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REVISTA DE 2013

Alteração dos julgamentos rápidos em risco de cair

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O recente alargamento dos julgamentos sumários em caso de flagrante delito a crimes mais graves já foi declarado inconstitucional por duas vezes. Ao terceiro acórdão do Tribunal Constitucional (TC) no mesmo sentido, a norma cai. As decisões judiciais vão levar o PS a propor a revogação desta e de outras alterações ao Código de Processo Penal, que entraram em vigor em Março deste ano.

O gabinete da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, questionado pelo PÚBLICO sobre os acórdãos do TC, respondeu apenas que o caso está a ser avaliado. "O Ministério da Justiça tem conhecimento da declaração de inconstitucionalidade em dois casos concretos, encontrandose a avaliar a situação", segundo a nota enviada.

Com dois acórdãos do TC a seu favor, a bancada socialista prepara-se para avançar já com propostas para eliminar as alterações propostas pela ministra da Justiça ao Código do Processo Penal e retomar o que estava em vigor antes de Março deste ano. O projecto de lei vai dar entrada logo no início dos trabalhos parlamentares, no próximo mês, disse ao PÚBLICO a deputada Isabel Oneto (PS). Em causa está principalmente a alteração legislativa que passou a permitir os julgamentos sumários em casos de flagrante delito pela prática de crimes com moldura penal superior a cinco anos e por um tribunal singular (um só juiz). Anteriormente, esses processos sumários estavam reservados para a pequena e média criminalidade (penas até cinco anos).

"Na altura, chamámos a atenção para as inconstitucionalidades e agora o Tribunal Constitucional está a dar-nos razão", afirma a deputada Isabel Oneto, referindo-se a dois acórdãos recentes em que os juízes do Palácio Ratton declararam que a norma relativa aos processos sumários em flagrante delito viola a Constituição. O TC considerou que a nova redacção da lei viola o princípio da igualdade e o das garantias de defesa do arguido em processo criminal.

Ao permitir que um arguido, detido em flagrante delito, por um crime que pode ter pena de prisão superior a cinco anos, seja julgado perante tribunal singular "não assegura a este arguido todas as garantias de defesa, uma vez que não lhe assegura o julgamento perante tribunal colectivo, o qual lhe seria assegurado caso não tivesse sido detido em flagrante delito", lê-se no acórdão com data do passado 13 de Agosto. A deputada lembra que "o flagrante delito nem sempre significa evidência da prova" e que há casos, como o de um homicídio simples [que tem uma pena de prisão entre oito a 16 anos], que "merecem ponderação".

Durante o debate da proposta de lei, no início do ano, no Parlamento, a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, sustentou que as garantias do arguido nos processos sumários estavam salvaguardadas. "Os direitos de defesa do arguido foram devidamente acautelados através da previsão do direito ao prazo para preparação da defesa e não como vi escrito por aí em 48 horas, caso em que, apesar de o julgamento não se iniciar imediatamente, o processo mantém a forma sumária", disse Paula Teixeira da Cruz. A posição foi apoiada pelos partidos que suportam o Governo e aplaudida pelo CDS, já que o alargamento do âmbito dos processos sumários era uma das bandeiras dos centristas.

O PS continua a contestar outras alterações ao Código do Processo Penal como a possibilidade de as declarações do arguido, prestadas na fase de inquérito e instrução, serem utilizadas sem entraves depois em sede de julgamento.

Sofia Rodrigues | Público | 22-08-2013

Comentários (16)


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...
Bem, sendo assim, o julgamento perante juiz singular será sempre inconstitucional, porque três juízes oferecem sempre mais segurança na análise dos factos e na respetiva subsunção jurídica.

Mas, sendo assim, o julgamento perante três juízes será sempre inconstitucional, porque cinco juízes oferecem sempre mais segurança na análise dos factos e na respetiva subsunção jurídica.

Porém, sendo assim, o julgamento perante cinco juízes será sempre inconstitucional, porque onze juízes oferecem sempre mais segurança na análise dos factos e na respetiva subsunção jurídica.

Etc.
Contribuinte espoliado , 22 Agosto 2013
José Pedro Faria (Jurista) - Alteração inevitável
Ainda antes de ser conhecido o primeiro acórdão do TC que se pronunciava no sentido da inconstitucionalidade da realização de julgamentos sumários, em caso de flagrante delito, no que respeita a determinados crimes de maior gravidade, eu já havia exposto nesta Revista a minha opinião absolutamente contrária à solução legislativa. Recordo-me que na ocasião eu tinha manifestado completa discordância com a posição assumida pelo Sr. Presidente do SMMP.

