda do caso dos Tribunais da Relação de Lisboa, Porto e Coimbra, que ficarão com o quadro de profissionais que todos os dias decidem as causas de recurso, muito reduzido. "Vão para onde? Não se sabe! Como passa á ser o seu dia a dia? Não sabemos!" acusa Mouraz Lopes, em declarações ao DN.
Rui Cardoso, presidente do SMMP, admite que no caso do Ministério Público são cerca de duzentos os procuradores de primeira instância que ficam nesta "bolsa de juizes", fora dos quadros mas sem saber para onde vão. "Não fazemos a mínima ideia para onde irão estes procuradores." Atualmente o quadro do MP conta com 1500 magistrados, em todas as instâncias. Assim, o novo Regime de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais - que será depois aprovado em Conselho de Ministros e entrará em vigor no próximo ano - prevê uma extinção de 22 tribunais com 25 dos ainda chamados tribunais passarem a "secções de proximidade". O que, segundo José Mouraz Lopes, "na prática não significa grande mudança, já que estas secções, à partida, poderão realizar julgamentos e outras diligências", explicou. Fora da lista de encerramentos estão os tribunais de Oleiros, em Castelo Branco, e Melgaço, em Viana do Castelo, que surgem agora como secções de competência genérica, e o tribunal da Meda, na Guarda, para onde estava anteriormente prevista uma secção de proximidade. O número de secções de proximidade é maior na nova versão e passam a abranger concelhos que inicialmente ficariam sem tribunais como Alfândega da Fé, em Bragança, Avis, em Portalegre ou Golegã, em Santarém (ver mapa em baixo). Ajuntar aos atuais Departamentos de Investigação e Ação Penal (DIAP) em Lisboa, Porto, Coimbra e Évora, juntam - e agora mais sete (ver caixa ao lado). Rui Cardoso defende que em cada uma das 23 novas comarcas devia haver um DIAP "já que o volume processual assim o justifica".
O que muda em 2014?
Oleiros, Sátão, Figueira de Castelo de Rodrigo e Melgaço mantêm os tribunais. Menos juízes, procuradores e oficiais de Justiça marcam o próximo ano
23 tribunais judiciais substituem os 231
O essencial da reforma consta da lei aprovada em agosto e que reduz os atuais 231 tribunais de comarca e 77 tribunais de competência especializada a 23 tribunais judiciais de primeira instância, com uma abrangência territorial correspondente aos distritos que passam a denominar-se tribunais de comarca. Cada tribunal de comarca é composto por uma instância central e por instâncias locais.
Procuradores com o processo até ao fim
Com esta reforma, os procuradores do Ministério Público que deduzam acusação em determinado inquérito-crime, serão os mesmos que acompanharão o processo até ao fim, nomeadamente na fase de julgamento. A medida não foi decidida objetivamente mas sim como resultado do movimento no quadro do Ministério Público previsto pela ministra.
Juizes passam a ter académicos a ajudar
A nova organização dos tribunais prevê ainda a criação de gabinetes de apoio aos magistrados e procuradores nos tribunais, formados por académicos. Que serão licenciados em direito, economia ou outras áreas. A ideia é que estes profissionais possam estudar dossiês mais importantes para o tipo de criminalidade mais complexa como a económica e financeira, ou para casos que o exijam.
Mais sete DIAP espalhados pelo País
A proposta cria novos Departamentos de Investigação e Ação Penal (DIAP) nos Açores, Braga, Faro, Leiria, Funchal, Setúbal e Lisboa Norte, este último com sede em Loures. E mantém ainda em funcionamento os restantes em Lisboa, Porto, Coimbra e Évora e ainda os de Aveiro e de Sintra, que tinham sido criados com a reforma de 2008 que colocou em marcha três comarcas-piloto.
