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REVISTA DE 2013

Tribunais têm de saber comunicar com o povo

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Deputado Fernando Negrão defende que as explicações podem ser dadas através do Conselho Superior da Magistratura.

As decisões da Justiça não são, a maior parte das vezes, percebidas pelo povo. Esta é uma observação que não é nova e que voltou a ser sublinhada, ontem, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC), pelo deputado Fernando Negrão.

O presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República (AR) participou na sessão de encerramento da conferência Tribunais e Direitos Humanos", incluída na iniciativa "Tribunal de Porta Aberta" e promovida pela Associação Sindical dos Juizes Portugueses (ASJP) e pelo lus Gentium Conimbrigae/Centro de Direitos Humanos da FDUC, que tem Jónatas Machado como director-executivo.

«A Constituição diz que a Justiça é administrada em nome do povo. Esta é a preocupação central que deve existir da parte dos tribunais e dos outros órgãos de soberania», assinalou Fernando Negrão, que foi juiz durante 20 anos, tendo passado por Albufeira; S. Jorge, nos Açores; Ferreira do Alentejo; Alenquer; Lisboa, no Tribunal da Boa-Hora; Setúbal e Barreiro. Segundo o antigo director-geral da Polícia Judiciária (PJ) e ex-ministro da Segurança Social, da Família e da Criança do Governo liderado por Pedro Santana Lopes, «se o povo compreender as decisões dos tribunais, tenho a certeza que as vai aceitar muito melhor do que tem aceitado algumas delas, nomeadamente as mais polémicas». Pois, prosseguiu, «é fundamental a compreensão, porque compreender é aceitar».

Após defender «a definição de uma estratégia de comunicação com o povo», Fernando Negrão reforçou que «o que tem falhado é a explicação de algumas decisões dos tribunais», nomeadamente ao nível da «clarificação dos termos jurídicos que o povo não percebe», confidenciando que «convém que se passe à prática rapidamente».

Na hora de avançar com quem podia prestar tais esclarecimentos ao povo, o deputado da AR não tem dúvidas: «Pode ser através do Conselho Superior da Magistratura, que é o órgão que gere a magistratura Não deve ser outro para não haver intromissões no poder judicial. Tem de ser alguém que saiba descodificar a linguagem, mantendo o rigor, mas usando uma linguagem acessível a todos».

Presidente da ASJP, Mouraz Lopes considerou que a inicitiava foi «um êxito», justificando tal opinião com o facto de terem sido «discutidas questões essenciais que têm a ver com a importância dos direitos humanos e a sua aplicação em todos os tribunais». Para o antigo director nacional adjunto da PJ, «ficou demonstrada a importância da narrativa dos direitos humanos, sobretudo em momentos de crise como o que estamos a atravessar».

Nas intervenções proferidas e nas perguntas colocadas, Mouraz Lopes entendeu ter ficado claro que «as políticas públicas têm de respeitar os direitos humanos e não podem passar por cima dos direitos humanos», assim como ficou a certeza que «os tribunais serão sempre os últimos guardiões dos direitos humanos e a esperança das pessoas quando os seus direitos forem violados». «É fundamental as pessoas perceberem que os tribunais estão lá para as defenderem», concretizou o juiz-conselheiro.

João Henriques | Diário de Coimbra | 11-12-2013

Comentários (16)


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Este comunicar, implica esforçar-se por entender quem vai aos tribunais; os Juizes têm de ouvir, com calma o que as pessoas lhes tentam transmitir, têm de deixar os advogados inquiririr, e, não estar constantemente a cortar a palavra ao advogado e à testemunha, para abreviar a diligencia. Pois as pessoas não sabem o que é ou não importante para a decisão, falam muitas vezes de coisas que não são cruciais, e se não forem "direccionadas" para o importante não o dizem, por isso os Srs. juizes se querem decisões juntas têm de falar uma linguagem menos formal e ouvir, repito, ouvir advogados, testemunhas, assim como os demais intervenientes...
Pé de Vento , 13 Dezembro 2013
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Para já, contentava-se com a divulgação das cassetes das escutas telefónicas dos processos “Face Oculta” e “Freeport”.
Maria do Ó , 13 Dezembro 2013
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Sou juiz há 33 anos e revejo-me nas palavras do comentador Pé de Vento. Nós, juízes, não devemos ter receio de assumirmos as nossas culpas.
Mendes de Bragança , 13 Dezembro 2013
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Caro Pé de Vento,

Concordo com o que diz, mas olhe que o contário também é verdade, ou seja, há testemunhas que estão a responder a matéria durante, uma, duas ou três horas, que muitas vezes em meia hora ou menos se respondia. Aqui interrompem de menos smilies/smiley.gif
Zé da Laurinda , 13 Dezembro 2013
Comunicar?
Discordo do discurso de Fernando Negrão no ponto em que pretende atribuir a um Conselho Superior a incumbência de explicar decisões judiciais. OCSM não se devia meter nisso ( nem noutras coisas, aliás).

Os juizes e tribunais devem saber explicar de modo simples as decisões. E para tal basta que façam um resumo das decisões, do mesmo modo que os acórdãos também o fazem logo no início. AInda mais simples, até. E isso é possível e desejável e até me parece que nada o impedirá, actualmente.

