Armando Branco - Mexer no lobby bancário tem sido o "karma" de todos os governos e, não obstante, estar demonstrado que são os grandes responsáveis pela situação da economia nacional, continuam a parar a ação executiva
Como é consabido, a 26 de Junho foi publicada a Lei n.º 41/2013 que altera o Código de Processo Civil, com entrada em vigor a 01 de Setembro passado. Considerando tratar-se de um "Novo" Código de Processo Civil e considerando a vacatio legis, foram várias as formas e tentativas de adiamento de entrada em vigor do apelidado do diploma. Inclusive, tentou o signatário contactar com a Exma. Sra. Ministra da Justiça para o efeito, e demais questões de fundo de foro deontológico e judicial que, acaso conhecessem a pratica processual executiva, certamente não se equacionariam (um singelo exemplo a nível judicial: a penhora vencimento conduz à extinção da instância executiva pela adjudicação das quantias vincendas ao exequente (art.779.º, n.º 4 alínea b) do CPC) -ora, como conseguirá o agente de execução liquidar mensalmente a sanção pecuniária compulsória e os juros a final (art.716.º do CPC) se a penhora de vencimento varia em função do salário auferido pelo devedor.)
Mas, porque trata-se de uma reforma que, em certa medida, renumera o anterior CPC, colocá-la em marcha não é difícil e por conseguinte a vacatio é (ou era suposto ser) manifestamente sufi ciente. E, verdade seja dita, os prazos são para serem cumpridos e os exemplos têm de vir das cúpulas. O que louva-se!
Contudo, tendo esta reforma sido amplamente estudada, discutida e, quiçá, até testada, não se percebe o chorrilho legislativo dos últimos dias de agosto e o marasmo com que tal aconteceu, havendo ainda hoje portarias por publicar.Reconhece-se que este diploma tem, como a generalidade dos diplomas, aspetos positivos que devemos aproveitar e outros menos bons que devemos tentar aperfeiçoar é verosímil.
Só que, mexer no lobby bancário tem sido o "karma" de todos os governos e, não obstante, estar demonstrado que são os grandes responsáveis pela situação da economia nacional, continuam a parar a ação executiva. E agora com a beneplácito da entidade reguladora, o Banco de Portugal.
Senão vejamos: Na penhora de depósitos bancários poder-se-ia ter ido mais longe, nomeadamente, ter-se promovido o bloqueio da conta até ao montante da divida e acrescido mas não, preferiu-se manter a penhora do saldo existente na data da comunicação do agente de execução ao banco. Ora, se calhar em dia mau o resultado pode ser inócuo quando, porventura, no dia imediatamente a seguir a conta até passaria a ter valor sufi ciente para pagamento integral da execução.
Também não se percebe o prazo de 2 dias úteis para a instituição de crédito responder ao agente de execução e porquê? se a comunicação é eletrónica ela é imediata! Porque se não fosse assim, como é que o cidadão poderia chegar ao multibanco e efetuar um levantamento, um pagamento ou uma transferência? Para o legislador terá que esperar 2 dias úteis... não para efetuar um levantamento imediato mas sim para obter uma resposta, curioso... porque será? Para salvaguarda das garantias dos devedores? Ou para umas operações "overnight"?
Historiando: Com o Decreto-Lei n.º 38/2003 de 08.03 a penhora de saldos bancários passaria a ser feita preferencialmente por comunicação eletrónica. Para alcançar tal desiderato, a Câmara dos Solicitadores, a Associação Portuguesa de Bancos e o Ministério da Justiça celebraram em 15.12.2003 protocolo visando a introdução de procedimentos e normas técnicas necessários à concretização da obtenção de informações de contas bancárias e sua penhora no âmbito dos processos de execução Volvidos 10 anos, não obstante, as inúmeras tentativas da Câmara dos Solicitadores em operacionalizar a penhora eletrónica de saldos bancários simulando casos concretos, desde 2006, com determinada Instituição de Crédito mas, tal penhora eletrónica ainda hoje não é possível.
E, não se diga que a Câmara dos Solicitadores não tem feito nada, porque não será verdade, basta ver o comunicado do Sr. Presidente da Câmara em resposta à publicação do Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados do pretérito dia 3 de setembro (não é que fale em atos materiais executivos concretos, porque quanto a estes zero, ou até mesmo em consultas ao Banco de Portugal mas...)
Só que, hoje vigora o "novo" Código de Processo Civil que diz no seu artigo 780.º, "A penhora que incida sobre depósito bancário ... é feita por comunicação eletrónica realizada pelo agente de execução...".
Também com esta reforma o Banco de Portugal volta a intervir na ação executiva, pois se antes de 2003 difundia pelas instituições de crédito o pedido de penhora, agora passa a informar o agente de execução quais as instituições legalmente autorizadas a receber depósitos em que o executado detém conta. Será de todo conveniente referir que não podem ser olvidados os certifi cados de aforro ou certifi cados do tesouro, os seguros de capitalização, planos poupança e demais produtos ao aplicações fi nanceiras que não estarão na esteira do Banco de Portugal e que poderão servir de escape aos devedores relapsos.
Contudo, nem o Banco de Portugal informa o agente de execução quais as instituições onde o executado tem conta, nem o agente de execução consegue realizar a penhora.
Ou seja, por manifesta inoperacionalidade dos sistemas informáticos envolvidos e a falta de resposta no prazo legalmente estatuído aos muitos pedidos de informação nos termos do n.º 5 do art.749.º do CPC à entidade reguladora do sector bancário (Banco de Portugal), a Acção Executiva está, nesta e noutras matérias, há mais de 20 dias, PARADA!
Trata-se de problema grave e que está a afetar decisivamente a efi cácia da reforma executiva do "novo" código de processo civil por tornar inofensiva e inútil aquela que era a mais mordaz e temida das penhoras!
Armando Branco
Agente de Execução e Antigo Presidente do Colégio de Especialidade de Agentes de Execução
Público | 22-09-2013, p. 19
Comentários (3)
Exibir/Esconder comentários
...
Foi dito acerca de uma crise multifacetada
- Mas mudasse os tempos mudasse as vontades, hipoteticamente falando num futuro próximo que não meramente utópico, mas veemente necessário, tempo esse, em que no seu espaço existira uma entidade própria e especificamente legitima, para fiscalizar e proceder em conformidade com certas e determinadas circunstancias, que hoje já todos dizemos se revelam ilícitas, e constitutivas em "parceria publica e privadas" da génese de uma crise multifacetada e ramificada em diversos domínios materiais e mesmo espirituais, que já enraizada e contundente, se torna cada vez mais emergente, a ver vamos.
E quando os bancos fazem penhoras ilegais
E quando os bancos penhoram saldos inferiores ao salário minimo nacional ?
E quando os bancos depois de receberem os valores das penhoras e com ações executivas suspensas e impugnadas continuam com as penhoras ?
Não percebo nada de direito... mas percebo de justiça e quando alguém diz que deve, deve provar que alguém deve e não retirar e depois quem ficou sem o valor tem de andar anos para reaver o dinheiro... quem protege um cidadão nestes casos? onde está o direito a defesa ?