Filipa Ambrósio de Sousa | Diário de Notícias | 23-10-2013
Relacionado (1): Anteprojecto de Regulamento de Organização e Funcionamento dos Tribunais JudiciaisAnteprojecto do ROFTJ416.32 KB
Relacionado (2): Nota da DN da ASJP, de 22-10-2013:
«O anteprojeto de Decreto-lei que estabelece o Regime de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais constitui uma afronta aos Juízes portugueses que trabalham nos tribunais judiciais.
O Ministério da Justiça manteve até agora no segredo dos bastidores uma proposta que reduz o quadro de Juízes em exercício de funções nos tribunais de maior pendência processual.
Enveredou-se por uma lógica economicista de redução de custos que só poderá vir a implicar uma redução da qualidade e eficácia da prestação jurisdicional e um impacto negativo para o cidadão e as empresas.
Nesta proposta o Ministério da Justiça demonstra que não fez adequadamente o trabalho de casa, produzindo um resultado econométrico que só se pode lamentar.
Não se podem diminuir pendências diminuindo o número de juízes, nomeadamente nos Tribunais onde o congestionamento processual é maior.
As constrições financeiras e a gestão dos interesses locais não se podem sobrepor aos interesses da justiça.
A nossa atitude foi sempre a de colaborar com a construção de uma reforma da justiça e do mapa judiciário em conformidade com as atuais exigências sociais, económicas e culturais do país.
Demonstraremos a razão da nossa crítica, não só com uma análise severa ao projeto de diploma como também através de outras formas de intervenção associativa que apelem a uma atitude política e social de respeito e de reconhecimento da importância do papel dos Juízes e dos tribunais na sociedade.
Somos responsáveis e queremos evitar os previsíveis efeitos negativos da aprovação de tal diploma para os cidadãos portugueses, em nome de quem julgamos.
Às pressões sobre os Tribunais, ao desrespeito pelas suas decisões, à degradação fortíssima do sistema remuneratório, acresce agora a incerteza e precariedade do trabalho dos Juízes.
O sentimento só pode ser de indignação.
Há limites para tudo.
E há limites para a afectação da dignidade do exercício das funções judiciais.
Coimbra, 22 de Outubro de 2013»
Comentários (14)
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Contraproducente
As lamentáveis consequências...
Enalteceram-se as alegadas virtudes dos TRIBUNAIS ARBITRAIS.
Remeteram-se alguns dos problemas familiares para as CONSERVATÓRIAS DO REGISTO CIVIL.
Alargaram-se as competencias das CONSERVATÓRIAS DO REGISTO PREDIAL.
Atribuíu-se a competência para dirimir alguns conflitos aos JULGADOS DE PAZ.
Entregou-se a entes privados a gestão dos PROCESSOS EXECUTIVOS.
Concedeu-se às autoridades administrativas poderes para julgar PROCESSOS DE CONTRA-ORDENAÇÃO.
Etc., etc…
Em síntese:
Fez-se antes uma apologia despudorada da DESJUSDICIALIZAÇÃO.
Além disso, aumentou-se, para valores insuportáveis para a maioria da população, os “PREÇOS” das acções judiciais.
Eis, salvo melhor juízo, uma das (inevitáveis) CONSEQUENCIAS.
É que, pelos vistos, já parece resultar, do que acabo de ler, a absurda constatação de que, neste País, teremos Juízes e Procuradores em excesso…
Com a ressalva do devido respeito, não me parece que, sendo Portugal um Estado de Direito, este seja o melhor caminho.
Mas quem sou eu, pobre e ignorante leitor, para “opinar” sobre assuntos de tamanha transcendência?!...
...
...
P. S. - O presidente do Supremo e a ASJP que não "abram bem os olhos" à contínua, implacável e (aparentemente) irreversível funcionalização e subordinação dos Juízes ao poder político, que logo verão onde isto vai parar. Já avisei, há muito tempo, que a nomeação de capatazes (vulgo presidentes das comarcas) é um primeiro passo para tempos bem sombrios que se avizinham.
Requiescat in pace
A "reforma" já foi, como outras, "cortada".
Isto é já o FUNERAL do Poder Judicial, um dos pilares do Estado de Direito Democrático.
