Procuradoria-Geral da República diz que só a Polícia Judiciária pode investigar crimes informáticos e contrafacção de software. Apreensões da ASAE têm de ser comunicadas à PJ senão são nulas.
A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), cuja actividade operacional de fiscalização surge relacionada amiúde com a apreensão de material informático diverso como computadores, CD e DVD de filmes, música e programas contrafeitos em feiras, não pode, afinal, pesquisar dados nesses mesmos suportes. E mesmo a apreensão apenas pode ser feita em caso de urgência e em flagrante delito. O aviso é da Procuradoria-Geral da República, que, num parecer ao qual o PÚBLI- CO teve acesso, lembra que a investigação dos crimes informáticos é da exclusiva competência da PJ, de acordo com a Lei da Organização da Investigação Criminal.
"A actuação da ASAE no âmbito de tais crimes está limitada à prática dos actos cautelares e urgentes, quer para obstar à sua consumação, quer para assegurar os meios de prova. No decurso das suas acções de fiscalização de actividades económicas, deve proceder à apreensão dos suportes físicos autónomos de computadores (CD-ROM, pen disks, disquetes, etc...) que contenham gravados programas informáticos objecto de contrafacção, no sentido de constituírem reprodução não-autorizada ou licenciada", refere o parecer recente do Conselho Consultivo da PGR, acrescentando que, nesses casos, a ASAE deve obrigatoriamente comunicar a apreensão à PJ e ao Ministério Público (MP) "em prazo não excedente a 24 horas".
Caso contrário, a actuação da ASAE pode ferir de ilegalidade os autos e processos-crime levantados. "A realização da diligência deverá ser, sob pena de nulidade, imediatamente comunicada à autoridade judiciária para efeitos de apreciação e validação", sublinha a PGR.
O parecer é taxativo, considerando que "está vedada à ASAE a pesquisa de dados informáticos armazenados em sistemas informáticos". Foi a própria ASAE, aliás, que requereu, no início do ano, o parecer, alegando "diferentes entendimentos por parte da magistratura do MP" e considerando existir uma diferença entre "reprodução ilegítima de programa protegido" e "crime informático".
"Este tipo de crime não se confunde com o comummente designado crime informático, que se refere a toda a actividade onde um computador ou uma rede de computadores é utilizada como uma ferramenta, uma base de ataque ou como meio de crime. Apenas se procura pesquisar os programas instalados e que não possuam a necessária licença. Para tal, afigura-se-nos não ser necessário obter a autorização da autoridade judiciária competente", alegava a ASAE.
Mas, no parecer, os magistrados do Conselho Consultivo da PGR rejeitam a tese da entidade fiscalizadora e consideram, "sem hesitação", "que o crime de reprodução ilegítima de programa protegido configura um autêntico crime informático, com a acção delituosa a ser levada a cabo utilizando um meio ou objecto informático, no caso, o software", e que essa reprodução ilegítima é crime informático previsto na Lei do Cibercrime.
No longo documento, os magistrados recordam ainda que a ASAE é um órgão de polícia criminal de competência específica, ao contrário da PJ, que se reveste de competência genérica. A ASAE "tem por missão a avaliação e comunicação dos riscos na cadeia alimentar, bem como a fiscalização e prevenção do cumprimento da legislação reguladora do exercício das actividades económicas nos sectores alimentar e nãoalimentar, exercendo funções de autoridade nacional de coordenação do controlo oficial dos géneros alimentícios", alude o parecer. A PGR deixa ainda um aviso ao próprio MP, esclarecendo que os procuradores só podem delegar a execução de actos de inquérito dos crimes previstos na Lei do Cibercrime, "onde se inclui o crime de reprodução ilegítima de programa protegido", à PJ.
O Ministério da Economia e Emprego, que tutela a ASAE, diz, numa nota enviada ao PÚBLICO, que irá acatar o parecer da Procuradoria: "Sendo a ASAE um órgão de polícia criminal, tem de actuar no âmbito do processo-crime sob a direcção e na dependência funcional do Ministério Público, durante a fase do inquérito. Nestes termos, e sendo o Ministério Público a autoridade judiciária com legitimidade legal para prosseguir a acção penal, a actuação futura da ASAE será conforme ao vertido no parecer da PGR que esclareceu as dúvidas existentes sobre a matéria".
Apreensões nos últimos seis anos
Oito milhões de euros em suportes informáticos
A ASAE apreendeu mais de oito milhões de euros em suportes informáticos envolvidos em contrafacção, de acordo com a estatística disponibilizada por aquela entidade no seu site. Os números, que dizem respeito à actividade operacional da ASAE entre 2006 e Janeiro de 2012 referente a usurpação de direitos de autor e reprodução ilegítima de programa protegido, foram levantados quase dois mil processos-crime em operações, investigações e fiscalização em feiras.
Nessas acções, os inspectores da ASAE visaram seis mil operadores económicos, confiscaram mais de mil computadores, 1300 periféricos, 4426 cópias de software, 377 mil CD, DVD e gravadores. A esses números juntam-se ainda 183 mil outros tipos de suporte informático. Só em Janeiro deste ano, o valor do material apreendido totaliza 39 mil euros, na sua maioria relacionado com operações e investigação. Apenas mil euros são referentes aos suportes apreendidos em feiras.