Os argumentos favoráveis à inconstitucionalidade das normas em causa são esmagadores, não valendo agora a pena vir agora alguém inventar "fundamentos" sem qualquer sentido, que mais parecem brincadeiras sem nexo.

Recordo que, há mais de 20 anos que o TC vem dizendo, e com razão, que o tribunal singular oferece ao arguido menores garantias de defesa do que um julgamento em tribunal coletivo, por diversas razões, sendo uma delas evidente: o tribunal singular é normalmente constituído por um juiz em início de carreira com menor experiência profissional.

Por outro lado, flagrante delito não significa processo arrumado de imediato, não apenas quanto à autoria do crime, mas também por razões de extraordinária importância, especialmente quando falamos de crimes suscetíveis de proporcionarem a aplicação de pesadas sanções criminais: refiro-me designadamente à dificuldade que por vezes existe, mesmo em situações de flagrante delito, relativamente a aspetos relevantes para efeito de determinação e medida da pena ou a sua atenuação especial. Será que um juiz menos experiente, pressionado pela urgência, conseguirá analisar de forma adequada a personalidade do agente, a motivação do crime, determinadas circunstâncias ligadas ao facto, etc?

Um erro de apreciação, uma menor qualidade de decisão, podem ser pouco importantes num crime de menor gravidade. Num crime de maior gravidade, isso pode representar a diferença entre duas situações muito diferentes, demasiadamente diferentes.

Por último: o populismo que tantas vezes sustenta as posições de determinado partido político, uma vez mais se revelou estéril e destituído de qualquer conteúdo aceitável, servindo apenas para alimentar o chamado "discurso do taxista". Que um cidadão menos informado defenda, sem sequer disso suspeitar, soluções erradas e contraproducentes, eu compreendo. Que políticos com responsabilidade na comunidade incentivem - deliberadamente - esses disparates, isso é que já me parece fortemente condenável.

Naturalmente, quando falo em disparates não me refiro à defesa de uma opinião contrária, que eu respeito, mas sim à fundamentação intencionalmente absurda e desconchavada dessa opinião contrária.
José Pedro Faria (Jurista) , 22 Agosto 2013
Deve ler-se o argumentaria jurídico do TC
Ao "contribuinte espoliado" queria apenas lembrar que o que interessa é o argumentario do TC; o que diz a deputação e os jornaleiros ao serviço vale juridicamente zero.
Francisco do Torrão , 22 Agosto 2013
...
ILUSÕES:
--desde quando um juiz singular "dá menos garantias"? Já agora, acabava-se com a treta: a população de Valença é discriminada em relação à de Aveiro porque nesta comarca há "juizes mais experientes"...
--o direito de defesa nada tem a ver com a composição do tribunal; tinha quando não havia gravação;
BLAST , 23 Agosto 2013
...
Ainda bem que o TC julgou inconstitucional essas normas.

Afinal, com um processo sumário não se consegue inventar com calma um esquema, instruir devidamente as testemunhas e cobrar honorários a valer.

A coisa quer-se demorada, grátis e com garantismos incríveis para o arguido.
Contribuinte espoliado , 23 Agosto 2013
Sempre os mesmos
Só a "rapaziada" do MP teima nessa coisa dos sumários "de qualquer maneira"... Um dia ainda defenderão a extinção do julgamento, por ser uma maçada e uma grande despesa, dispensáveis... Afinal eles (o MP) são "magistrados"...
Tenham juízo. Sugiro-lhes uma cura em direitos fundamentais... (Curso de Verão).smilies/smiley.gif
Francisco do Torrão , 23 Agosto 2013
...
Não é a "rapaziada" do MP que tem de desaplicar uma norma por inconstitucionalidade, o MP é uma magistratura que não tem pretensões nenhumas em ocupar o lugar de Juiz, já o contrário não se pode dizer.
Cautela , 23 Agosto 2013
...
Caro Francisco do Torrão, tem toda a razão e olhe que a defesa pelo MP da extinção do julgamento já se verifica, a favor do aumento dos poderes do MP: lembra-se da "pioneira" defesa das negociações de pena? Não vê o que se passa pelo país com as dezenas de arguidos detidos em flagrante na condução sem carta, condução com álcool (com a sinistralidade rodoviária que grassa pelo país) e outros crimes, e que abandonam os serviços do MP com uma contribuição monetária no âmbito da SPP?
Bodo aos pobres , 24 Agosto 2013
José Pedro Faria (Jurista) - Corporativismo e objetividade têm uma relação difícil
É pena que numa Revista com estas características seja por vezes difícil discutir os assuntos com objetividade e seriedade. E em que situações isso sucede com mais frequência? Quando "entra em campo" o corporativismo.