E vamos deixar que isso aconteça?!...
...
A partir do momento que esta ministra disse que ia encerrar tribunais e proceder a uma reforma profunda na justiça, vindo de quem veio, antevi logo o caminho que ia ser percorrido, e que já se faz notar.
Esta ministra é a personificação do cúmulo da incompetência, facto que já era bem conhecido de todos, aliás, basta ver o seu percurso para ter uma ideia.
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Vão-se queixar ao Totta...
As pessoas devem respeitar os outros se querem ser respeitadas. Mandar calar um advogado...
Nota-se uma mudança no tom da voz da juíza presidente quando o advogado pede para lavrar um protesto.
Inicialmente até se ouve a juíza a dizer - vocês hoje estão uns mandões...
É o país que temos.
Vá-se queixar ao CSM
É que sei que o teor da gravação seria generalizado, criando uma má (e injusta) imagem para toda a advocacia. Se desprestigiamos os profissionais da justiça, desprestigiamos a justiça e, sendo nala agentes, desprestigiamo-nos a nós.
No lugar de apresentar queixa, o advogado em causa e o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados (!) optaram por não respeitar as instituições (não recorreram ao CSM, que até dizem não agir), preferindo divulgar uma cena lamentável de um juiz.
Espero que os juízes, para bem da justiça e dos próprios, não sigam o exemplo, começando a divulgar as “actuações” dos advogados.
É que a opção do BOA também é um sinal dos tempos…
E a leizita... Que alguns teimam em desconhecer ou desrespeitar
Da pouca vergonha
Marinho Pinto utiliza a gravação a seu bel-prazer... E acha que pode! Quem se admira! O CSM não faz nada? Faz faz... Mas era a este que deveria ter enviado a gravação. Cumpria um dever, granjeava respeito e evitava um processo crime...
...
"agrupamentos".
Ainda veremos, pelo andar da caravana, os "aldeamentos" e, por fim, os "acampamentos".
Bons tempos em que Ministros da Justiça eram Senhores como
Prof. Doutor Adriano Paes da Silva Vaz Serra (1903-1989)
Prof. Doutor Manuel Gonçalves Cavaleiro de Ferreira (1911-1992)
Prof. Doutor João de Matos Antunes Varela (1919-2005)
Uma consulta às páginas wiki a eles relativas é suficiente para se ter uma ideia da grandeza destes Homens e do serviço que à Pátria prestaram.
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Do pdf disponibilizado acima retirei as seguintes frases, todas elas na onda da saloiada pseudo-intelectual que toma conta do País:
«As instâncias locais, que tramitam e julgam as causas não atribuídas à instância central, integram secções de competência genérica e podem desdobrar-se em secções cíveis, secções criminais, secções de pequena criminalidade e secções de proximidade.»
Portanto: três secções (não se terem lembrado de lhes chamar "balcões" foi uma sorte) classificadas em função da natureza dos processos, e mais uma classificada em função... da distância (julgo que das partes ao tribunal, perdão, à "secção").
Sugiro o exercício de ir ao google, escrever (com aspas) a expressão "secções de proximidade" e ficar deliciado/a com o que se encontra.
«Por outro lado, considerando a diminuta e desadequada oferta de transportes públicos que servem alguns dos municípios, a que se somam as dificuldades na [sic!, em vez de "nas"] respetivas acessibilidades viárias, que distam nalguns casos mais de 50 quilómetros da instância local mais próxima, foi contemplada a obrigatoriedade de algumas destas seções [pois... falta pouco para as sessões ou mesmo para as sexões, acreditem] de proximidade, prévia e devidamente identificadas, assegurarem as respetivas audiências de julgamento.»
"Foi contemplada", imaginem. "Foi assegurada" sairia até a um aluno do secundário, muito mais rapida e correctamente. Mas não. "Contemplada" é muito mais in, na legística pós-moderna.
