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REVISTA DE 2013

O que é que ainda falta para a revolta geral?

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Miguel Graça Moura - Cheguei ao fim da paciência, indignado. Vocês ainda não?

1. As mentiras mais chocantes.
"Não é necessário subir impostos, nem mexer nos subsídios" (2011, campanha eleitoral). "Recomeçaremos a crescer em 2013" (2011). "O reequilíbrio das contas públicas far-se-á em 2/3 pelo lado da despesa e em 1 /3 pelo lado da receita [impostos]" (2011). "O empobrecimento é a única alternativa para o reequilíbrio das contas públicas, porque temos vivido acima das nossas possibilidades" (2011) recentemente, já o autor dizia que, pelo contrário, "nenhum político quereria tal destino para o seu povo"].

2. As consequências mais gravosas.
Dois anos depois: o défice pouco diminuiu, já estamos muito longe do previsto inicialmente, e ainda vamos ter de mendigar junto da troika para que nos deixe fixá-lo ainda mais acima. A dívida pública não cessa de crescer (já ultrapassou os estratosféricos 130% do PIB, e já toda a gente sabe que ela deixou de ser pagável - e muito menos aos juros atuais).
O desemprego explodiu para valores vergonhosos e desumanos. A economia caiu a pique, as falências continuam, o crédito malparado atingiu valores astronómicos. As tragédias humanas estão à vista diariamente. A taxa de suicídios triplicou. O investimento externo - tão apregoado - é inexistente.
A "competitividade" portuguesa baixou quase 20 pontos no ranking internacional. A classe média portuguesa - a que ainda sustentava alguma economia interna - acabou, exangue. Estamos a transformar-nos em "chineses" (escravos: por este andar, já só nos resta servir cafés aos alemães, holandeses e outros povos da Europa rica que quiserem vir cá passar férias). Acima de 100 000 dos nossos jovens mais qualificados já emigraram, e muitos mais se lhes seguirão - este é talvez o maior crime da trupe de incompetentes que nos governa.
Já nem falo na cultura: com governantes tão parolos que nem sabem para que é que ela serve - e os fortíssimos estímulos que poderia trazer à economia -, o panorama não podia ser senão da maior indigência - revoltante num país que tinha tanto para dar aos outros, como já deu no passado. (Mas se um governante nunca pôs os pés num concerto, num teatro, num museu ou numa livraria - como é que vai saber para que é que serve a cultura?)

3. Os factos mais vergonhosos.
Já somos o País mais desigual da Zona Euro. Só há um culpado pelo escândalo BPN, e nenhum pelo BPP, nem pelas PPP, nem pelos swaps, onde se queimaram milhares de milhões de euros. A pornografia da evasão fiscal das grandes empresas continua impune (só as empresas-fantasma na Holanda permitem "economizar" muitas centenas de milhões).
O descalabro da Justiça mantém-se - e até se agravou: já não é só o atraso - que a transforma em injustiça - e a ineficiência, agora temos também a corrupção e a incompetência (desde as sentenças que premeiam o alcoolismo no trabalho às que toleram a violência doméstica), e sobretudo a incapacidade para afrontar os poderosos.
Esta subserviência e reverência perante os ricos é, aliás, outro traço atávico do provincianismo "ruga" no que ele tem de mais reles e abjeto.
Falta-nos grandeza, carácter, princípios. (Mas é claro que aqueles só se adquirem com educação e cultura, portanto tinham de ter ido pelo cano juntamente com o apagamento destas.)

4. O erro mais crasso.
O crescimento económico só se obtém com dinheiro a circular (as nossas exportações só representam 1 /5 do PIB; o resto é mercado interno). Se se restituir às pessoas poder de compra, elas consomem-e então aumentam-se as receitas de IRS, IRC, IVA e demais impostos indiretos (combustíveis, energia, comunicações), sobem as contribuições para a Segurança Social e baixam os encargos desta com o desemprego (+ circulação de dinheiro = + presas = - desemprego). É por que a austeridade - que está a arrasar a Europa do Sul enquanto enriquece a do Norte - é contraproducente. (Ela é ideológica, não científica.)
E se quem nos empresta a 7 % se financia a 0,5 % (ou ainda menos), então toma-se um intermediário nocivo - e, no limite, um usurário. Solidariedade europeia seria emprestar a 0,5 % a quem é mais frágil, e eventualmente a um juro um pouco mais alto a quem pode pagá-lo.