Tenho dificuldade - que me perdoem - em encontrar um único argumento relevante para a discussão, já que alguns dos senhores comentadores parecem sentir-se atingidos pessoalmente, seja por constituírem tribunal singular, seja por serem do MP, seja por outra coisa qualquer, e preferem distribuir argumentos com uma consistência mais que duvidosa.

Parece-me evidente que um tribunal singular oferece menos garantias ao arguido por diversas razões, não apenas pelos fatores que anteriormente referi, mas também pela falta de um juízo plural - e isso constitui uma insuficiência intrínseca, natural, que não deve melindrar quem quer que seja. Em algumas situações isso não constitui qualquer problema; mas em outras, o aumento da probabilidade de apreciação deficiente torna-se inaceitável.

Quanto à questão da experiência, há diferenças impossíveis de corrigir, por força da própria natureza das coisas. Mas no caso sob análise o problema é perfeitamente suscetível de ser corrigido. E, felizmente, isso irá suceder, a lei irá, com toda a certeza, ser alterada.

Tal como diria Goethe, "Mehr Licht!".
José Pedro Faria (Jurista) , 25 Agosto 2013
...
Quando um iluminado obtém contestação aos seus argumentos, o contra-ataque costuma ser algo do género: eles não sabem porque são corporativistas, ou não percebem porque afinal são benfiquistas, ou são carecas, ou são do PSD, ou são do Alentejo, ou... etc..

Estamos a falar de coisas diferentes certamente.

Qualquer operador judiciário sabe que na realidade não é por a decisão ser assinada por 3 pessoas que será 3 vezes melhor. Isso simplesmente não acontece. A decisão é sempre feita por apenas uma pessoa. Os outros 2 concordam ou não e sugerem alterações e, mesmo neste último caso, raros são os casos em que votam de vencido. Raríssimos são os casos em que se muda o relator.

A justiça da jurisdição cível é diferente da jurisdição penal e em ambas se faz verdadeira justiça, mas naquela a decisão cotetiva na 1.ª instância praticamente desapareceu.

Os recursos existem para alguma coisa e então lá estará a 2.ª instância para proferir uma “decisão coletiva”.

O processo sumário tem razão em existir tal como foi delineado nesta última alteração legislativa.
A clareza da prova demanda que não se obrigue ao arrastar temporal de um caso que, por natureza, é simples.

Elegeu-se como (principal) razão para julgar inconstitucional a recente alteração legislativa a circunstância de o tribunal ser singular e em regra o julgador terá menos experiência. Tretas e mais tretas. Ou melhor, meias verdades., porque se há juízes com 1 ano de experiência (que até são a excepção quando analisamos a matéria em termos puramente quantitativos) também os há com 5, 10, 15, 20, 25 e mais anos de experiência profissional.

Mas se é verdade que há juízes com 5, 10, 15, 20, 25 e mais anos de experiência profissional com nota de Muito Bom, também os há com nota de Suficiente.

Que dizer então da suposta constitucionalidade em se aceitar que pessoas sem nenhuma experiência em julgar sejam admitidas no Tribunal Constitucional e decidam da constitucionalidade de normas que afetam toda a sociedade portuguesa.

Como admitir que apenas 13 juízes do Tribunal Constitucional decidam da constitucionalidade de normas absolutamente fundamentais para a sociedade portuguesa afetando assim mais de 10 milhões de portugueses.

Que dizer então da suposta constitucionalidade em se admitir que um juiz que tenha exercido duas décadas seguidas num juízo cível na 1.ª instância e depois seja colocado numa secção criminal na 2.ª instância.

Que dizer então da suposta constitucionalidade em se admitir que pessoas sem nenhuma experiência em julgar (professores de direito e outros parecidos) sejam admitidas no Supremo Tribunal de Justiça.

