O legado de Pinto Monteiro fica marcado por ter recusado seguir o parecer dos investigadores do processo Face Oculta.
Fernando Pinto Monteiro iniciou o seu mandato de procurador-geral da República (PGR) prometendo mundos e fundos. Elegeu a corrupção no seu discurso de tomada de posse como um dos crimes prioritários a combater, declarou guerra ao "conde, visconde e marquesa" do Ministério Público (MP) e jurou: "Tudo o que venha ao meu conhecimento, eu mando investigar. Esteja em causa o A, o B ou o C." É caso para dizer que pela boca morreu o peixe.
Sucedendo a um PGR, Souto Moura, que deu autonomia aos magistrados do MP para investigarem figuras poderosas da sociedade portuguesa (recorde-se apenas Valentim Loureiro, Isaltino Morais, Pinto da Costa ou o caso Casa Pia), Pinto Monteiro quis regressar ao modelo centralizado de Cunha Rodrigues. Esqueceu que o MP sofreu um rejuvenescimento, tem uma nova geração de magistrados que cresceram em democracia e que aplicam o princípio estruturante do Estado de direito: todos são iguais perante a lei.
O homem que queria investigar tudo o que chegasse ao seu conhecimento é o mesmo que impediu que o MP investigasse as suspeitas criminais que recaíram sobre José Sócrates e a sua entourage na tentativa, por exemplo, de controlar a comunicação social. Confrontado com as suspeitas do DIAP de Aveiro, Pinto Monteiro, em consonância com Noronha Nascimento, agiu ao arrepio das regras do jogo democrático, impedindo a investigação e o escrutínio das suas decisões. Tudo o que um PGR não deve fazer.
Não se pense, contudo, que o balanço é totalmente negativo. O conselheiro Pinto Monteiro trouxe para a agenda do PGR temas actuais como a violência juvenil nas escolas e nas cidades ou os abusos contra idosos. Teve também o mérito de criar equipas especiais de investigação que ajudaram a resolver processos complexos, como o Apito Dourado, a violência no Porto ou as irregularidades urbanísticas em Lisboa.
Estes factos, contudo, não escondem o óbvio: Pinto Monteiro sai do Palácio Palmela isolado na estrutura do MP e com uma mancha chamada processo Face Oculta que não desaparecerá com o tempo.
Para quem dizia que Souto Moura deixaria saudades, eis a prova de que a razão tarda mas chega.
Luís Rosa | ionline | 09-10-2012
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