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REVISTA DE 2013

'Swaps' e especulação

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Fernanda Palma - Os contratos especulativos de seguro de crédito configuram algum crime quando são celebrados com dinheiros públicos e implicam perdas avultadas? A pergunta tem sido formulada a propósito das empresas públicas portuguesas, cujas potenciais perdas com as chamadas operações de 'swap' (troca) são já estimadas em perto de três mil milhões de euros.

Estes contratos, celebrados com instituições de crédito, destinam-se, pretensamente, a proteger as empresas das oscilações das taxas de juro, trocando uma taxa variável por uma taxa fixa. Todavia, em conjunturas recessivas – de deflação ou abrandamento da inflação –, em que as taxas de juro diminuem, as empresas ficam amarradas a taxas fixas mais altas.

Para o senso comum, a questão coloca-se, então, nos seguintes termos: quem põe em alto risco dinheiros públicos, conduzindo o Estado a negócios ruinosos, deve ser responsabilizado penalmente pelos danos causados? Os gestores públicos ou mesmo os responsáveis políticos que tutelam as empresas cometem algum crime e são passíveis de responsabilidade penal?

Os crimes que poderiam estar aqui em causa seriam, porventura, a administração danosa e a violação de normas de execução orçamental. É duvidoso, porém, que estas incriminações possam abranger comportamentos que recorrem a mecanismos de gestão privada próximos do jogo, mas que são relativamente comuns no âmbito do setor empresarial do Estado.

Estas situações assentam numa 'racionalidade' que era característica dos mercados antes da crise e se justificava pela lógica liberal e pela ausência de regulação. Mais do que discutir a responsabilidade dos gestores que apostaram no risco, devemos invocar a alteração das circunstâncias, que autoriza a redução ou conversão de contratos segundo juízos de equidade.

A responsabilidade penal dos gestores só seria concebível a título de negligência, que não é punível nestes crimes, e a responsabilidade dos governantes não passaria de uma culpa 'in vigilando'. Quem aderiu a esta lógica confiou em que o risco não se concretizaria, tendo sido 'defraudado' pela crise. E o Tribunal de Contas também não reagiu, tolerando os 'swaps'.

O Direito Penal não resolve estes problemas, que são sistémicos, constituindo apenas uma manobra de diversão. É necessário apurar se os bancos, que se aproveitaram da situação e reclamam créditos usurários, estão dispostos a agir de boa-fé ou se se comportam como especuladores. Para o futuro, é indispensável instituir mecanismos de regulação eficazes.

Fernanda Palma | Correio da Manhã | 05-05-2013

Comentários (4)


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...
Para o futuro ?
E para o passado - ficamos nas águas da incerteza, com o erário público a pagar as aventuras do bloco central ?
FBC , 06 Maio 2013
As "memórias" comunistas com esta senhora não seriam possíveis...
smilies/grin.gifsmilies/grin.gifsmilies/grin.gif
O omo lava mais branco...
Lusitânea , 06 Maio 2013
...
A senhora professora está a afirmar que o Direito penal não tem soluções para a gestão aventureira de fundos públicos e para a assunção de dívidas de milhares de milhões de euros que vão onerar os impostos dos cidadãos ?
Compreendi bem, ou alguma coisa me está a escapar ?
FBC , 08 Maio 2013
...
Este meu comentário segue com algum atraso, pois já foi escrito há alguns dias, uma vez que tenho tido problemas estranhos no acesso à InVerbis, com constantes mensagens de erro e/ou bloqueios, situação já reportada ao Sr. Administrador, que me respondeu de forma pronta e amável, e que agradeço. Esperemos que desta vez o meu comentário fique visível. Outros que eu entretanto fiz, perderam-se para sempre, infelizmente (infelizmente, do meu ponto de vista, evidentemente!). Enfim, coisas da informática...

Escreve Fernanda Palma que "[m]ais do que discutir a responsabilidade dos gestores que apostaram no risco, devemos invocar a alteração das circunstâncias, que autoriza a redução ou conversão de contratos segundo juízos de equidade".

Está enganada.

A D. Teodora Cardoso, que, como é sabido, percebe tanto de Direito como eu percebo de lagares de azeite, diz que "essas operações têm um fundamento jurídico fortíssimo (!) naquilo que [...] pode vir a ser posto em causa", E acrescenta que a probabilidade dos contratos serem anulados em tribunal é "baixa". Probabilidade? Isso faz lembrar uma espécie de sorteio, com umas bolinhas coloridas. Esperemos é que não sejam como aquelas bolas aquecidas ou que vibram, conforme (diz-se) sucede nos sorteios dos campeonatos de futebol.

Tal como já aqui defendi algumas vezes, é, para mim, irrelevante a formação académica das pessoas. Importa-me tanto, por exemplo, que um licenciado em Direito se pronuncie sobre questões económicas, como que um economista alvitre sobre um qualquer princípio ou regra jurídica, desde que fundamentem devidamente as suas posições. Não é o caso da D. Teodora.

Certo, certo, é que esta questão dos swaps está ligada ao fenómeno mais global da desregulação financeira, própria do liberalismo económico, que está a arrasar as economias nacionais e a condenar os povos à miséria. A economia está dominada pelas jogadas financeiras completamente desligadas da economia real, transformando o planeta numa espécie de gigantesco c_sino, onde os únicos garantidos perdedores são os povos (mesmo sem jogar).

Fernanda Palma não quer ouvir falar de "responsabilidade dos gestores que apostaram no risco". e diz que "[a] responsabilidade penal dos gestores só seria concebível a título de negligência". Pois sim, pois sim, mas... eu não estou assim tão seguro. Todos sabemos o que significa dolo eventual, certo?

Termina bem, contudo, Fernanda Palma: "Para o futuro, é indispensável instituir mecanismos de regulação eficazes". Rema, todavia, contra um fortíssima maré ultraliberal.
José Pedro Faria , 08 Maio 2013

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