Então para quê atribuir a uma entidade estranha à decisão e que não é um órgão jurisdicional ( o CSM) a incumbência de explicar essa decisão?

O problema principal prende-se com a capacidade de os juizes serem capazes de tal.
A complexidade jurídica dos casos pode sempre ser desenvolvida na fundamentação. O mais importante porém é a explicação simples que costuma vir no fim da decisão e devia vir no inicio.

Se os juizes e tribunais não forem capazes disto fazer não sei então como resolver a questão. Julgo, porém que com algum treino e incentivo prático o conseguirão e será mais fácil, razoável e proveitoso para todos que o façam do que deixar a tarefa ao CSM.



José , 13 Dezembro 2013 | url
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Caro Pé de Vento,
Com tanta carga processual e contas a prestar com é possível deixar os intervenientes processuais e testemunhas dizerem o que lhe vai na gana ?
Impossível não é ? E quem o fizer está desgraçado porque é engulido pela pressão processual e pelas imensas solicitações a que acaba por não se dar resposta.
Ai Ai , 13 Dezembro 2013
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Não é só ao juiz que cabe recentrar uma testemunha que se afasta do essencial e faz perder tempo ao tribunal. Eu sou advogado e quando uma testemunha minha divaga ou se afasta do essencial, sou eu que a interrompo e a recentro, sem esperar pelo juiz É óbvio que a perda de tempo não interessa a ninguém!
jlcdiniz , 14 Dezembro 2013 | url
Discordo
Houve um duas alguém que "achou" que o CSM podia encarregar-se da divulgação e "explicação" de decisões judiciais que causam controvérsia ou alarde. E logo uma imensa plêiade se atropela a repetir... Pois eu discordo. O CSM e um órfão administrativo, que tem funções estritas de gestão e disciplina da magistratura judicial. O CSM não e órgão jurisdicional e por isso não deve "intrometer-se" em casos concretos. E não o deve fazer por boas razoes, sob pena de grave entorse que pode subverter a natureza de tal órfão e mesmo atropelar a independência judicial (pense-se em decisão controversa que o CSM por qq razão discorda e "comenta")...
Não e por acaso que a lei até hoje não lhe cometeu essa tarefa. E bem. Mas o "disparate" anda no ar... E há muitos anos!
Francisco do Torrão , 14 Dezembro 2013
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Pessoalmente penso que não incumbe aos Tribunais nem aos Conselhos satisfazer a gula dos jornais e telejornais.
Tchau.
Ai Ai , 14 Dezembro 2013
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Concordo com a posição expressa pelo comentador José sendo, no entanto, certo que presumo que o Dr. Fernando Negrão se estivesse as referir às decisões mais mediáticas.
josé Augusto Rodrigues de Sá , 14 Dezembro 2013
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Já ajudava se os políticos não estivessem sempre a desinformar e a tentar distorcer o sentido das decisões...
Era , 15 Dezembro 2013
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"Pessoalmente penso que não incumbe aos Tribunais nem aos Conselhos satisfazer a gula dos jornais e telejornais. "

É muito tentadora esta proposição e tenho deparado muitas vezes com esta opinião entre magistrados: não dar cavaco, mostrando que estão seguros naquilo que fazem e por isso não serão devidas explicações.

Afinal, que outras profissões estão obrigadas a explicar a complexidade de trabalhos teóricos que têm de elaborar?

Ora, isto parte de um sofisma. O de que não são devidas explicações simples para assuntos que são tratados profissionalmente e com o rigor adequado, por vezes complexo.
A meu ver são devidas explicações porque a Justiça é realizada em nome de algo que agora se chama "povo", na Constituição que temos.
A Constituição de 1933 não tinha essa formulação específica. Dizia apenas ( artº 71º) que "A soberania reside em a Nação e tem por órgãos o Chefe do Estado, a Assembleia Nacional, o Governo e os Tribunais".
José , 15 Dezembro 2013 | url
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Caro José,
O que quero dizer é o seguinte: se querem publicar notícias sobre a justiça que o façam mas não tem que ser alguém da justiça a da justificações até porque as pessoas que trabalham nos Tribunais não são pagas para esse trabalho e para essa exposição pública (esse trabalho pertençe a jornalistas).
Ai Ai , 15 Dezembro 2013
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Faltou algum texto no comentário que coloquei. En resumo seria isto:

Dantes a Justiça não era constitucionalmente aplicada em nome do povo, como agora o é. E por isso não havia obrigação estrita de educar ignorantes. Se quisessem saber, que aprendessem!
Hoje em dia, não é assim: a Constituição obriga a informar e a elucidar os analfabetos que apesar de term concluido estudos superiores sabem menos do que dantes, os que tinham o 5º ano de liceu ( requisito para se ser jornalista, então).

Por isso concluía no meu comentário que isto agora assoma um lado ridículo que é o de a lei constitucional obrigar implicitamente os tribunais a ensinar ignorantes.
José , 15 Dezembro 2013 | url
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só os tribunais devem explicar as suas decisões e não entidades administrativas.
ui , 16 Dezembro 2013
...
Pois é caro ui, por isso é que as sentenças são fundamentadas, ou seja, a explicação já lá está.
Ai Ai , 16 Dezembro 2013

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