5. A falácia mais escandalosa.
A "reforma" do Estado, apregoada até ao enjoo, continua por fazer (redução dos deputados, dos municípios, das empresas municipais, dos institutos e fundações excedentários, das forças armadas, da burocracia asfixiante; fim das reformas de quem não tem carreira contributiva completa [políticos, administradores da CGD e do BdP,etc.].

6. O diagnóstico mais triste.
Portugal está deprimido, acabrunhado, devastado. Não quero o meu país resignado a esta "apagada e vil tristeza". Cheguei ao fim da paciência, indignado. Vocês também?
Então unamo-nos para correr com esta corja de fanáticos incompetentes e insensíveis à miséria em que lançaram o nosso país. Se os deixamos mais dois anos à solta não restará dele senão ruínas.

Miguel Graça Moura | Diário de Notícias | 24-09-2013

Comentários (11)


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...
Este Miguel Graça Moura será o mesmo que, alegadamente como usa dizer-se, metia as despesas de lingerie - entre outras - nas contas da Orquestra Metropolitana? Frei Tomás...
Mário Rama da Silva , 24 Setembro 2013
José Pedro Faria (Jurista) -bull's eye!
Confesso que fiquei positivamente surpreendido com este artigo de Miguel Graça Moura. Trata-se de uma espécie de grito de raiva e de desespero, mas que é perfeitamente compreensível.

A adoção de políticas ultraliberais na Europa tem-se mostrado desastrosa para os povos de muitos países, especialmente dos países periféricos. Como espécie de bónus a essas políticas manifestamente erradas, surgem a mentira e os argumentos falaciosos (cfr. ponto 1. do artigo).

Os resultados desta política absurda e aberrante do nosso governo estão bem presentes no ponto 2. Vivemos em clima de pré-catástrofe social, mas parece que nem o reconhecimento público do ex-ministro Vítor Gaspar de que estas políticas são completamente erradas, parecem demover os seus promotores e apoiantes.

Repare-se como a presença do Estado é constantemente criticada, deseja-se um "Estado mínimo". Mas quando as entidades privadas, vítimas da sua ganância, erros crassos de gestão ou quando adotam práticas fraudulentas, se veem em dificuldades, eis que logo apelam ao "Estado Máximo". Sucedeu com o BPN, BPP ou BANIF. Ou então são os empresários nacionais (que em certo estudo foram considerados, em média, os mais incompetentes da Europa) que, à mínima fatalidade, logo se encostam ao Estado, que eles tanto abominam.

Uma frase importante: " [...] se quem nos empresta a 7 % se financia a 0,5 % (ou ainda menos), então toma-se um intermediário nocivo - e, no limite, um usurário". Estes são os nossos grandes "amigos". Definitivamente, podemos dispensar os inimigos, não precisamos deles.

Por outro lado, tem-se falado muito de exportações. A verdade nua e crua (a que eu já me referi anteriormente neste espaço) é esta: "as nossas exportações só representam 1 /5 do PIB". Qualquer propaganda relacionada com um pequeno aumento das mesmas, é quase irrelevante do ponto de vista económico-financeiro.

Refere-se o articulista à "reforma do Estado". Mas até agora a "reforma do Estado" é constituída exclusivamente por ameaças de despedimentos.

Está cabalmente demonstrado que não há trabalhadores públicos a mais (aliás, eles têm vindo, consistentemente, a cair. Ninguém pode ter qualquer dúvida relativamente a isso. Todas as estatísticas o provam tranquilamente. Reforma a sério seria (também) fazer um levantamento dos funcionários existentes e procurar redirecionar aqueles que estão a mais em alguns organismos para outros onde eles fazem falta. Mas este Governo, talvez o mais incompetente que Portugal já conheceu, insiste em soluções absurdas e iníquas que nada resolvem. Isto não é reforma do Estado, é a destruição do Estado e da classe média.

Frases a reter:

"com governantes tão parolos que nem sabem para que é que [a cultura] serve..."

"unamo-nos para correr com esta corja de fanáticos incompetentes e insensíveis à miséria em que lançaram o nosso país. Se os deixamos mais dois anos à solta não restará dele senão ruínas".

