A recente decisão do Tribunal Constitucional, que tantos rios de tinta tem feito correr, veio ditar-me o imperativo de propor uma revisão do texto fundamental, de modo a agradar a todos. Não pretendendo discriminar ou prejudicar ninguém, pelo contrário, apenas alterar — aqui e ali — alguns artigos mais controversos. Coisa cirúrgica e verdadeiramente patriótica, como deve ser. Na verdade, apenas pretendo modificar nove artigos da Lei Fundamental, de modo a ajustá-la à realidade e à verdade dos nossos tempos, como tem sido reivindicado por diversas pessoas e até comentadores.
Começando pelo fim, vou direto ao artigo 202.º, que diz: "Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça." Aqui acrescentava a palavra "devagarinho". Já no artigo 182° onde se lê que "o Governo é o órgão de condução da política geral do país e o órgão superior da administração pública", acrescentava a frase "logo a seguir à troika".
No artigo 108.º, onde se lê que "o poder político pertence ao povo", substituía "povo" por "tipos que vieram das jotas".
Penso que, até aqui, estaremos todos de acordo. Vamos, pois a outros capítulos.
No artigo 104.º, onde se lê que "o imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo", acrescentava "e de acordo com o que o Governo precisar".
Já no artigo 62.º que postula a "garantia à propriedade privada", também escrevia "desde que a mesma não faça falta ao senhor ministro das Finanças, para equilibrar as contas".
No artigo 47.°, que é fundamental para a estruturação do Estado (como teriam dito Vital Moreira e Canotilho), onde se escreve; "Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso", aporia apenas estas exclamações: "Ah! Ah! Ah! Não acreditam, pois não, é a brincar, não pensem que alguém vai aplicar isto à letra!"
Já no artigo 34.º, garantindo que "o domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis", teria de colocar duas exceções: "A menos que a violação se dê no Facebook ou noutra rede social, ou seja desencadeada por alguém que transitou do SIS para uma empresa privada, caso em que se assegurará o emprego ao agente envolvido."
O artigo 21.°, que tem claramente a mão (e quem sabe se o pé) de Manuel Alegre, ao postular: "Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública", acrescentava apenas que há, igualmente, o direito de assassinar o rei D. Carlos sempre que nos chatearmos com o Governo.
Por último, e porque os últimos são os primeiros, no artigo 1° "Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei", acrescentaria, para resolver de vez as divergências políticas, que só mesmo perante a lei é que têm essa dignidade assegurada Acrescentaria, pois, o seguinte parágrafo: "Quando não estiverem perante a lei, safam-se como puderem incluindo através da emigração, fuga aos impostos ou greve selvagem."
E, pronto, penso que com estas alterações cirúrgicas teríamos uma Constituição do agrado de toda a gente. Se fosse possível um artigo a dizer que todos temos direito a 3000 euros líquidos por mês também achava bem, mas ainda não percebi em que capítulo meter esse artigo. Talvez nos direitos fundamentais...
Comendador Marques de Correia | Expresso | 20-04-2013
Comentários (5)
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Os acrscentos já cá estão... a obesidar o Estado e a deprimir os portugueses...que olham para o estado em que isto chegou, com um riso amarelo ...
Dizem os cientistas que a água entra em ebulição, em circunstâncias determinadas, quando a temperatura atinge os 100º C.
Só queria saber... alguem tem aí um termómetro para medir a temperatura social?
É que isto está mesmo muito quente ... e não pára de aquecer... em descontentamento e mal-estar!
Se continua...isto estoira!
Como ? Quando?
Não sei...
Gosto das alterações
Mas acrescentaria mais uma para que tudo ficasse claro.
" O Presidente da República é o Presidente do Face Book"
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"O Estado Português contraírá dívida a ser paga a 181 dias, não podendo haver dívida sempre que um Governo tome funções"
"Toda a dívida contraída pelo Estado Português não pode ser paga por nova dívida".
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"A moeda oficial de Portugal é o escudo, e a sua emissão está condicionada à reserva-ouro"