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REVISTA DE 2013

A "internacionalização" do Tribunal Constitucional

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Celeste Cardona. Nos tempos mais recentes ocorreram dois fenómenos da maior importância que revertem para o conceito de internacionalização. Internacionalizamos a nossa mão- de- obra qualificada e jovem. Segundo os dados recentemente divulgados, já vai em mais de 120 mil o número de jovens que rumaram a outras paragens em busca de emprego e de melhor qualidade de vida. Como eu gostaria que a internacionalização de que falo assumisse uma outra vertente e outros sujeitos: as empresas, os bens, os serviços. Mas não! Mas também o nosso Tribunal Constitucional foi internacionalizado!

Até há pouco tempo o Tribunal Constitucional, enquanto órgão jurisdicional de soberania, pautava a sua intervenção pela discrição, serenidade e tranquilidade. Ás suas decisões traduziam um pensamento jurídico-político, em regra aceite pela comunidade, sem sobressaltos e sem grandes discussões teóricas. Cumpria a sua missão que é simplesmente a de verificar se as leis aprovadas pelo poder político -Assembleia da Republica e Governo estavamconformes com a Constituição da República.

Não tardou, porém, muito tempo sem que se desse início a uma discussão curiosa mas, a meu ver, destituída de qualquer fundamento e que era a de saber se o que estava mal era a Constituição, advogando-se assim a sua revisão, se, pelo contrário, o que estava em causa, era a" interpretação" que dela faziam os juizes do Tribunal.

A maior polémica tem-se centrado, sobretudo, na eventual e "errada" interpretação que os juizes tem vindo a fazer da Constituição. Mas, se virmos bem, o que sucede é que as mais recentes decisões de declaração de inconstitucionalidade de certas normas são fundadas em princípios que são universais e, por isso, consagrados em todas as Constituições pelo mundo fora. Neste domínio, ainda não vi nem ouvi ninguém a propor a revisão da Constituição para "abolir" tais princípios que traduzem valores das modernas sociedades e que resultaram de uma longa história que envolveu as sociedades e os homens: a limitação, através da Constituição, do poder político!

Mas, eis senão quando, para além das discussões "em família" também a nível internacional verificamos que o Tribunal Constitucional passou a ser um órgão de soberania internacionalizado. Fenómeno curioso, mas sobretudo perigoso!

Veja-se as recentes declarações, que julgo terem sido proferidas pelo presidente da Comissão Europeia, no sentido de "avisar" Portugal de que devia tomar precauções no que diz respeito às decisões do Tribunal Constitucional pelos eventuais riscos que as mesmas podiam assumir para o cumprimento das metas definidas pela troika.

Segundo interpreto tais declarações, o nosso país, para além dos riscos de não crescimento, dos riscos do aumento ou estagnação dos valores do desemprego, do risco financeiro, do risco político, tinha agora um outro e diferente risco: o risco constitucional!

Se não fosse trágico, até daria para falar deste assunto com alguma ironia. O Tribunal Constitucional Alemão parece estar prestes a decidir sobre matéria que assume consequências a nível da União, nomeadamente quanto à apreciação que fará dos meios que têm vindo a ser utilizados pelo BCE à luz da Constituição alemã!

Até admito que tenha estado distraída, mas não me parece que assim seja. Sou atenta ao que se passa à minha volta, e não dei por qualquer referência ou notícia sobre os efeitos - altamente negativos - para os diversos países comunitários de uma decisão alemã que venha a considerar inconstitucionais tais meios aplicados, a nível europeu, pelo BCE.

Ao que parece, todas as instituições nacionais e comunitárias têm respeito pelas decisões que vierem a ser proferidas pelo Tribunal Constitucional da Alemanha.

O que leva então a que o nosso Tribunal Constitucional seja diferentemente tratado interna e externamente? A resposta que for dada a esta pergunta encerrará inevitavelmente uma apreciação negativa sobre nós e as nossas instituições democráticas.

É tempo de, no caso concreto, não permitir a" internacionalização" de potenciais decisões de um órgão que ainda traduz soberania!

Celeste Cardona | Diário de Notícias | 28-11-2013

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