Como diriam os nossos amigos americanos: "bull's eye!". Talvez nós, portugueses, pudéssemos acrescentar: "quem fala assim...".
José Pedro Faria (Jurista) , 24 Setembro 2013
Em 29 de Janeiro de 2013, o maestro foi condenado
Em 29 de Janeiro de 2013, o maestro foi condenado a uma pena de cinco anos de prisão suspensa por igual período de tempo e a pagar 690 mil euros à entidade gestora da Orquestra Metropolitana de Lisboa e outros 30 mil à Câmara de Lisboa. O acórdão determina que se parte desta verba não for paga no prazo de um ano, o maestro será obrigado a cumprir pena de prisão. O colectivo de juízes deu como provados os crimes de peculato e falsificação de documentos.
maestros , 24 Setembro 2013
...
"Então unamo-nos para correr com esta corja de fanáticos incompetentes e insensíveis à miséria em que lançaram o nosso país. Se os deixamos mais dois anos à solta não restará dele senão ruínas".

Bibó PCP, bibó comunismo português, que é a única alternativa a este estado de coisas. Bibá ditadura do proletariado. PCP, PCP, PCP, PCP.
Apre!
Alcides , 24 Setembro 2013
...
Ficámos todos a saber que uma pessoa que eventualmente cometeu um erro na vida não tem direito a exprimir a sua opinião. Ou seja: ataca-se a pessoa, mas não as suas ideias. Atacar os argumentos? Eles não saberiam como, por isso atacam o seu passado. Claro que o passado dos comentadores podem ser do mais arrepiante que há, mas esse fica bem escondidinho, pois claro.
Não há paciência , 24 Setembro 2013
...
A cáfila

A cáfila governa e desgoverna
Com a mais descarada das vergonhas
Arquitectos das obras mais medonhas
Que nos roubam como ratos de caserna

Figuras de máscara moderna
Anquilosados, vis, pestes, peçonhas
Simulam sorridentes suas fronhas
Semeando a miséria hodierna

Vota nele o povo embrutecido
Enganado num circo infernal
E mesmo assim ainda agradecido

e*********os, cáfilas do mal
Estrume bafiento apodrecido
Que enoja e malbarata Portugal



miro , 25 Setembro 2013
...
"Ficámos todos a saber que uma pessoa que eventualmente cometeu um erro na vida não tem direito a exprimir a sua opinião."

Não é um erro na vida. O maestro é o exemplo vivo do que escreveu...sobre a delapidação de recursos públicos avultados ( quase um milhão de euros) em futilidades.
Se fosse ministro teria autorizado todas as PPP´s e mais algumas. Se fosse técnico das empresas públicas teria incentivado todas as swaps, etc.

E digo isto com pena porque aprecio o lado intelecutal do maestro que foi músico no tempo do Pop Five Music Incorporated e foi o autor da música instrumental do indicativo do programa Página Um, da Renascença, no início dos anos setenta.
José , 25 Setembro 2013 | url
...
É preciso ter topete!!!!!!!!!
Admirado , 25 Setembro 2013
Em 29 de Janeiro de 2013, o maestro foi condenado, seriedade e credibilidade , nao ha paciencia
nao ha paciencia

se um opinador num jornal sobre crises financeiras e a alegada má justiça foi condenado há poucos meses por crimes de peculato e falsificação de documentos, isso é relevante para apurar da seriedade e credibilidade das suas ideias e de seus ideais.
abcdef , 25 Setembro 2013
...
De todos os comentários que li supra, sobressai o do José, que põe, não o dedo, mas o braço todo na ferida. Não li o acórdão que condenou o articulista, mas se o que se diz nele é o que aqui vem transcrito, então o Maestro é um grande brincalhão. Folgo em ver que há quem consiga manter o sentido de humor, mesmo em tempos miseráveis.
Imagino o tio Adolfo, ou o Himmler, ou o Eichmann, ou outro destacado dirigente nazi a escrever um artigo para o jornal a condenar o genocídio e o desrespeito pelos direitos humanos. Seria certamente um artigo muito bem escrito, e muito bem pensante iria a correr subscrevê-lo.
E no entanto...
porém...
todavia...
contudo....
Hannibal Lecter , 25 Setembro 2013
...
Infelizmente não posso explicar melhor aqui a verdade sobre o caso Miguel Graça Moura.

Por isso, limito-me a transcrever as regras desta Revista: «Não serão publicados [...] os textos que em vez de comentarem o objecto do item, limitam-se a fazer observações contrária à Pessoa autora do artigo publicado».

Pois é... mas foram mesmo publicados.
Não há paciência , 25 Setembro 2013

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