A que objecto se refere o "que" imediatamente antes de "distam nalguns casos..."? Será aos municípios? (Caso que a sintaxe é... a desgraça que é...) Ou às "acessibilidades várias"? (Caso em que: são as acessibilidades que... distam! Imaginem: já não bastava os tribunais ficarem longe; são as próprias acessibilidades que ficam distantes, agora!) Façam o favor de contratar alguém que escreva, já não peço, português erudito, mas simplesmente... português.
Sra. Ministra, tenha cuidado e não se estique muito em explicações. Repare: mais um bocadinho e quase ia chamando "tribunais" a estas coisas que V. Exa. está a tentar criar: as «seções» [sic!]. Ora chamar tribunais a isto é tudo o que V. Exa. não quer. Não é? Por enquanto fica assegurada, perdão, "contemplada" a obrigatoriedade de estas secções fazerem, perdão, "assegurarem" as audiências de julgamento (como é que não mudaram o nome disto para "encontros de perguntas e respostas de carácter judicial"? "Audiências de julgamento" é tão démodé, sei lá...). Mas um dia isto é para acabar, dê por onde der. Isso dos tribunais é para haver meia-dúzia, Sotôra, que é uma coisa que dá uma despesa... Olhe, nem queira saber.
«A gestão de cada tribunal judicial de primeira instância é garantida por uma estrutura de gestão tripartida, composta pelo presidente do tribunal, centrada na figura do juiz presidente, pelo magistrado do Ministério Público coordenador e pelo administrador judiciário, num modelo que desenvolve e aprofunda aquele que já havia merecido consenso com a aprovação do regime das comarcas piloto, pela Lei n.º 52/2008, de 28 de agosto. Prevê-se a prévia nomeação das estruturas de gestão para que possam acompanhar a implementação das novas comarcas.»
Alguém me sabe dizer a que substantivo se refere o adjectivo "centrada"? O mesmo a que "composta" já se refere? É caso para dizer que a coisa vai então não só compostinha como centradinha. Um mimo. Ou será que, como dizia uma fabuloso assistente da FDL, isto foi escrito por duas pessoas diferentes em dois fins-de-semana diferentes? Mas a própria expressão "centrada na figura do juiz presidente" é logo, em si mesmo, engraçadíssima. Poder-se-ia ter escrito "centrada [a gestão "tripartida", supõe-se] no juiz presidente". Mas não. Fazia falta - imensa - a "figura" do dito.
Temos telenovela assegurada (asseguradíssima) para toda a eternidade e mais 15 dias, com este profético modelo de gestão. Um modelo que é também um paradigma e uma novidade. Uma espécie de ovo Kinder, mas sem chocolate.
«Mostra-se, também assim, prevista a existência de gabinetes de apoio aos magistrados judiciais e magistrados do Ministério Público, compostos por especialistas com formação académica em diversas áreas para que aqueles possam dedicar-se exclusivamente à sua tarefa essencial.»
É uma novidade. Até hoje nunca os tribunais tinham contado com peritos. Nunca. Vai ser agora. E vão ter gabinetes! Aliás, gabientes não. "Gabinetes de apoio"! Ena! Afinal era mentira que havia falta de dinheiro para que os Srs. Juizes e Magistrados do MP tivessem gabinetes com dignidade. Era mentira. Uma Senhora Mentira. Então se até há dinheiro para... gabinetes de assessores!... E quartos, não? Depois chamávamos a esta charanga "Hotéis da Justiça". Fica a ideia; pode ser que algum doido pegue nela. Ou peque.
Exa. Senhora Ministra da Justiça
Paula Maria von Hafe Teixeira da Cruz (licenciada em Direito e Advogada):
arreie. Está mais que visto que não pode.
E quem não pode, arreia.
Não é vergonha.
Vergonha é continuar a acreditar de que está à altura de ser Ministra da Justiça.
Com tanto "swap" e PPP para a Sra. Ministra mandar analisar à lupa na defesa dos soberanos interesses do Estado e anda V. Exa. a reformar os tribunais desta maneira...
Faça poucas leis e boas. O Povo saberá agradecer-lhe.
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