Nova lei deixou em aberto a forma como deve ser calculado o valor das benfeitorias realizadas pelos inquilinos nos casos em que estes optam por abandonar as casas
A indemnização a que têm direito os inquilinos que, perante uma renegociação de um contrato, optam por devolver a casa ao proprietário está a tornar-se num novo foco de conflitos. Os desentendimentos arrastamse para tribunal e acabam por impedir muitos senhorios de aumentar a renda enquanto o processo não fica resolvido. O problema está nas benfeitorias realizadas no imóvel, uma vez que este é o único caso em que a lei prevê que os inquilinos possam ser indemnizados por gastos que tenham tido na casa, mas na das vezes não há acordo.
Não há estatísticas que permitam saber quantos casos poderão já ter surgido de dissolução do contrato por iniciativa do arrendatário. Regina Pereira, advogada, diz que "são em catadupa" e que ela própria tem alguns em mãos. Fonte da Associação de Inquilinos Lisbonenses (AIL) admite ter conhecimento vários, sobretudo pessoas que já viviam na província mas que mantinham as casas arrendadas porque a renda era baixa e porque as usavam para "vir ao médico ou visitar os filhos". Neste caso, a maioria opta por entregar a casa, mas a AIL não tem indicação sobre a forma como evolui o processo
De acordo com a lei, sempre que o contrato acaba por opção do inquilino, este deve devolver a casa passados 90 dias, sendo também nesse momento que o proprietário passa o cheque com a indemnização por benfeitorias a que haja lugar.
O problema está no valor da indemnização. Alguém que mudou a canalização ou a instalação eléctrica que estavam estragadas terá direito a ser ressarcido pelo custo desde que a obra seja legal e tenha sido autorizada pelo senhorio, explica Regina Santos Pereira No entanto, na maioria das vezes a obra foi feita há muito tempo, já ninguém tem facturas e torna-se difícil quantificar o valor da benfeitoria e da subsequente indemnização.
Inquilino tem direito de retenção
Enquanto inquilino e senhorio não chegarem a um acordo sobre a indemnização, pode haver lugar a grandes injustiças e abusos, admite Lourença Sousa Rita. É que então será preciso avançar para uma acção em tribunal onde será feita prova das obras, ou com testemunhas ou através de perícias, por especialistas, que vão avaliar o valor. O processo terá de ser uma acção declarativa, explica a advogada da JP Aguiar Branco, o que significa quem nem sequer será possível aproveitar da rapidez que a nova lei veio conferir aos despejos através do Balcão Nacional do Arrendamento.
Entretanto, acrescenta Regina Santos Pereira, o inquilino pode invocar o direito de retenção, previsto no Código Civil e que significa que pode "reter" a casa enquanto o proprietário não lhe pagar.
Este direito de retenção prolongar-se-á,atéhaveruma decisão judicial sobre o assunto. E, entretanto, levanta-se a questão da renda, porque havendo denúncia pelo arrendatário, esta não será actualizada. E o senhorio não só não recupera a casa, como não recebe mais pela renda Isto podia evitar-se, dizem os advogados, se a lei tivesse antecipado estes casos e estipulasse uma forma rápida e eficaz de determinar o valor da indemnização. Uma hipótese, defende fonte da AIL, poderia passar por entregar essa tarefa às comissões arbitrais municipais, que, no âmbito da lei anterior, já tinham a competência de dirimir conflitos relativos a obras e à utilização das casas arrendadas e que com a nova lei ficaram esvaziadas de funções.
É mais um buraco na lei, que já existia na anterior legislação, na reforma de 2006, mas que só agora estamos a dar por ele, porque só agora é que está a ter expressão, remata Lourença Sousa Rita
Que obras dão direito a indemnização?
O arrendatário tem direito a compensação pelas obras licitamente feitas, prevê a nova Lei das Rendas. Daqui decorre que terão de ter sido obras ou autorizadas peio senhorio, ou que não sejam ilegais (o caso das tradicionais marquises, quase sempre feitas sem as necessárias aprovações das autarquias). Quando se fala de benfeitorias - ou seja, obras que melhoram a casa -, estas dividem-se, de acordo com a Lei em necessárias, úteis e voluptuárias. As primeiras são as mais óbvias e aqui se incluem, por exemplo, a recuperação da canalização ou da instalação eléctrica, embora também possam derivar dos direitos gerais do arrendatário de manter a casa e a devolver como a encontrou. As úteis são as que podendo não ser completamente indispensáveis, aumentam o valor do imóvel, por exemplo a instalação de um aquecimento central, que não poderá depois ser retirado e levado embora quando o inquilino abandonar a casa. Finalmente, as voluptuárias, são as que não são indispensáveis e nem aumentam o valor, tendo sido realizadas em regra apenas por razões estéticas.
As obras necessárias e as úteis são as que podem dar direito a indemnização. Esta, porém, nem sempre terá de ser exactamente igual ao valor gasto, dependendo da data em que foram feitas e do nível de desgaste que tenham tido entretanto, isso faz com que, não existindo acordo entre proprietário e o inquilino que está de saída, tenha frequentemente de ser chamado um perito que proceda à necessária avaliação com base na qual será determinado o valor da indemnização.
Filomena Lança | Jornal de Negócios | 08-07-2013
Comentários (2)
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My Good
Por que não se faz aos acionistas da EDP, da GALP. das concessionárias das autoestradas, etc. isto é, das produtoras de bens não transacionáveis para que as despesas das restantes empresas ficassem diminuídas tornando-as mais competitivas. Veriam como o mercado ser iria desenvolver. Mas não! Continua a roubar-se a classe média par.a entregar a acionista que transfere para o estrangeiro.
...
Obras lícitas são, apenas, as que foram autorizadas pelos senhorios ou que, não tendo sido autorizadas foram determinadas por razões de manutenção e/ou conservação urgente e foram, posteriormente, comunicadas ao senhorio.
Se foram feitas sem qualquer acordo ou conhecimento do senhorio e visaram melhorar as condições de conforto ou satisfação pessoal do inquilino são, obviamente, benefício do inquilino nada tendo o senhorio a ver com elas, salvo como eventual fundamento de despejo..
Por outro lado, apliquem os critérios do fisco: fizeram obras? Onde estão as facturas para se saber quanto foi, de facto, a correspondente despesa?
Nem venham com a conversa de que perderam as facturas ou as obras foram há tanto tempo que já não há vestígios?. Quem fez a obra tem, certamente, possibilidade de emitir segundas vias. Não há? Temos pena. Até agora certos inquilinos oportunistas têm ficado caladinhos e largam as casas.
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