Pedro Sales Dias | Público | 07-06-2012
Comentários (10)
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Em vez de se resolver a irregularidade passando os autos para o OPC correcto, anula-se tudo!
Qualquer dia chegaremos ao cúmulo de um homicida qualquer dizer a um PSP para onde deitou fora a arma do crime e isto não valer de nada porque quem tem competência para investigar homicídios é a PJ.
Claro que isto só em Portugal, com a hiper-protecção do arguido levada ao máximo extremo.
Por exemplo, alguma vez em Portugal se aceitaria que se tirassem inferências do silêncio do arguido (ou da sua recusa em apresentar uma justificação para factos que inegavelmente apontam para a sua culpabilidade)?
Logo 22 inconstitucionalidades cairiam dos céus, anulando tudo e mais alguma coisa.
Mas no arcaico, medieval e atrasado Reino Unido tal era possível.
E o TC Europeu, perdão, o TEDH não encontrou nisso desconformidade com a CEDH.
http://en.wikipedia.org/wiki/J...ed_Kingdom
http://cmiskp.echr.coe.int/tkp...6DEA398649
A PGR conhece a Lei?
Com o devido respeito, creio kue a PGR está eskuecer-se de um pormaior. Na verdade, face ao Reg (CE) 1383/2003, se existir um Pedido de Intervenção (PDI) de uma Pessoa, a apreensão é obrigatória, mesmo kuando Administrativa, sujeita à validação do MP.
Como entender kue um Parecer sobreponha a LOIC a um Reg. Comunitário? E o mesmo Regulamento não define kue a intervenção sem PDI, pode e deve ser realixada a titulo ofiioso?
Acresce kue para peritar um CD ou DVD, não é necessário ver ou ouvir o documento, basta verificar os dizeres gravados na superfície dos redondinhos. Como encaixar isto tudo no Parecer?
Não terá a PJ crimes mais graves para investigar, para perder tempo com kuestões menores? Ou tem assim tanta gente a mais kue está sem trabalho?
Ou talvez seja mesmo melhor acabar com todos os OPC, de carácter específico e geral, menos a PJ. Alguém já pensou na desmotivação kue isto provoca nos OPC's kue vêem o seu trabalho esfumar-se e surgir aos olhos do público como trabalho e exitos da PJ?
Respeitosamente
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Independentemente desse mau nascer, é duvidosa a interpretação abrangente feita pela PGR para a qual dificilmente haverá, daqui a algum tempo, alguma coisa que não constitua crime informático só porque alguém mandou um mail a alguém antes de assaltar uma gasolineira ou roubar uma vizinha.
Agora só resta, coerentemente, à ASAE deixar-se daquelas razias nas feiras, deixando-as para a PJ e para o MP. Vai ser um sucesso.
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Caro Dr. Rama da Silva. Curioso vai ser a ASAE passar pela Feira, encontrar uma banca de venda de DVD's e CD's, consumar os actos cautelares, e chamar a PJ para tomar conta do Processo.
Estamos todos a ver o que vai acontecer, não é?
Aliás, todos sabemos que a PJ tem recursos humanos a mais, em especial no Departamento em causa, ou até vai abandonar um processo crime de branqueamento de capitais, para ir a correr a uma qualquer Feira tomar conta de contrafacção do Toy ou do Harry Potter.
Em que mundo estaremos nós?
Respeitosamente
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Quanto às divisões entre opc's são as da lei, e segundo parece havia dúvidas na sua interpretação. A ASAE tentou convencer o MP da sua leitura e não terá conseguido, mas se se quiser alterar a lei, e a ASAE está tão convicta da sua razão pode convencer o legislador.
O que já me parece inadmissível é que a ASAE se recuse a praticar actos cautelares por não ser o opc competente para a investigação, e segundo percebi o parecer também o terá considerado.
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Ainda não li o Parecer na totalidade, mas o mesmo parece padecer de um erro trágico, pois funda-se na ideia kue a contrafacção e/ou pirataria de um CD ou DVD só é possível por via informática, o kue todos sabemos não corresponder à verdade. Kualkuer par de leitores de DVD e CD permite a gravação de um filme ou música, pelo kue a teoria cai pela base, pois não creio kue seja possível classificar um leitor como um ekuipamento informático.
Depois, não é preciso ouvir o CD ou ver o DVD, pois as marcas kue identificam o CD/DVD como originais estão apostas exteriormente, junto ao orifício do mesmo.
Logo, não vejo como enkuadrar e tipificar o crime, como um crime informático. Nem sempre recorre à informática e a base dos mesmos não é informática.
Mas estou certo estará em condições de me explicar, porkue gosto muito de aprender e não tenho vergonha de não saber tudo.
E, porkue já vi kue acha bem a ideia da PJ ser o OPC competente, percebo kue pertence à Turma do Eucalipto, kue de tanto beber a seiva dos outros OPC's, vai acabar por desertificar o policiamento, pois cada vez mais estes estão cansados e desmotivados de andar a trabalhar para os outros, e kue depois se ufanam dos êxitos kue não são seus.
Num ponto tem razão. É preciso desconfiar dos jornais, ou não fossem os jornais kue dizem com frekuência kue "PJ detem traficante no Aeroporto de...", sabendo nós kue 99,99% das aprensões nos Aeroportos são consumadas pela ATA.
Bom trabalho
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