Brincamos.
Contribuinte espoliado , 25 Agosto 2013
José Pedro Faria (Jurista) - Agradecimento ao Sr. Comentador "contribuinte espoliado"
O nosso caríssimo comentador "contribuinte espoliado", consegue o pleno: defende uma posição, mas fundamenta a orientação contrária. Vejamos:

«Qualquer operador judiciário sabe que na realidade não é por a decisão ser assinada por 3 pessoas que será 3 vezes melhor. Isso simplesmente não acontece. A decisão é sempre feita por apenas uma pessoa. Os outros 2 concordam ou não e sugerem alterações e, mesmo neste último caso, raros são os casos em que votam de vencido. Raríssimos são os casos em que se muda o relator ».

Esse seu parágrafo, no fundo, explica uma das razões por que as garantias dos arguidos são superiores no tribunal coletivo. Poderia V. Ex.ª juntar mais argumentos, mas esses são suficientes. Exatamente, Os "outros 2 concordam ou não e sugerem alterações".

Ora aí está algo que o juiz singular apenas poderá fazer se padecer do chamado "transtorno dissociativo de identidade". Resta agradecer ao comentador "contribuinte espoliado" o seu excelente argumento, que eu subscrevo.

Raramente há troca de relator. Certo. Mas o que releva não é isso, foi o que V. Ex.ª escreveu antes, como é óbvio.

Quanto à questão da experiência, parece que um dos meus parágrafos foi completamente treslido, o que tenho que aceitar, enfim, acontece.

Em todo o caso, o meu agradecimento ao caríssimo comentador "contribuinte espoliado".
José Pedro Faria (Jurista) , 26 Agosto 2013
...
Já o disse na Inverbis e reitero: a medida de acabar com os julgamentos colectivos mete-me nojo, nojo!

Exmo Sr. Dr. José Pedro Faria, mais uma vez muito muito grato pelos seus excelentes comentários!!!

Cumprimentos.


Duas notas:
1. É a liberdade de todos uma coisa de somenos importância? Para uns tantos - felizmente poucos - parece que continua a ser. Lamento pois que alguns bradem por serem espoliados financeiramente e não se apercebam que a tentativa de acabar com os julgamentos colectivos era um modo de espoliarem as Pessoas de uma reflexão de vários Juízes logo na primeira instância quando está em causa a privação da liberdade durante muitos anos.
2. Com esta gente que governa - constantemente a propor medidas contra a Dignidade Humana e inconstitucionais-, daqui a pouco estamos pior do que no tempo de Salazar.
Franclim Sénior , 26 Agosto 2013
Só para cumprimentar, sem meter as mãos na massa
Eh ** eh ....
É sempre agradável encontar velhos conhecidos.
Como está, senhor Professor Faria ? A mulher e os filhos estão bem ?
Vejo que também já incorporou no seu invejável portfolio intelectual algumas leituras sobre psicologia.
Ah, já agora, devo dizer que concordo consigo sobre o tema.
O que é uma daquelas constatações tipo "earthshattering"
Inculto paciente , 26 Agosto 2013
José Pedro Faria (Jurista) - Para o Sr. Comentador Franclim Sénior
O meu agradecimento ao Sr. comentador Franclim Sénior pelas suas palavras, mas na verdade limito-me a transmitir a minha opinião, tal como V. Ex.ª - e muito bem - costuma fazer. Aproveito para o congratular pelas suas sábias reflexões nas duas notas acima publicadas.

...

Quanto ao Sr. comentador "inculto paciente", não tenho o prazer de o conhecer pessoalmente, apenas me recordo vagamente do seu pseudónimo e, infelizmente, não me lembro do conteúdo de anteriores participações de V. Ex.ª, por isso, lamento, mas não entendo o alcance do seu comentário.
José Pedro Faria (Jurista) , 26 Agosto 2013
...
Exmo Sr. Dr. José Pedro Faria:
agradeço, muito comovido, as gentis palavras que me dirigiu!
Cordiais saudações.
Franclim Sénior , 26 Agosto 2013
...
Não há qualquer conteúdo escondido no meu comentário, caro Comentador José Faria.
Apenas que, regressado de férias, abri esta revista digital, deparei-me logo com um comentário sobre como se deve discutir assuntos jurídicos, que termina com uma citação de Goethe, reconheci o seu estilo inconfundível, e dirigi-lhe cumprimentos.
Nada mais.
Renovo os cumprimentos.
Inculto paciente , 26 Agosto 2013

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