Há um ano, o Governo não apresentou defesa da constitucionalidade do Orçamento no Palácio Ratton - onde os cortes foram chumbados. Desta feita, as Finanças dizem-se preparadas.
Preparado para uma mais que certa fiscalização do Orçamento do Estado no Tribunal Constitucional, o Governo municiou-se já de pelo menos um parecer jurídico para assegurar a sua defesa do documento, apurou o SOL.
No Ministério das Finanças, a questão é tratada com pinças e em apenas duas palavras: «Preparámo-nos juridicamente». E sem confirmação oficial do pedido de pareceres.
Há um ano não foi assim. Confiante de que não havia razões para a inconstitucionalidade dos cortes de subsídios no Estado, Gaspar abdicou do direito de defesa no tribunal. Veio o chumbo e, com ele, a argumentação de que nem esse direito de defesa tinha sido invocado: «O Governo não estava impedido de apresentar ao Tribunal Constitucional as suas razões quanto à não inconstitucionalidade das normas em causa. Não o fez», escreveu Carlos Pamplona de Oliveira, um dos juizes que votou pela inconstitucionalidade das normas - e que tinha sido nomeado pelo PSD.
Já no primeiro corte de salários no Estado, executado em 2011, o Governo de José Sócrates apresentou um parecer justificativo. Era de Jorge Miranda. O corte passou no TC.
Na maioria PSD-CDS, desta feita, ninguém ousa desvalorizar a hipótese de um novo chumbo. No dia seguinte à aprovação do Orçamento, um artigo corria de boca em boca pelos corredores da Assembleia. Assinado por Bagão Félix, apostava que o corte de pensões não passaria no Palácio Ratton. «Há esse risco», admitia um deputado da maioria. Mas há quem mostre maior confiança, quer pela maior «equidade» dos cortes entre Estado e sector privado, quer pelas mudanças na composição do próprio TC.
E nem as hipóteses de um pedido de fiscalização preventiva pelo Presidente da República são liminarmente afastadas. Na entrevista à TVI, Passos Coelho mostrou cautelas redobradas, assegurando que do Governo não virá nada que possa ser considerado «um condicionamento do Presidente da República» - com quem assegurou ter «um relacionamento de excelência».
Enquanto isso, no PS abriu a corrida às assinaturas para voltar a mandar o Orçamento para o TC. Bastou uma frase de António José Seguro, na terca-feira (dizendo que a luta do PS contra o OE é política), para que os críticos do líder se desdobrassem em contactos internos. Objectivo: duplicar as 17 assinaturas do ano passado, todas à revelia da direcção.
Desta feita, porém, a direcção da bancada nada fará para travar os deputados que queiram travar o Orçamento. Mais prudente, Carlos Zorrinho diz apenas que «este é o tempo do PR».
David Dinis | Sol | 30-11-2012
Comentários (3)
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Qual foi asociedade de advogados que fez o parecer? E quanto (nos) custou mais este "ajuste direto"?
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«Após alguma reflexão sobre o assunto, ocorreu-me que talvez fosse importante que alguém apresentasse Vítor Gaspar a um ser humano. Podia ser um encontro discreto, a dois, só com um terceiro elemento que começasse por fazer as honras: "Vítor, é o ser humano. Ser humano, é o Vítor." E depois ficavam a sós, a conviver um bocadinho.
Perspicaz como é, o ministro haveria de reparar que, entre o ser humano e um algarismo, há duas ou três diferenças. O ser humano comparece com pouca frequência nas folhas de excel, ao contrário do algarismo. E o algarismo não passa fome nem morre, ao contrário do ser humano. É raro encontrarmos uma lápide, no cemitério, com a inscrição: "Aqui jaz o algarismo 7. Faleceu na sequência de um engano numa multiplicação. Paz à sua alma." Mal o ministro tivesse percebido bem a diferença entre o ser humano e os números, poderia voltar às suas folhas de cálculo. Admito que se trata de uma experiência inédita, mas gostaria muito de a ver posta em prática.
Houve um tempo em que quem não soubesse de economia estava excluído da discussão política. Felizmente, esse tempo acabou. Os que percebem de economia são os primeiros a errar todos os cálculos, falhar todas as previsões, agravar os problemas que pretendiam resolver. As propostas de um leigo talvez sejam absurdas, irrealistas e inexequíveis. Não faz mal: as do ministro também são. Estamos todos em pé de igualdade. A realidade não aprecia economistas. Se um chimpanzé fosse ministro das Finanças, talvez a dívida aumentasse, o desemprego subisse e a recessão se agravasse. Ou seja, ninguém notava.»
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